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Mauricio Corrêa da Veiga e Luciano Andrade Pinheiro

Profissionais de aplicativos devem ter legislação trabalhista própria? SIM

Figura híbrida entre autônomo e trabalhador CLT traria segurança jurídica

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Mauricio Corrêa da Veiga e Luciano Andrade Pinheiro

Advogados trabalhistas e sócios de Corrêa da Veiga Advogados

O trabalho em plataformas digitais está relacionado à denominada economia colaborativa (“sharing economy”), que provoca uma profunda mudança nos conceitos trabalhistas.

Esse novo sistema de trabalho nasce em um período de mudanças da economia global e se traduz em um modelo empresarial no qual a atividade é facilitada por plataformas colaborativas, que criam um nicho de mercado que possibilita a utilização temporária de bens e serviços, muitas vezes prestados por particulares.

Ao contrário do que se propaga, os prestadores de serviços disponibilizados por aplicativos não são “empresários” e donos do seu próprio negócio. Por outro lado, também não são empregados nos moldes tradicionalmente conhecidos.

Contudo, à míngua de uma legislação específica acerca deste tema no Brasil, apenas dois caminhos podem ser seguidos quando as demandas são submetidas ao Judiciário trabalhista: 1 - reconhecer a autonomia desses prestadores de serviço e afastar o vínculo de emprego pretendido; ou 2 - reconhecer que se trata de uma relação de emprego e deferir o liame empregatício e os consectários legais.

Tudo vai depender da análise de cada caso concreto, mas pelo que se tem percebido, de uma forma geral, há uma certa autonomia na prestação desses serviços, o que fez com que, nos casos julgados até o presente momento pelo TST (Tribunal Superior do Trabalho), fosse afastado o vínculo de emprego.

Em precedente da 4ª Turma do TST, restou demonstrada a “autonomia ampla do motorista para escolher dia, horário e forma de trabalhar, podendo desligar o aplicativo a qualquer momento e pelo tempo que entender necessário, sem nenhuma vinculação a metas determinadas pela Uber”. Em outro caso, o ministro Douglas Alencar Rodrigues, da 5ª Turma do TST, bem pronunciou que critérios antigos de relação trabalhista, como previstos na CLT, não se aplicam às novas relações que envolvem plataformas e aplicativos.

Em Portugal existe um movimento para se aprovar um estatuto de “presunção de laboralidade”, no qual fica transferido para as plataformas o ônus de provar que não existe vínculo de emprego com o trabalhador.

Trata-se de um critério que contribui para o aumento da litigiosidade, tendo em vista o elevado grau de subjetividade.

Recentemente, o Tribunal Supremo da Espanha proferiu decisão para unificar a doutrina, na qual é ressaltada a prevalência da primazia da realidade em detrimento ao “nomen iuris” (“o nome de direito”), bem como a constatação de que os serviços são prestados para uma organização produtiva —os frutos da atividade não pertencem ao prestador dos serviços, mas sim a essa organização. Sem assumir os riscos do negócio, logo, será ele empregado.

No Brasil, tramita na Câmara dos Deputados o projeto de lei 3.748/20, que institui o regime de trabalho sob demanda, com garantias de direitos mínimos e que cria uma figura híbrida entre um prestador de serviços autônomo e um trabalhador sob o regime da CLT —ou seja, um parassubordinado, o que certamente traria maior segurança jurídica para empresas e trabalhadores, pois seria um critério balizador.

Estamos diante da ponta de um iceberg de uma profunda mudança nas relações de trabalho. Não há como regular essas relações com os antigos conceitos de direito do trabalho, razão pela qual é necessária uma abertura para novos caminhos de regulamentação da realidade que se descortina.

A gênese do direito do trabalho revela que sua origem se deu justamente para trazer novas categorias no direito e foi fonte de inspiração para vários ramos. Chegou a hora de resgatar essa história e tradição, com a aplicação de novos conceitos a essas novas relações de trabalho.

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