Descrição de chapéu
João Vitor de Paiva Bittencourt

Por que calçar meias trocadas em março

Nós, com síndrome de Down, sabemos como são os olhares de estranhamento

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João Vitor de Paiva Bittencourt

Influenciador digital, é o primeiro conselheiro jovem do Unicef Brasil e o primeiro aluno do curso de educação física da PUC-Goiás com síndrome de Down; ator do filme "Colegas e o Herdeiro", com lançamento previsto para 2025

Imagine sair para trabalhar, treinar, passear ou alguma outra coisa com as meias trocadas; uma preta e outra vermelha, por exemplo. Certamente vai atrair a atenção de quem cruzar com você. Será observado com olhares enviesados. Te acharão diferente e estranho. No mínimo, excêntrico. Quem sabe, maluco. Diferente… Mas não escapará da vista de ninguém. Possivelmente, ficará incomodado ao fim da experiência.

Ser diferente não é fácil. É assim que as pessoas com a síndrome de Down se sentem no dia a dia. Não raro são vistas como olhares de estranhamento. Se estão acompanhadas de um namorado ou namorada, companheiro ou companheira, aí piora o jeito como são observados. E se estiverem fazendo uma atividade produtiva, divertindo-se, estudando... Mas sempre atraem a curiosidade alheia.


Esta quinta-feira (21) é o Dia Internacional da Síndrome de Down. Durante todo o mês de março, centenas de eventos acontecem no Brasil e em todo o planeta para celebrar a data. É bacana, mas não é o suficiente.

O preconceito, a discriminação e o capacitismo ainda estão presentes, de forma forte, na sociedade. As pessoas com a trissomia 21, assim como outras deficiências, são tratadas, infelizmente, como seres incapazes e como "coitadinhas". A maioria ainda é invisível para o grosso da população.

A verdade é que não somos incapazes nem coitadinhos. Somos pessoas com uma deficiência, mas temos sonhos, possuímos talentos, competências e valências. Temos nosso tempo, mas conseguimos aprender e nos desenvolver. Precisamos é de amor, acolhimento, empatia e oportunidades. Oportunidades, essa é a palavra-chave.

Meu exemplo de vida pode mostrar do que somos capazes. Estudei em escolas regulares, passei em quatro vestibulares, curso educação física na PUC-Goiás, sou protagonista do filme "Colegas e o Herdeiro", treino musculação, namoro, viajo sozinho… E tantas outras coisas, como ser o primeiro conselheiro jovem com a T21 do Unicef no Brasil. Tenho plena autonomia.

Agora, me preparo para começar a ter aulas de autoescola para tirar a minha carteira de motorista, por meio de um convênio com o Instituto Mano Down, de Belo Horizonte.

Faço palestras por todo o Brasil e sempre repito que "nós somos capazes". E que o nosso foguete está sempre subindo e voa sem medo. Não desistam de seus sonhos, é a minha mensagem a todos. Sim, somos capazes.

Cito isso não para me gabar. Conheço outras pessoas com a síndrome que também voam alto. Precisaram apenas de oportunidades. Somos capazes, repito.

Por isso, não basta apenas celebrar um dia ou um mês, uma data, enfim. É importante, mas a sociedade precisa avançar mais. A inclusão tem de ser uma atitude diária, estar no coração e na mente das pessoas. É isso que reivindicamos.

Neste mês está rolando uma campanha interessante. Pedimos para as pessoas usarem meias trocadas para elas se sentirem como nós, pessoas com a síndrome, nos sentimos quando somos olhadas como "diferentes". Faça a experiência, por favor.

Tenho certeza de que você descobrirá que o diferente também é bonito.

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