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Fernanda Pinheiro da Silva e Pedro Rezende Mendonça

Local onde se vive define efeitos das ondas de calor

Poluição e padrões de mobilidade revelam como cada um enfrenta impactos

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Fernanda Pinheiro da Silva

Geógrafa, é mestre em geografia humana e doutoranda em planejamento; consultora em Mudanças Climáticas do Instituto de Referência Negra Peregum

Pedro Rezende Mendonça

Urbanista e analista de dados do Instituto de Referência Negra Peregum

Nos últimos dias de inverno, uma primeira onda de calor atingiu as cinco regiões do país e elevou os termômetros. Os indicadores meteorológicos e o contexto global de emergência climática nos indicam que isso será cada vez mais comum. Inclusive, já enfrentamos uma nova onda de calor nesta semana.

Diante dessa realidade, o Instituto de Referência Negra Peregum realizou uma pesquisa entre os dias 18 e 27 de setembro e identificou variações importantes no comportamento territorial da primeira onda.

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Termômetro registra 38ºC na região do bairro da Liberdade, em São Paulo, neste último domingo (12) - Rubens Cavallari/Folhapress - Folhapress

As maiores temperaturas registradas durante o dia se concentraram no centro da capital paulista, nos distritos Sé e Mooca, e em bairros periféricos com alta densidade demográfica, como São Miguel Paulista e Perus, ou ainda em bairros mais arborizados, onde a população é quase exclusivamente branca, como Pinheiros e Butantã.

Aparentemente, esses dados poderiam levar a uma ideia de indistinção da onda de calor entre esses territórios. Porém, quando a observamos durante a noite, saltam aos olhos as altíssimas temperaturas registradas na Sé e em São Miguel Paulista que, além da onda de calor, enfrentam outros fenômenos climáticos que se articulam com dinâmicas de ordem social, política e econômica.

Duas das piores situações de calor vivenciadas refletem o encontro dessa onda com os grandes bolsões de alta temperatura formados pelas ilhas de calor da cidade. Não por coincidência, são locais de residência da população negra e, no caso da região central, da população em situação de rua, o que eleva alertas de atenção.

Outro aspecto a ser considerado é a alta concentração de poluição automobilística, fator que agrava a formação das ilhas. Os padrões de mobilidade na cidade também definem como cada um vivencia esses impactos: pessoas que moram nas periferias e trabalham na região central acumulam efeitos das emissões automobilísticas ao longo do dia.

Da perspectiva do território, as variações do calor também refletem a infraestrutura dos bairros. Em Pinheiros e Butantã, por exemplo, a população tem noites com temperaturas relativamente mais amenas, induzidas por características urbanas como maior presença de árvores nas ruas e calçadas mais largas.

Uma análise territorializada dos dados climáticos exige a incorporação de aspectos de ordem social, política e econômica e explicita que as desigualdades raciais e de renda fazem com que um mesmo fenômeno seja experienciado de formas muito diferentes por quem habita a cidade.

Nesse contexto, é fundamental responder aos efeitos dos eventos climáticos extremos sobre a vida das populações urbanas. Todavia, essa tarefa exige soluções mais efetivas para enfrentar o racismo ambiental e a negligência do Estado com a população periférica.

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