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Deborah Bizarria

Não precisa ser de esquerda para ser feminista

Enquanto divisões ideológicas bobas tomarem a frente no debate, será difícil obter avanços reais para as brasileiras

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Deborah Bizarria

Economista pela UFPE, estudou economia comportamental na Warwick University (Reino Unido); evangélica e coordenadora de Políticas Públicas do Livres

A desigualdade de gênero é um problema não só de liberdade individual: tem implicações econômicas pouco exploradas no debate público. Afinal, se pressões culturais, ausência de incentivos e falta de modelos fazem com que mulheres saiam da competição pelos melhores empregos, o resultado é uma má alocação de talentos na economia.

Consequentemente, essa falha de mercado não só prejudica o crescimento individual das mulheres, mas também a produtividade e o avanço da economia.

Manifestação de mulheres contra cultura do estupro no Brasil e contra a ex-ministra Damares Alves - Pedro Ladeira - 20.ago.20/Folhapress

Segundo o Relatório de Capital Humano Brasileiro publicado pelo Banco Mundial, as mulheres chegam ao mercado de trabalho com mais capital humano (cerca de 7 pontos percentuais) do que os homens, isto é, elas chegam com maior nível de educação e capacidade produtiva. Mas quando esses adultos passam a integrar o mercado de trabalho, o seu capital humano não é utilizado totalmente, ou seja, há desperdício.

Mas a subutilização não é uniforme: pouco mais da metade do capital feminino é usado, enquanto o masculino consegue empregar 3⁄4 do valor inicial.

Ou seja, ao longo da vida produtiva, há uma reversão da vantagem feminina sobre habilidades e educação, e os homens acabam utilizando mais das suas habilidades de trabalho.

Para além dessa má alocação de talentos, ambientes de trabalho que toleram e fazem vista grossa para assédio sexual também reduzem ganhos econômicos para a sociedade. Evidentemente, as próprias vítimas arcam com o custo mais alto, o dano psicológico.

Mas há custos econômicos também. Os pesquisadores Johanna Rickne e Olle Folke entrevistaram e acompanharam vítimas de assédio sexual por cinco anos. Eles descobriram que as mulheres que relataram assédio tinham 25% mais chances de deixar o emprego do que outras mulheres; o mesmo ocorreu com 15% das vítimas do sexo masculino. Mulheres que saíram também tendem a ganhar menos no próximo emprego.

Os dados revelam que problemas no ambiente de trabalho —seja a subutilização da capacidade ou assédio e violência— afetam mulheres de maneira desproporcional.

Debater e buscar soluções para esses problemas não deveria ser algo restrito à esquerda. Ao contrário, por afetarem todos os tipos de mulheres e gerarem danos ao desenvolvimento econômico, a pauta atravessa barreiras ideológicas.

Liberais e conservadores precisam se envolver no tema para encontrar soluções que auxiliem metade da população a atingir seu potencial em níveis equiparáveis à outra metade. Enquanto divisões ideológicas bobas tomarem a frente no debate, será difícil obter avanços reais para as brasileiras.

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