Descrição de chapéu
Débora Casseb Martins

O governo acerta ao ampliar a tributação de rendimentos no exterior? NÃO

Fuga de capitais causa um impacto negativo para os países no longo prazo

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Débora Casseb Martins

É bacharel em Direito pela Universidade Mackenzie e em Ciências Contábeis pela PUC-SP. Possui especialização em Direito Tributário pelo COGEAE/PUC-SP. É advogada e contadora. Atua na área de consultoria tributária há 20 anos e atualmente integra o time da BT7 Partners (EUA, Florida)

Podemos dividir a Medida Provisória (MP) 1.171/2023 em cinco grandes temas: (1) novas alíquotas de tributação das aplicações financeiras no exterior; (2) fim do diferimento da tributação dos lucros das "offshores" (regra anti-diferimento); (3) regras de tributação dos "trusts"; (4) opção para reavaliação de ativos no exterior em 31/12/2022, com tributação a 10%; e (5) reajuste da tabela do IR das Pessoas Físicas.

Conforme "Nota à Imprensa" publicada em 1º/5/2023 pelo governo federal, as medidas descritas nos itens 1 a 4 serviriam supostamente para custear a diminuição da arrecadação ocasionada pela medida descrita no item 5.

Cédulas de um dólar são exibidas em fileira - Dado Ruvic/Reuters

No entanto, pode-se dizer que um dos pontos mais polêmicos da referida MP seria o item 2, que, mais precisamente, institui a tributação dos lucros das "offshores" domiciliadas em paraísos fiscais ou que aufiram renda passiva (i.e. juros, dividendos, aluguéis, royalties etc) em percentual superior a 20%, lucros esses que serão tributados no Brasil, ao final de cada ano, com alíquotas progressivas de 0% a 22,5%.

Por um lado, conforme pontuado pelo governo federal pela já mencionada "Nota à Imprensa" e também na "Exposição de Motivos nº 57/2023 MF", tal medida é amplamente recomendada pela OCDE, uma vez que o Brasil é uma das raras exceções no mundo que ainda permite a utilização de estruturas "offshores" por pessoas físicas para adiar indefinidamente o pagamento do tributo, contrariando as práticas internacionalmente aceitas. Assim, a medida teria como objetivo igualar o Brasil à maioria dos países desenvolvidos, além de proporcionar tratamento fiscal análogo ao das pessoas jurídicas que possuem controladas no exterior.

Por outro lado, pode-se dizer que, o fisco brasileiro fez uso do "cherry-picking" ao tentar importar regras de tributação utilizadas por outros países, focando apenas na parte que lhe interessa, deixando de lado outras questões como, por exemplo: o aproveitamento de prejuízos apurados no exterior para reduzir rendimentos gerados no Brasil; a opção de se carregar perdas não utilizadas para exercícios futuros; a possibilidade de se igualar as faixas de alíquota aplicáveis a rendimentos financeiros nacionais e estrangeiros; a realização de "testes" para determinar se as empresas estrangeiras não seriam apenas um artifício de economia fiscal, dentre outros.

Assim, muito embora esteja sendo ostentada como uma medida que visa a colocar o Brasil no mesmo patamar dos países desenvolvidos, pode também ser vista como mais uma iniciativa que visa a majoração da carga fiscal.

Por fim, vale lembrar que o Brasil já possui uma carga tributária muito elevada em comparação com os outros países desenvolvidos (de 33,9% do PIB contra 26,6% nos EUA em 2021). Segundo estudo elaborado pela consultoria Henley & Partners, o Brasil "perdeu" cerca de 1.800 milionários em 2022 e, para 2023, a previsão é de um novo êxodo de aproximadamente 1.200 indivíduos com esse perfil, fazendo com que o país fique em quinto lugar na lista dos países que mais "perderão" indivíduos de alta renda.

E, como já se sabe, a fuga de capitais e também de profissionais com alta qualificação tende a causar um grande impacto negativo para os países no longo prazo, desestimulando novos investimentos, e, consequentemente, ocasionando a redução da arrecadação de impostos.

TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.