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O que a Folha pensa drogas

Pior a emenda

Ao propor alta da criminalização, Pacheco insiste em política de drogas falida

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Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado Federal - Gabriela Biló/Folhapress

Enquanto o Supremo Tribunal Federal ensaia discreto avanço na política sobre drogas, com placar de 5 a 1 a favor da descriminalização do porte de maconha até agora, o presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), indica retrocesso no tema que pode piorar a já calamitosa situação dos cárceres brasileiros sem ganho algum em segurança pública.

Pacheco apresentou na última quinta-feira (14) Proposta de Emenda à Constituição que criminaliza o porte e a posse de drogas, desconsiderando quantidade ou substância. O senador quer incluir no Artigo 5 da Constituição Federal, destinado a garantias e direitos fundamentais, um dispositivo que, na prática, consolida a arbitrariedade judicial e policial.

De acordo com o texto da PEC, "a lei considerará crime a posse e o porte, independentemente da quantidade, de entorpecentes e drogas afins sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar".

Pacheco já escrevera para a Folha defendendo que cabe ao Poder Legislativo debater a política criminal, e não ao Judiciário. Mas a emenda é pior que o soneto.

O válido argumento de que cabe ao Congresso propor leis sobre o tema não pode servir como desculpa para retrocessos que violem os direitos dos usuários.

O Estado não deveria penalizar de forma paternalista o consumo pessoal de substância psicoativa, mesmo sob argumento de resguardar a saúde do usuário —até porque criminalizar não é proteção.

A emenda reforça a principal causa de prisão por crimes relacionados a entorpecentes desde a adoção, em 2006, da Lei de Drogas: a falta de critérios que diferenciem traficante de usuário, que impacta sobretudo negros e pobres.

Ao determinar que o crime ocorreria "independentemente da quantidade", a proposta retira do da lei qualquer resquício de proporcionalidade entre gravidade da conduta e sua punição.

Outro aspecto irrazoável está em expandir a proibição para quaisquer drogas, sem considerar a gravidade de seus efeitos atestada por pesquisas científicas.

Outros países, sobretudo os mais democráticos, têm substituído repressão penal por políticas focadas em saúde. Cerca de 30 nações tão diversas quanto Armênia, Bélgica, Chile e Quirguistão já descriminalizaram porte para uso pessoal. Não se seguiu qualquer caos social, nesses casos, que justifique o alarmismo da medida de Pacheco.

O tempo dos parlamentares seria mais bem aproveitado se debatessem formas de avançar a legislação brasileira além do entendimento por ora majoritário do STF. A política de drogas é questão de saúde, não de cadeia.

editoriais@grupofolha.com.br

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