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Alexandre Cordeiro Macedo e Dario da Silva Oliveira Neto

Fusão e aquisição: as SAFs devem pedir autorização prévia ao Cade?

Notificação pode ser necessária para melhor compreensão das relações verticais

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Alexandre Cordeiro Macedo

Presidente do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica)

Dario da Silva Oliveira Neto

Chefe da assessoria técnica da presidência do Cade

A Lei de Defesa da Concorrência (LDC) estabelece que todas as fusões e aquisições realizadas do Brasil, cujas empresas, compradora e vendedora, tenham faturamento de R$ 750 milhões e R$ 75 milhões, devem ser notificadas ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Isso significa que nenhuma operação que se enquadre nesses requisitos pode ser consumada sem a prévia autorização do Cade, sob pena de multa de até 60 milhões de reais.

O surgimento das Sociedades Anônimas de Futebol (SAFs) trouxe uma nova discussão para o tema. A criação de uma SAF e a consequente aquisição por um grande grupo econômico deve ser de notificação obrigatória ao Cade?

Todo o debate gira entorno de dois pontos específicos: 1 - o faturamento da SAF; e 2 - a natureza jurídica da Associação Clube de Futebol. Quanto ao primeiro ponto, levanta-se a seguinte questão: se a SAF acabou de ser criada, seu faturamento no ano anterior é zero, portanto sua aquisição não deveria ser notificada. Já o segundo ponto se refere ao requisito da natureza jurídica do clube de futebol. Quem tem receita é a Associação Clube de Futebol, que formalmente não é empresa e, portanto, não cumpre o requisito de ser empresa para fins de notificação. Contudo, é possível considerar que o clube de futebol se enquadre no conceito material de empresa e faça parte do mesmo grupo econômico e, assim, a operação seja de notificação obrigatória?

Os incisos I e II do § 1º do art. 4º da resolução nº 33/22 do Cade expressamente assentam que se considera grupo econômico, para fins de cálculo dos faturamentos do art. 88 da LDC, as "empresas" que estejam sob controle comum ou que o titular detenha pelo menos 20% de capital social. Desse modo, a pergunta que se faz é se os clubes de futebol e as recém-criadas SAFs podem ser considerados um mesmo grupo econômico. A rigor, o clube de futebol é o controlador da SAF e detentor de 100% de suas cotas no momento da sua criação. Desse modo, não se tem dúvida sobre as relações societárias entre SAF e clube de futebol para determinação de grupo econômico —o que se põe em questionamento é a natureza jurídica do clube e o seu enquadramento como empresa.

Seguindo o raciocínio, a Lei da SAF estabelece que o clube de futebol é associação civil regrada pelo Código Civil (CC). As associações estão previstas no CC e se diferem das sociedades empresariais por serem constituídas pela união de pessoas que se organizam para fins não econômicos e, por conseguinte, são proibidas de distribuir lucros. Ou seja, a priori, os clubes de futebol não seriam entendidos como empresas e, portanto, não deveriam estar contidos dentro do grupo econômico analisado pela operação.

John Textor (esq.), Thairo Arruda e Danilo Caxeiro (dir.) com a camisa do Botafogo. Brasileiros foram os consultores que apresentaram o clube ao empresário - Reprodução/Instagram@thtarruda

Todavia, a jurisprudência, recentemente, vem dando novas roupagens para o instituto jurídico das associações, principalmente para aquelas que exercem atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. Nesse sentido, podemos citar as recentes decisões de deferimento de pedidos de recuperação judicial por associações que a princípio não estariam enquadradas no rol de aplicação de empresas da lei 11.101/05. Dessa forma, é passível a interpretação da natureza jurídica de clubes de futebol como empresas em sentido material, uma vez que esses exercem atividade econômica organizada como se empresas fossem.

Por último, ressaltamos que ao Cade é facultado, pelo período de um ano, o direito de requerer a submissão de fusões a aquisições mesmo que não se enquadrem nos critérios de faturamento da LDC. Portanto, o Cade pode requerer a notificação das aquisições das SAFs com o intuito de melhor compreender as relações verticais, diagonais e possíveis trocas de informações sensíveis, assim como a possibilidade de fechamento de mercado para com jogadores, empresas esportivas, patrocinadores e outros agentes capazes de influenciar as questões concorrenciais do mercado de futebol, visto que as preocupações horizontais, preliminarmente, aparentam estar resolvidas pelo art. 4º da Lei das SAFs.

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