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Anya Schiffrin e Haaris Mateen

Big techs e suas dívidas com o jornalismo

Remunerar por conteúdo noticioso veiculado é proteger setor menos poderoso

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Anya Schiffrin

Palestrante sênior da Escola de Assuntos Internacionais e Públicos da Universidade Columbia

Haaris Mateen

Professor da Universidade de Houston

Líder mundial na regulamentação de tecnologia, o Brasil está novamente discutindo como fazer Google e Meta ajudarem a pagar por conteúdo noticioso. O projeto de lei 2.370 vai obrigar as plataformas a remunerar empresas de jornalismo pelo conteúdo noticioso que elas distribuem.

Nosso novo estudo constatou que, apenas nos EUA, as duas big techs devem aos publishers entre US$ 11,9 bilhões e US$ 13,9 bilhões por ano. A regulamentação poderia ajudar a assegurar que os grandes monopólios paguem de modo justo, garantir a transparência sobre os montantes envolvidos e fazer com que esse dinheiro seja usado para apoiar o jornalismo. Esses são os princípios globais subscritos por mais de cem pessoas e entidades.

Logo da Meta impresso em 3D e, ao fundo, o logo do Google - Dado Ruvic - 2.nov.2021/Reuters - REUTERS

Não é a primeira vez que o Brasil está tendo essa conversa importante sobre fazer com que Google e Meta —controladora de aplicativos como Facebook, WhatsApp e Instagram— paguem um preço justo.

Tentativas de introduzir legislação semelhante foram derrubadas em maio deste ano após oposição forte e impositiva do Google, que chegou a divulgar online suas próprias declarações de campanha alertando o público contra a lei. O Código de Negociação da Mídia Noticiosa, australiano, serviu de inspiração à legislação, e a lei C-18, no Canadá, seguiu o exemplo. Entre outros países que estudam a adoção de leis de remuneração pelas plataformas estão Indonésia, Nova Zelândia, África do Sul, Japão e Suíça. Nos EUA, a senadora Amy Klobuchar apresentou a Lei de Concorrência e Preservação do Jornalismo, que permitirá que os publishers negociem de modo unificado com as big techs.

Google e Meta reagiram de duas maneiras. A primeira delas é sugerir que conteúdos noticiosos não constituem parte fundamental de seus negócios e podem ser descartados ou minimizados. Ao mesmo tempo, o Google está dando dinheiro diretamente a organizações noticiosas e pedindo que assinem acordos de sigilo. De fato, as entrevistas que realizamos sugerem que o Google teria recentemente aumentado os montantes pagos aos publishers. É compreensível que ele prefira pagar publishers discretamente em vez de correr o risco de ver aprovada uma lei que imponha exigências.

Mas nossas novas investigações sugerem que Google e Meta estão pagando aos publishers valores seriamente abaixo do que seriam justos.

Sem conteúdos noticiosos, as buscas no Facebook e Google são muito menos úteis e satisfatórias para o público. O Google sabe disso há anos.

Nosso novo artigo explica que o valor é estipulado tanto para os publishers quanto para as mídias sociais que usam ou divulgam notícias. Desde os anos 1950, economistas entenderam que valor é criado quando duas partes se unem em uma "transação complementar" em que cada uma delas precisa da outra. Essa ideia foi estudada originalmente pelo Prêmio Nobel John Nash, que usou a teoria de jogos para explicar o valor criado pela colaboração.

Em nosso estudo sobre o que Google e Meta devem aos publishers, começamos por estimar as dimensões do "valor adicional" criado conjuntamente por plataformas digitais e publishers de jornalismo trabalhando em conjunto —para então calcular qual seria uma divisão justa desse valor entre os dois serviços complementares, sem levar em conta o poder de mercado.

Argumentamos que a teoria econômica considera que divisões equitativas de valor (por exemplo, uma divisão de 50-50 em uma negociação entre duas partes) são um dos resultados prováveis de modelos baseados em noções de equilíbrio e equidade.

Infelizmente, em muitos países os publishers estão tão desesperados por recursos que fazem acordos com o Google e aceitam valores inferiores aos que seriam justos. Não é uma negociação equitativa, e é por essa razão que a regulamentação se torna necessária: para proteger a parte menos poderosa na negociação —que, neste caso, são os publishers de jornalismo.

Google e Meta são contra as novas leis que exigem remuneração por parte das plataformas, mas isso é de se esperar. Sem essas leis, infelizmente, a big tech continuará em posição de vantagem nas negociações com os publishers.

Tradução de Clara Allain

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