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Luís Alberto de Paiva

O governo deve socorrer as companhias aéreas? NÃO

Política de subsídios não tem mais espaço num país com problemas primários

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Luís Alberto de Paiva

Economista especialista em reestruturação de empresas, é CEO da Corporate Consulting e membro da Ordem dos Economistas de São Paulo

Mais uma vez surge a questão sobre subsídios e ajuda às companhias aéreas. A história se repete, e o tema vem novamente à tona. Agora, o que se discute é um volume de R$ 6 bilhões a fim de sanear o setor.

Em 2023, isentou-se US$ 8 bilhões de compromissos fiscais. Não obstante a isso, o que vimos foram enormes aumentos das passagens aéreas, cobrança de bagagens e reduções de dispêndios com alimentação, redução de tripulação e de espaços de poltronas. Como se não bastasse, ainda surge um pleito de socorro, sob o argumento de que o custo do querosene de aviação está inviabilizando as operações.

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Aviões da Gol no aeroporto de Congonhas, em São Paulo - Bruno Santos - 17.ago.23/Folhapress - Folhapress

Precisamos entender que o setor aéreo não é o único com problemas no Brasil. Transportadores rodoviários também sofrem para fechar seus custos, indústrias não conseguem mais viabilizar suas operações, o comércio pena com a redução do poder de compra do consumidor, as taxas de juros inviabilizam os negócios e presenciamos hoje o sucateamento do setor produtivo —seria também por falta de socorro ou subsídios que permitam sua sobrevivência?

Quando é que seremos um país em que a dinâmica econômica vai criar a autorregulação dos preços, sem precedentes de ajuda a setores específicos? E quando teremos um governo preocupado com saúde, alimentação, educação, infraestrutura e políticas industriais que permitam o crescimento econômico com controle de despesas em vez de interferências e doações a setores que sempre foram privilegiados?

A política dos subsídios não tem mais espaço num país que passa por problemas primários e alto nível de fragilidade econômica.

Recentemente, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, informou que não haverá saneamento com recursos do Tesouro Nacional, mas sinalizou que poderá flexibilizar planos de pagamento de dívidas tributárias e que o BNDES poderá intervir com recursos para esse socorro ao setor aéreo.

Já não sabemos mais sequer qual o papel do BNDES, pois para um caso desses parece estar bem distante de liberar recursos para desenvolvimento social ou privado. Com isso, pois, o governo acabará por financiar empresas que não pagam seus tributos, criando políticas de renúncias fiscais para quem não pagará, com ou sem renúncias, uma vez que os problemas atuais não permitem, muitas vezes, o cumprimento de programas básicos de subsistência e manutenção de aeronaves.

As dívidas são gigantescas e os recursos provenientes de BNDES certamente serão utilizados para pagamentos de dívidas, não criando, assim, objetividade alguma com programas de crescimento.

O quadro aponta para a liberação de linhas para pagamento de dívidas mal geridas com "handling" (serviços de suporte em solo), contas de abastecimento, dívidas de leasing de aeronaves e outras tantas mais. Ou seja, retira-se recursos de um setor para cobrir gestão inadequada de outro —e, pior, sem garantias, pois as companhias aéreas nem sequer dispõem de ativos que possam ser utilizados para composição de recursos ou mesmo um caixa com margem que permita a devolução desses valores com os juros da operação.

Lembremos que não se organiza um setor desorganizado colocando mais recursos, mas sim organizando sua estrutura de capital e estrutura de resultados —assunto que há décadas nunca foi colocado em pauta.

Ao estabelecer o desvirtuamento que podemos estar assistindo nos próximos dias, espera-se, ao menos, que haja um programa de saneamento com metas mensuráveis de atingimento, troca de gestores por gente altamente capacitada para reversão de resultados e monitoramento das contas.

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