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Larissa Alfino e Gisele Agnelli

Queremos mulheres em metade dos ministérios

Na campanha, Lula hesitou em confirmar a formação de um gabinete paritário

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Larissa Alfino

Presidente do Instituto Vamos Juntas, movimento nacional e suprapartidário que tem 21 parlamentares eleitas pelo Brasil

Gisele Agnelli

Cofundadora do Vote Nelas, movimento suprapartidário que visa o reconhecimento das mulheres como força política

Apesar de sermos representantes de organizações suprapartidárias (Instituto Vamos Juntas e Vote Nelas), ecoando vozes de mulheres muito diversas pelo Brasil, não dá para negar os danos profundos do atual governo para as mulheres.

As armas de fogo foram ostensivamente liberadas pelo governo de Jair Bolsonaro (PL), e as maiores vítimas foram as mulheres. Fomos o país que mais perdeu grávidas e puérperas para a Covid-19 em todo o mundo.

A gestão cortou 90% da verba disponível para ações de enfrentamento à violência contra a mulher durante seu mandato. Desde 2019, apenas um terço dos recursos previstos para políticas para mulheres foi utilizado. Para 2023, a verba de ações para mulheres foi cortada em até 99%.

A luta dos movimentos sociais foi árdua, mas tivemos conquistas importantes, como o projeto de lei dos absorventes, que buscava combater a pobreza menstrual. No último dia 30, um novo capítulo se iniciou para as mulheres brasileiras e, com ele, oportunidades de avançarmos em pautas relevantes para todas nós.

Em seu plano de governo, o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), amplamente cita ações para o público feminino, como a refundação do Ministério da Mulher, o combate à violência e o fortalecimento do SUS para as mulheres. Também se comprometeu em trabalhar para diminuir os retrocessos históricos do Brasil contra negros e indígenas.

No entanto, na campanha, Lula hesitou em se comprometer com a formação de um ministério paritário. Em 2010, o ex-presidente deixou seu governo com apenas 4 mulheres entre os 28 ministros —precisamos e queremos mais.

O presidente do Chile, Gabriel Boric, acena ao lado dos ministros de seu governo, em Santiago - Ailen Díaz - 21.jan.22/Reuters

Outros países da América Latina já avançaram muito na questão da paridade de gênero. O Chile construiu um ministério paritário, com 14 mulheres e 10 homens, que compõem o governo do presidente Gabriel Boric. Na Espanha, as mulheres são 63% do gabinete. Em 2019, as congressistas mexicanas foram além: unidas, aprovaram uma reforma que alterou um artigo da Constituição e instituiu a obrigatoriedade de que 50% dos cargos públicos sejam ocupados por mulheres nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e nos órgãos federais, estaduais e municipais, além de órgãos autônomos (tanto cargos concursados como comissionados). Os países que avançaram na paridade também já demonstraram conquistas na luta pelos direitos das mulheres: as argentinas, por exemplo, aprovaram a descriminalização do aborto.

O resultado das eleições deste ano na composição do Congresso Nacional foi preocupante: não alcançamos sequer 20% de representatividade feminina e seguimos abaixo da média mundial, de 25%. Tivemos retrocesso no número de mulheres negras eleitas: perdemos cinco cadeiras. Houve, inclusive, retrocesso de representatividade no Senado.

Fatos e números tão aterradores, que nos trazem o incômodo de sermos maioria populacional (52% do total), mas ainda minoria sub-representada, como se fôssemos cidadãs de segunda categoria.

Acreditamos que o fortalecimento da democracia acontece quando metade da população é incluída na construção do futuro do país.

Mulheres representam o desafio ao status quo, a pluralidade de opiniões —diversidade tão importante na elaboração de políticas públicas mais assertivas, que abraçam toda a população. A questão da "perspectiva própria" é fundamental no processo de elaboração de políticas públicas. É urgente que o público-alvo das políticas públicas seja mulheres, população negra ou LGTBQIA+, e que cada um desses estratos populacionais esteja presente na elaboração das leis.

Este novo momento do país pede oxigenação, e as lideranças femininas estão prontas para assumir cargos ministeriais em campos de atuação desafiadores, como economia, meio ambiente, educação, agricultura etc. Nos próximos dias, construiremos colaborativamente uma lista com sugestões de profissionais mulheres para o ministério nas páginas dos projetos (@vamosjuntasorg e @votenelas), além da contribuição da sociedade civil organizada.

Finalizadas nossas indicações, as encaminharemos para apreciação da equipe de transição do presidente eleito. Somos muitas, somos diversas e estamos prontas.

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