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Berthier Ribeiro-Neto

Sobre a credibilidade da busca no Google

Seguimos muitos critérios em nossos resultados; ideologia não é um deles

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Berthier Ribeiro-Neto

Diretor de engenharia do Google na América Latina, pesquisador e professor universitário

Quando comecei a trabalhar na área de tecnologia, há mais de 30 anos, tarefas como encontrar o endereço de um restaurante ou fazer uma pesquisa escolar eram muito diferentes. Era comum recorrer a uma lista telefônica ou consultar uma enciclopédia —algo difícil de imaginar para quem já nasceu na era digital.

Como primeiro engenheiro do Google no Brasil, vi de perto a transição para o mundo online e o papel essencial que a busca da plataforma assumiu na vida dos brasileiros. As pessoas confiam na ferramenta, pois sabem que encontrarão na lista de resultados informações úteis e relevantes para tomar decisões no dia a dia. Ser um anunciante não garante melhor classificação nos resultados orgânicos —os anúncios ficam separados do índice de pesquisa e são sinalizados como "patrocinados".

Sede do Google, na Califórnia - Paresh Dave - 8.mai.19/Reuters - REUTERS

A busca do Google organiza o conteúdo disponível na web aberta seguindo critérios públicos. Em uma fração de segundo, nossos sistemas avaliam centenas de fatores para produzir um resultado. E ideologia não é um deles. Além disso, os resultados de pesquisa são dinâmicos e mudam conforme novas informações são publicadas na web. O que aparece na busca em um dia indica apenas o que é relevante naquele momento e no local onde está aquele usuário. Todo esse processo ocorre de forma automatizada e não é possível definir manualmente a posição de um link na lista de resultados.

Por todas essas razões, causou preocupação reportagem desta Folha ("Google lança ofensiva contra PL das Fake News, mostram emails e relatório", 2/5) sobre um levantamento que, entre outros apontamentos, acusou o Google de manipular resultados da busca orgânica para promover seus pontos de vista sobre o projeto de lei 2.630. Aparentemente baseado em um conjunto mínimo de consultas para o termo "PL 2.630", feitas na última semana de abril, o relatório não detalha sua metodologia estatística e faz acusações sérias sobre a credibilidade da busca, que podem ser contestadas por fatos observáveis na própria web.

O levantamento questionou, principalmente, o fato de o blog do Google figurar na primeira página dos resultados orgânicos para a busca por "PL 2.630", como se isso representasse um favorecimento do nosso próprio conteúdo. Ora, consultas feitas em buscadores concorrentes também mostraram links para o nosso blog ao lado de sites institucionais que também usam a numeração oficial para se referir ao projeto. Já quando se busca pelo termo "PL das Fake News", por outro lado, predominam conteúdos jornalísticos, pois a imprensa denomina o projeto dessa forma.

Em 2018, pesquisadores da Universidade Stanford analisaram mais de 4 milhões de links de resultados no Google sobre as eleições americanas ao longo de seis meses e concluíram não haver viés político na busca. Em outras palavras, utilizar a consulta por um único termo em poucos dias para supor que houve manipulação de resultados é simplista e ignora princípios básicos de funcionamento da busca.

O relatório também criticou uma associação supostamente indevida entre os termos "PL 2.630" e "PL da Censura". Essa conexão é feita pelos usuários, não pela busca, e existe na web pelo menos desde 2021.

Segundo dados públicos da plataforma Google Trends, entre 24 e 30 de abril os termos de maior interesse ao lado de "PL" no Brasil foram, nesta ordem, "PL 2.630", "PL da Censura" e "PL das Fake News". Defender que o Google ignore uma associação espontânea feita pelos usuários na internet significaria censurar resultados na busca.

Por fim, criticou-se o fato de o termo "PL da Censura" ter sido oferecido como opção a consultas sobre o projeto na seção "As pessoas também perguntam", que apresenta alternativas à pesquisa feita pelo usuário. Cada pergunta sugerida é baseada numa associação entre termos feita na web. Ou seja, é consequência do funcionamento natural da busca e reflete comportamento dos próprios usuários.

A confiança que as pessoas têm no Google é fruto de uma visão de longo prazo: sempre mostramos resultados gerados automaticamente por algoritmos, sujeitos a um processo rigoroso de qualidade e testados por avaliadores no mundo todo. Distorcer os resultados da busca para qualquer fim minaria essa confiança, prejudicaria nossos negócios e colocaria em dúvida nosso compromisso com as pessoas. Isso não aconteceu e jamais acontecerá.

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