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Rafael Robba

Rescisão coletiva de planos de saúde é negligência inconcebível

Cancelamento imotivado transforma o sistema público em resseguro

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Rafael Robba

Advogado especialista em direito à saúde do escritório Vilhena Silva, é mestre e doutorando em saúde coletiva (USP) e pesquisador do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP

A rescisão imotivada de contratos de planos de saúde coletivos tem gerado preocupação e deixado consumidores desamparados, incluindo aqueles que passam por tratamento médico. O volume de pessoas sujeitas a essa prática assusta: cerca de 80% dos beneficiários de planos de saúde estão em contratos coletivos, o que significa que mais de 41 milhões de pessoas não têm garantia de receber o tratamento necessário em caso de enfermidade.

Os idosos são particularmente afetados, sendo muitas vezes expulsos dos planos de saúde sem justificativa, justamente quando mais precisam de assistência médica. Essa prática não é nova e exige que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) se responsabilize.

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Érika Thais Mariano e a filha Marina, 5 anos, diagnosticada com autismo; família relata que o convênio médico foi cancelado unilateralmente - Jardiel Carvalho/Folhapress - Folhapress

A rescisão imotivada de contratos coletivos gera distorções e abusos, permitindo que as operadoras excluam os beneficiários que adoecem, transferindo o ônus do tratamento para o sistema público de saúde. Não há nada que proteja crianças com autismo, pacientes em tratamento de câncer e outros casos de vulnerabilidade.

Além disso, esses perfis de pacientes não têm respeitada a garantia de contratação de um novo plano de saúde por meio da portabilidade de carências. Para espanto dos consumidores, a ANS já se posicionou a favor das operadoras, alegando suposta legalidade na prática do cancelamento imotivado de contratos coletivos. Com isso, a autarquia ignora sua responsabilidade de promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde.

Expulsar pacientes doentes durante o tratamento está longe de ser uma prática de interesse público. Os planos de saúde têm a obrigação de contribuir para o desenvolvimento das ações de saúde no país. Não é justo que as operadoras se utilizem do SUS como um resseguro, excluindo os consumidores e transferindo a responsabilidade pelo tratamento para o Estado.

É o Poder Judiciário que traz esperança para aqueles que buscam justiça. O entendimento é que essa conduta é autoritária e discriminatória.

Essas situações evidenciam a falta de prioridade da ANS em exercer suas competências de articulação com os órgãos de defesa do consumidor para efetivamente proteger e defender os usuários. A legislação estabelece que os contratos de planos de saúde devem se submeter tanto à lei 9.656/98 quanto ao Código de Defesa do Consumidor, além de princípios constitucionais de proteção ao consumidor e ao idoso.

Há prática de cláusulas contratuais proibitivas, que colocam o consumidor em desvantagem exagerada ou são incompatíveis com a boa-fé e a equidade. Não há interpretação legal possível que considere a rescisão imotivada de contratos coletivos de planos de saúde como legítima, especialmente quando afeta esse público.

O apelo da sociedade é para que a ANS não permaneça omissa nesses casos, pois se trata de um assunto de extrema relevância para a proteção individual dos beneficiários de planos de saúde e para o bom funcionamento do sistema de saúde como um todo. A saúde suplementar deve contribuir efetivamente para o desenvolvimento das ações de saúde no país —e não agravar os problemas existentes.

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