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Paulo Rená da Silva Santarém

Menores de 14 anos deveriam ser proibidos de usar redes sociais? SIM

Necessidade atual; indiferença generalizada e alarmante das big techs justifica ações drásticas

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Paulo Rená da Silva Santarém

Doutorando em direito, Estado e Constituição (UnB), foi gestor do processo de elaboração do Marco Civil da Internet no Brasil

Nos EUA, o estado da Flórida proibiu cidadãos abaixo de 14 anos de terem contas em redes sociais. No Brasil, proposta similar chegou a ser aprovada na Comissão de Direitos Humanos do Senado (PL 2.268/2022). Sem dúvida, a internet como um todo oferece boas possibilidades de interação social e pode ser um espaço privilegiado de socialização. Mas a lógica específica das redes sociais alimenta a violação de direitos humanos das crianças.

Não se sabe quando, qual direito ou qual gravidade, mas toda criança será vítima ou terá contato direto com alguma ilicitude. Tal certeza vem muito da postura indolente das plataformas, sendo inviável às famílias acompanhar e antever as circunstâncias danosas. A indiferença generalizada das big techs é alarmante e justifica medidas normativas mais drásticas.

Crianças olham fixamente para telas de celular, que cobrem seus rostos
Apenas 2 em cada 10 pais usam ferramentas online para controlar filhos na internet - Adobe Stock - Adobe Stock/Seventyfour

Poderia ser diferente, mas nos ambientes online a participação de crianças ocorre sem uma devida intermediação responsável pela proteção integral a que têm direito. Mesmo propostas equilibradas de regulação são recebidas com intransigência pelas plataformas digitais.

Prevalece a proteção de modelos de negócio que lucram com a publicidade direcionada e a exploração de discursos de ódio e desinformação, manipulando as emoções para reter a atenção, criando dependência social e até fisiológica das telas. Imagens e vídeos viciantes deslizam infinitamente, arrastados para cima ou para o lado, enquanto se perde o controle do tempo —e à custa da saúde mental e emocional dos usuários mais vulneráveis. Algo especialmente grave para crianças, cujo estágio neurológico torna mais difícil tomar decisões como recusar os estímulos fáceis de recompensa, como likes ou mais um conteúdo divertido.

Sem uma abordagem mais granularizada e específica para cada faixa etária pelas redes, e sem o horizonte de um compromisso efetivo por parte das plataformas, a realidade impõe um dilema radical. De um lado, permitir o acesso de crianças a ambientes de regras frouxas e aplicadas de modo opaco pelas plataformas; de outro, vedar completamente a presença delas. Nessa dicotomia, a proibição encontra um sentido lógico em redes sociais que não são pensadas para esse público.

Aliás, na complexa discussão sobre a segurança digital, autoridades se opõem ao uso de criptografia forte em aplicativos de mensagem como WhatsApp, a pretexto de viabilizar investigações de violações de direitos contra crianças e adolescentes, a exemplo da violência sexual online.

Seria ideal se todas as interações digitais fossem absolutamente protegidas. A proposta de restringir o acesso só de crianças soa benéfica em comparação a prejudicar os atributos de segurança das comunicações privadas de todas as pessoas.

Na ausência de qualquer moderação eficaz, a realidade tóxica de certas situações autoriza excluir a presença de crianças como meio para protegê-las adequadamente. Não como solução para o problema da toxicidade, mas uma medida paliativa, necessária no contexto atual, e pressupondo que a tecnologia digital é muito maior do que apenas as redes sociais.

Devemos seguir cobrando as responsabilidades de todos, mas não podemos hoje exigir das famílias nem contar com as plataformas para a proteção integral garantida pela Constituição Federal e pelo ECA. Cabe ao Estado brasileiro, pois, a opção política por coibir o acesso às redes sociais para menores de 12 anos, uma vez que não se pode garantir um uso mais seguro dessa tecnologia por parte das futuras gerações.

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