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Questão democrática

Queima do Alcorão provoca conflito, mas não está acima da liberdade de expressão

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Manifestantes invadem a embaixada da Suécia, em Bagdá (Iraque) - Ahmad AL-Rubaye/AFP

A liberdade de expressão é um dos pilares da democracia, mas manifestações populares em que exemplares do Alcorão, o livro sagrado do islamismo, foram queimados na Suécia e na Dinamarca estão criando tensões diplomáticas e dúvidas sobre esse direito individual.

Em reação, o governo do Iraque expulsou a embaixadora sueca do país, e centenas de manifestantes invadiram e incendiaram a embaixada da Suécia em Bagdá. No Líbano, também houve protestos.

As repercussões podem ser problemáticas para a nação nórdica, que atualmente depende do beneplácito da Turquia para ser aceita como membro da Otan.

Não é desprezível tampouco o risco de grupos radicais se verem estimulados a perpetrar algum ataque terrorista em territórios nórdicos. Na sexta (4), o governo da Dinamarca anunciou que reforçou a vigilância nas fronteiras, com escrutínio rigoroso sobre viajantes.

Autoridades suecas e dinamarquesas repudiam a queima dos livros e afirmam que as forças de segurança, às quais compete autorizar ou não os atos, não avaliam o conteúdo político ou a forma dos protestos, apenas aspectos logísticos e de segurança.

A liberdade de expressão é um valor fundamental para as democracias e, nas mais avançadas, ela inclui, sim, o direito de destruir livros religiosos e bandeiras.

Sob pressão, o ministro das Relações Exteriores da Dinamarca disse que o país pretende buscar "uma ferramenta legal" que possa impedir a queima do Alcorão, mas que mantenha preservada a liberdade de expressão.

Um pragmático poderia concluir que as leis deveriam ser alteradas a fim de evitar possíveis prejuízos. Seria uma conclusão errada, contudo, por limitar-se ao curto prazo. Em primeiro lugar, há o risco de nações livres se tornarem reféns de regimes autoritários.

Ademais, o que está em disputa são as regras do jogo da democracia. Dois dos elementos-chave desse sistema de governo são a liberdade de opinião, que estimula o debate público sobre todos os temas, e a estabilidade de regras transparentes, que gera confiança e facilita investimentos não só econômicos mas também pessoais.

Nesses regimes, é permitido questionar dogmas religiosos, como qualquer outro, e as regras acordadas pela sociedade não mudam ao sabor das circunstâncias de momento. Essa é a melhor maneira de viver que conhecemos.

editoriais@grupofolha.com.br

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