Na elite do serviço público, as categorias comparam entre si condições de trabalho, remuneração e regalias, de modo que qualquer vantagem concedida a uma delas de pronto suscita pleitos das demais.
É o que se vê agora em Brasília depois que o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) editou decreto para enfim regulamentar um controverso bônus de eficiência para servidores da Receita Federal, fixado em lei seis anos atrás.
A benesse destinada a analistas e auditores fiscais já é inspirada em honorários pagos a advogados da União e procuradores da Fazenda Nacional —e é tida como meio de compensar supostas defasagens salariais em relação aos fiscos dos governos estaduais.
Agora, as corporações de Banco Central, Tesouro Nacional e Controladoria-Geral da União reclamam mais ganhos. Em outra frente, funcionários do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e peritos médicos reivindicam a retomada de um extra para a redução da fila por benefícios previdenciários.
Os valores envolvidos estão fora da realidade da grande maioria dos trabalhadores do país. Com o reajuste salarial linear de 9% concedido neste ano ao funcionalismo federal, um auditor da Receita tem vencimento básico de R$ 22,9 mil mensais no início da carreira e de R$ 29,8 mil no topo.
A essas cifras se somam hoje R$ 3.000 em bônus —que, sim, são pagos a todos, independentemente do desempenho. Com a regulamentação, o adicional será elevado; menos certo é que critério haverá para sua concessão.
Para além do risco de provocar uma corrida por privilégios injustificados, há que evitar, nesse caso, que o prêmio por produtividade incentive uma ofensiva de auditores contra os pagadores de impostos, ainda mais num momento em que o governo Lula busca um grande aumento de arrecadação.
Nesse sentido, é bem-vindo o dispositivo que impede o cálculo do bônus sobre recursos obtidos por meio de multas tributárias. Entretanto o vício de origem do adicional é ter sido criado a partir de uma demanda corporativista, não de um programa de produtividade.
O objetivo de melhorar a eficiência do serviço público deveria incluir uma reforma administrativa capaz de racionalizar a estrutura de carreiras, reduzir vencimentos iniciais e limitar o alcance atualmente exagerado da estabilidade do funcionalismo. Sem ela, distorções tendem a se aprofundar.
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