bell hooks desejava que suas ideias se destacassem mais que sua pessoa. Em razão disso, grafava em letras minúsculas o nome pelo qual se apresentava. Suas obras, mais de 30 —algumas delas lançadas no Brasil—, impactaram fortemente através de brilhantes formulações argumentativas, muitas construídas a partir de sua subjetividade. Valiosa sua contribuição referenciada no amor, algo incomum ao mundo acadêmico.
"All About Love: New Visions" foi recepcionado em Nova York, em 2000, como calorosa afirmação de que o amor é possível e como um ataque à cultura do narcisismo e do egoísmo. Como epígrafe de seu livro (posteriormente publicado no Brasil sob o título "Tudo sobre o Amor: Novas Perspectivas"), resgata Salomão ao afirmar que "é possível o olhar entre o eu e o outro", tal como realmente somos, despojados de artifícios e de arrogâncias. "No momento em que escolhemos amar", diz em um de seus escritos, "começamos a nos mover contra a dominação, contra a opressão. No momento em que escolhemos amar, começamos a nos mover e agir em direção à liberdade, de formas que libertam a nós e aos outros".
"O Feminismo é Para Todo Mundo: Políticas Arrebatadoras" mostra como esse movimento pode tocar e mudar, para melhor, a vida das pessoas —dos homens, inclusive. Educar e ser educado para o feminismo é a única forma de construir uma sociedade com mais amor e justiça. "Não precisamos viver sob a mesma opressão para combater a opressão em si."
Movidas pelos ensinamentos de bell hooks, não apenas como acadêmicas e feministas, mas como acadêmicas feministas, buscamos colocar em prática os seus ensinamentos. Seus estudos, ademais de nos inspirar, fortaleceram nossa convicção de que a academia e o feminismo precisam ser, dentre outras antidiscriminações, antirracistas.
"Teoria Feminista: Da Margem ao Centro" concebe o feminismo como um "compromisso ético, político, teórico e prático com a transformação da sociedade a partir de uma perspectiva antirracista, antissexista, antilesbofóbica, anti-homofóbica, antitransfóbica, anticapitalista".
A preocupação com a interseccionalidade aparece já na primeira obra de bell hooks. "E Eu Não Sou uma Mulher? Mulheres Negras e Feminismo" faz, em seu título, referência ao discurso proclamado na Convenção das Mulheres de 1851, em Ohio (EUA), por Sojourner Truth, mulher negra que fora escravizada. Seu questionamento evocava a necessidade de trazer para o centro das discussões feministas a questão da raça.
Os escritos da autora metodicamente prestigiam a ideia da interseccionalidade, tema que no Brasil tem sido desenvolvido a partir das obras de Heleieth Saffioti, Lélia Gonzalez e Sueli Carneiro, ressaltando, ainda, a força das novas feministas autoras negras do país, como Djamila Ribeiro.
Em seu livro "Erguer a Voz: Pensar como Feminista, Pensar como Negra", bell hooks afirma que, sempre que o seu nome for evocado, o espírito de sua bisavó ressuscitará, explicando que a escolha de seu pseudônimo remete ao nome dela, um ato que entendemos como de amor. Fala, também, da crença de que um legado vivo é um legado sempre lembrado.
O pensar e o crer de bell hooks estarão sempre vivos para nós duas e para muitas e muitos, como de alguém que revolucionou o pensamento feminista, com seu olhar guerreiro e amoroso. Seus escritos continuarão fundamentando a todas e todos que pretendem "agir e refletir sobre o mundo a fim de modificá-lo". Isso, pois, a sua teoria e categoria práxis, proposta em seu livro "Ensinando a Transgredir: A Educação como Prática da Liberdade", inspirada por Paulo Freire, representa um modelo solar.
Convencidas, com Grada Kilomba e Silvio Almeida, dentre vários, de que o racismo não é um problema pessoal que as pessoas negras experienciam, mas um problema branco estrutural e institucional, nós duas, feministas brancas, aqui erguemos nossas vozes, homenageando bell hooks e os feminismos negros que ampliaram nossos olhares e nosso agir sobre a complexidade perversa das opressões e violências que nós, mulheres —e diversas que somos—, sofremos.
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