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Pedro Donizete da Costa Júnior

Os EUA e a contenção à China

Relação tensa, elevada a guerra comercial e tecnológica, é caminho sem volta

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Pedro Donizete da Costa Júnior

Cientista político, professor de relações Internacionais e pesquisador da USP; é autor de “O Poder Americano no Sistema Mundial Moderno: Colapso ou Mito do Colapso?” (ed. Appris)

"Somos a nação do progresso humano, e quem irá impor limites à nossa marcha adiante?"
United States Magazine and Democratic Review (1839)

A atual política externa norte-americana apresenta uma direção muito bem definida: trata-se da contenção da China nas disputas pelo poder global no sistema mundial moderno.

Foi no governo Obama-Biden que se esboçou uma reformulação na política externa americana: priorizar não mais o Oriente Médio, entrementes o "desafio asiático". O então presidente democrata formulou assim: o "pivô para a Ásia" e a "aliança para o Pacífico" (TPP). Ambos fracassos retumbantes. O pivô asiático não saiu do papel porque os Estados Unidos não conseguiram sair do Oriente Médio. Já o TPP ("Trans-Pacific Partnership", ou Parceria Transpacífico), o tratado de livre-comércio que reuniria os EUA e as principais economias da Ásia e do Pacífico, numa tentativa clara de isolar a China, foi implodido por Donald Trump.

Os presidentes da China, Xi Jinping, e dos EUA, Joe Biden durante encontro do G20 - Saul Loeb - 15.nov.22/AFP

A administração do republicano iniciou a nominada "guerra comercial" contra a China. A partir da eleição de Trump, em 2016, formou-se um consenso no Departamento de Estado dos EUA —sejam democratas, republicanos, militares, políticos, congressistas de alto e baixo escalão, diplomatas, think tanks, grupos de pesquisa, intelectuais a serviço do Estado, jornalistas e mídia em geral— de que o grande desafio dos EUA não é mais o "terror" ou o "terrorismo", mas sim a China —e que é preciso contê-la tenazmente.

O governo Biden-Harris retomou o pivô para o Pacífico a fim de conter a expansão chinesa. Biden passou a movimentar as peças no tabuleiro geopolítico. Criou o Quad (Parceria Quadrilateral sobre Segurança entre EUA, Índia, Austrália e Japão) e, posteriormente, a Aukus, uma aliança de cooperação tecnológica e militar envolvendo EUA, Reino Unido e Austrália. Ambos são uma evidente estratégia de contenção da China no Indo-Pacífico.

O envolvimento umbilical dos EUA na Guerra da Ucrânia, com o enfrentamento à Rússia, alcançou proporções sistêmicas, implicando as grandes potências globais, o que desencadeou no estreitamento de uma "aliança sem limites" sino-russa (que acaba de completar um ano). Para Henry Kissinger, trata-se do pior dos cenários para a política externa norte-americana.

O governo Biden deu mais um passo decisivo na contenção ao poder chinês: a "guerra tecnológica" contra a China. Biden divulgou um amplo conjunto de controles de exportação que proíbem as empresas chinesas de comprar chips avançados. As recentes sanções dos EUA contra Pequim são sem precedentes nos tempos modernos. Os chips que Washington tenta controlar são semicondutores, os processadores que movem celulares, carros autônomos, computação avançada, drones e equipamentos militares —e se tornaram essenciais para a disputa tecnológica desta década.

Ademais, a incauta visita de Nancy Pelosi, então presidente da Câmara dos Representantes, a Taiwan, inflamou ainda mais as relações diplomáticas entre os dois gigantes. E já foi anunciado que seu sucessor, o recém-eleito republicano Kevin McCarthy, fará o mesmo neste ano.

Recentemente houve o dramático episódio do balão chinês, monitorado pelo Pentágono, enquanto sobrevoava campos de mísseis nucleares americanos. Duas consequências imediatas: primeiro, o balão chinês foi abatido pela força aérea dos EUA; segundo, Biden decidiu adiar a visita de seu secretário de Estado, Antony Blinken, à China, o que marca um novo capítulo na relação tensa entre os dois países.

Por fim, a gestão Biden não só continuou a guerra comercial com os chineses, iniciada por Trump, como a elevou a uma guerra tecnológica e ainda a uma "guerra humanitária", bem ao estilo dos democratas. Trata-se de um caminho sem volta.

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