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O que a Folha pensa

Estadista Gorbatchov

Último líder fracassou em salvar a URSS e ajudou a tornar o mundo mais livre

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Mikhail Gorbatchov, em foto de 2011 - Pascal Guyot - 25.nov.11/AFP

Mikhail Sergueiévitch Gorbatchov, morto aos 91 anos, foi personagem central do século 20. Numa versão romantizada, Gorbatchov, que ascendeu ao cargo máximo do Partido Comunista da União Soviética em 1985, foi o homem que encerrou a Guerra Fria e fez com que os cidadãos da URSS respirassem ares um pouco mais democráticos.

Também pôs fim à intervenção soviética no Afeganistão e permitiu que os países do Leste Europeu se livrassem de seus ditadores sem derramamento de sangue. Floreada mas não falsificada, essa era a visão do líder soviético preponderante nos países ocidentais.

Domesticamente, a avaliação era mais lúgubre. Gorbatchov era apontado como o responsável pela implosão da União Soviética, "a maior catástrofe geopolítica" do século passado, nas palavras de Vladimir Putin, e por ter lançado seus habitantes numa grande crise econômica e social da qual levariam vários anos para se recuperar.

De novo, essa descrição pode ser qualificada como ideologizada, mas não contrária aos fatos.

Numa narrativa mais equilibrada, Gorbatchov pode ser pintado como o homem que se deu a missão de salvar o regime e fracassou. Isso não o impediu de ter sido decisivo para tornar o mundo um lugar menos belicoso e mais livre.

O problema de base era a economia. Gorbatchov observou que a URSS estava ficando para trás em relação ao Ocidente. A produtividade era péssima em diversos setores e o país também estava perdendo a corrida tecnológica.

Embora os soviéticos ainda conseguissem manter-se na ponta da produção de artefatos nucleares, isso estava ficando cada vez mais difícil, já que não iam bem em ciência da computação, por exemplo.

Gorbatchov pretendia reformar o sistema por dentro, preservando o poder para o PCUS. As palavras-chave de seu projeto eram "glasnost" (transparência, que seria uma reforma política limitada) e "perestroika" (reestruturação, a modernização da economia).

Não deu certo. A "perestroika" não salvou a economia, mas a "glasnost" despertou os fantasmas nacionalistas que destruiriam a URSS.

Após fracassada tentativa de golpe militar, Gorbatchov viu o poder ser tragado por líderes locais como o russo Boris Ieltsin e o cazaque Nursultan Nazarbaiev, que deixou a Presidência do Cazaquistão em 2019. Em 1991, a URSS se dissolveu e Gorbatchov ficou sem emprego.

O Ocidente também fracassou. Não aproveitou a janela democrática aberta após a dissolução do gigante comunista para transformar a Rússia numa parceira institucional e economicamente próspera, abrindo espaço para a volta do autoritarismo sob Putin.

Quem não fracassou foram os chineses, que aprenderam com o caso soviético e tiveram sucesso onde Gorbatchov falhou. A economia chinesa é das mais dinâmicas do mundo, e o poder está concentrado no Partido Comunista.

editoriais@grupofolha.com.br

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