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As armas de Fachin

STF limita decretos que violam lei e podem agravar casos de violência na eleição

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O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal

Com uma decisão provisória e tardia, o Supremo Tribunal Federal enfim suspendeu a eficácia de trechos de três decretos editados pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) que flexibilizavam as regras para compra de armas e munições no país.

Provisória porque se trata de medida cautelar, não de posição definitiva da corte; os trechos foram suspensos, mas ainda não revogados —o que pode vir a acontecer ao final do julgamento.

E tardia porque duas das ações tramitam desde o primeiro semestre de 2019, enquanto a terceira data de meados de 2020. Se só agora o STF conseguiu deliberar sobre o tema, foi porque dois ministros abusaram da prerrogativa de solicitar mais tempo para analisar o caso.

Quem primeiro segurou as ações em sua mesa foi Alexandre de Moraes, que as reteve por cerca de cinco meses antes de devolvê-las aos colegas em setembro de 2021. Ato contínuo, Kassio Nunes Marques, indicado ao posto por Bolsonaro, pediu vista dos autos e com eles teria ficado sabe-se lá até quando se não fosse a intervenção recente do ministro Edson Fachin.

Relator dos processos, Fachin usou a arma a seu alcance: concedeu decisão monocrática, antecipando seu juízo e contornando o obstáculo criado pelo colega.

"Conquanto seja recomendável aguardar as contribuições, sempre cuidadosas, decorrentes dos pedidos de vista, passado mais de um ano e à luz dos recentes e lamentáveis episódios de violência política, cumpre conceder a cautelar", escreveu Fachin em 5 de setembro.

Para não carregar sozinho o peso dessa decisão, o relator a dividiu com o plenário do Supremo, e na terça-feira (20) esgotou-se o prazo para os votos dos demais ministros. Por 9 a 2, prevaleceu o entendimento de Fachin.

Bons argumentos não faltam. De mais imediato, resta evidente o risco de que a campanha eleitoral deste ano seja manchada por episódios de intolerância e truculência.

Dois petistas já foram mortos por apoiadores do presidente; nesta semana, um pesquisador do Datafolha foi covardemente agredido com chutes e socos por um bolsonarista, e já passam de dez os casos de hostilidade contra o instituto.

Quanto ao debate de fundo, é evidente que as medidas editadas por Bolsonaro violam o Estatuto do Desarmamento; e este, uma lei aprovada pelo Congresso, não pode ser contrariado por decretos presidenciais, instrumentos inferiores na hierarquia normativa.

Passou da hora de o STF dar um basta definitivo nessa falsa polêmica. Favorecer o acesso a armas pode ser uma escolha legítima de política pública —a despeito da discordância frontal desta Folha quanto a seu mérito. Atropelar uma legislação em vigor decerto não é.

editoriais@grupofolha.com.br

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal
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