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Claudio Lottenberg e Rubens Belfort Neto

Diagnosticar o retinoblastoma cedo é fundamental

Doença que atinge principalmente crianças pode levar à cegueira e à morte

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Claudio Lottenberg

Doutor em oftalmologia (Unifesp), é presidente institucional do Instituto Coalizão Saúde e do conselho do Hospital Albert Einstein

Rubens Belfort Neto

Doutor em oftalmologia (Unifesp), é ex-presidente da Sociedade Pan-Americana de Oncologia Ocular

O pensador grego Aristóteles (384 a.C. - 322 a.C.) diz na "Metafísica", uma de suas muitas obras que chegaram aos nossos dias, que "todos os homens, por natureza, desejam o saber" e que um sinal disso seria o amor que eles têm pelos cinco sentidos. Mas, dentre os cinco, o mais amado seria a visão: para ele, isso acontece porque "a visão nos proporciona mais conhecimento do que todas as outras sensações e nos torna manifestas numerosas diferenças entre as coisas".

É claro que cada um dos demais sentidos tem sua função bastante específica: a de nos colocar em contato com o mundo em suas muitas outras manifestações —sonoras, táteis, olfativas e gustativas. Como somos oftalmologistas, no entanto, tendemos a concordar com o grande sábio. Brincadeira à parte, numa era em que cada vez mais estamos diante de telas para fazer praticamente tudo, de trabalhar e estudar a nos relacionarmos com parentes e amigos e para nossos momentos de lazer, a visão é fundamental. É preciso, então, dedicar a ela nossa atenção para que tenhamos olhos saudáveis ao longo da vida.

Sinais iniciais de retinoblastoma no olho - Simon Plestenjak - 24.mai.12/Folhapress

Por isso, é trágico que tenhamos no Brasil cerca de 400 novos casos de retinoblastoma por ano: o tipo mais comum de câncer intraocular nas crianças, de acordo com artigo publicado no mês passado no periódico especializado The Lancet. E, mais trágico ainda, é que cerca de 50% dos casos são diagnosticados em estágio avançado, piorando a chance de salvar a visão e a vida dessas crianças. Para chamar a atenção a esse fato e conscientizar a população sobre a necessidade de se detectar o quanto antes a doença, neste domingo (18) é lembrado o Dia Nacional de Conscientização e Incentivo ao Diagnóstico Precoce do Retinoblastoma. A data foi instituída por lei (nº 12.637) em 2012.

As crianças em que se diagnostica a doença têm em média 2 anos de idade, e entre os primeiros sinais e o diagnóstico costumam se passar cinco meses. O retinoblastoma tem como sintomas estrabismo, vermelhidão nos olhos, baixa visão, dor e mesmo deformação do globo nos casos mais graves. O principal sintoma, no entanto, é a leucocoria —conhecida como "reflexo do olho de gato" (a pupila do olho acometido fica esbranquiçada quando iluminada, como por flash de fotografia). Sem tratamento, a criança pode ficar cega e mesmo vir a óbito, nos casos extremos.

O artigo da The Lancet trouxe uma análise dos casos de 4.064 pacientes de retinoblastoma, de 149 países. A análise abrangeu casos diagnosticados entre janeiro e dezembro de 2017, com pacientes sendo acompanhados pelos três anos seguintes. Verificou-se que, para crianças em países de alta renda, a taxa de sobrevida nos três anos de acompanhamento foi de 99,5%; nos países de nível médio-alto de renda, essa taxa foi de 91,2%; nos de renda média-baixa, de 80,3%; e, nos de renda baixa, 57,3%. O que dá uma dimensão na urgente necessidade de, por aqui, conscientizar os pais e responsáveis para que busquem o diagnóstico o mais cedo possível, assim que qualquer dos sintomas se manifestar.

O escritor José Saramago, no livro "A Jangada de Pedra", disse que os olhos "fazem a diversidade do mundo e fabricam as maravilhas". A criança não pode ficar exposta ao risco —no mais, completamente evitável— de perder a visão (ou a vida) por falta de informação. Procurar os serviços de saúde o quanto antes pode fazer toda a diferença. Neste Dia Nacional de Conscientização e Incentivo ao Diagnóstico Precoce do Retinoblastoma devemos lembrar que a atenção à saúde dos olhos das crianças pode manter abertas as proverbiais janelas da alma —num tempo em que uma parcela imensa do que ocorre no mundo nos chega principalmente pelos olhos, e numa fase da vida repleta de descobertas, beleza e conhecimento. E maravilhas.

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