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Ministro da Justiça diz que operação contra empresários bolsonaristas 'beira o totalitarismo'

Oito empresários alvo da PF tiveram suas contas em redes sociais bloqueadas, e sigilos bancários e telemáticos quebrado

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Brasília

O ministro da Justiça, Anderson Torres, criticou nesta terça-feira (23) a operação da PF (Polícia Federal) que mirou empresários bolsonaristas e disse que o episódio "beira o totalitarismo".

A PF cumpriu mandados de busca contra empresários que, em um grupo de mensagens privadas, defenderam um golpe de Estado caso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vença nas eleições presidenciais de outubro.

PF faz operação contra empresários bolsonaristas que defenderam golpe em mensagens privadas. Da esquerda para a direita, em cima: Marco Aurélio Raymundo, Meyer Nigri, Afranio Barreira, André Tissot. Da esquerda para a direita em baixo: José Koury, José Isaac Peres, Luciano Hang e Ivan Wrobel - Folhapress/Agência ALESC/Reprodução

"Não podemos começar a achar normal a forma como as coisas vêm acontecendo no Brasil. A polícia entrando na casa das pessoas, Justiça bloqueando suas contas e quebrando seus sigilos bancários, por conta de elas estarem emitindo opiniões pessoais em um grupo fechado de WhatsApp. Isso beira o totalitarismo", disse à Folha.

Além das buscas, o ministro Alexandre de Moraes determinou o bloqueio de suas respectivas redes sociais, quebras de sigilos bancários e telemáticos. Também autorizou que os empresários sejam ouvidos pela PF.

"Quando se fala em ameaça à democracia e aos princípios constitucionais no Brasil, atitudes como essas, sim, devem ser levadas em consideração", afirmou Torres.

"Vocês já imaginaram se essa mesma lógica fosse usada para todos os que já ameaçaram abertamente o presidente Bolsonaro? Quantas pessoas já não estariam presas?"

O presidente, seus aliados e familiares são alvos de inquéritos que estão sob a relatoria de Moraes no STF e no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

As buscas realizadas contra empresários nesta terça tiveram como base um pedido da PF, no âmbito do inquérito das milícias digitais, que mira uma suposta organização criminosa responsável pela disseminação de fake news e ataque às instituições.

Entre os alvos estão Luciano Hang, da Havan, José Isaac Peres, da rede de shopping Multiplan, Ivan Wrobel, da Construtora W3, José Koury, do Barra World Shopping, André Tissot, do Grupo Sierra, Meyer Nigri, da Tecnisa, Marco Aurélio Raymundo, da Mormaii, e Afrânio Barreira, do Grupo Coco Bambu.

As conversas entre os empresários foram reveladas pelo site Metrópoles.

A PF alega que as buscas têm como objetivo entender a atuação do grupo de empresários em uma possível tentativa de planejar e apoiar ações no sentido de ruptura do Estado democrático Direito.

O crime é previsto no artigo 359-L no Código Processo Penal. "Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais", diz trecho do artigo citado pela PF.

A operação também foi criticada por Bolsonaro e por advogados consultados pela Folha.

Como mostrou a coluna da Mônica Bergamo, em almoço em São Paulo realizado pelo grupo Esfera, o chefe do Executivo questionou: "Vocês acham que é proporcional bloquear as contas bancárias dessas pessoas [empresários que defendem golpe]? Tem justificativa uma medida desse tamanho?".

O candidato petista Luiz Inácio Lula da Silva evitou comentar a crise em evento público com empresários da construção civil, na tarde desta terça (23), em Sâo Paulo.

"Vamos deixar de discutir coisas secundárias e voltar ao que importa", afirmou o ex-presidente, que centrou sua palestra na retomada do programa Minha Casa Minha Vida.

Já advogados disseram entender não ser crime defender golpe de Estado em grupo de WhatsApp. O problema é saber se a ação determinada pelo ministro Alexandre de Moraes baseou-se apenas nas conversas reveladas pelo site Metrópoles ou se há outras circunstâncias ainda desconhecidas do público.

A depender dessas outras circunstâncias, caso elas existam, as medidas adotadas podem ser consideradas apropriadas. Até este momento, contudo, não foram divulgados os fundamentos da iniciativa policial.

EMPRESÁRIOS NEGARAM INTENÇÃO GOLPISTA

Após a divulgação das mensagens que defendiam um golpe, Luciano Hang, dono da Havan, confirmou à Folha que integra o grupo, mas disse que quase nunca se manifesta e em momento algum falou sobre os Poderes.

"Vejo que meu nome vende jornal e gera cliques. Me envolvem em toda polêmica possível, mesmo eu não tendo nada a ver com a história", disse Hang à Folha. "Sou pela democracia, liberdade, ordem e progresso."

Questionada sobre as manifestações do fundador no grupo de empresários, a assessoria da Tecnisa informou que a companhia "não fala em nome de Meyer Nigri" e que ele "não é porta-voz da empresa".

"A Tecnisa é uma empresa apartidária, que defende os valores democráticos e cujos posicionamentos institucionais se restringem à sua atuação empresarial", informou, por meio de nota.

Afrânio Barreira, do grupo Coco Bambu, divulgou nota na qual afirma que nunca se manifestou a favor de qualquer conduta que não seja institucional e democrática. Acrescenta que ações que visem a romper com a democracia não correspondem ao seu pensamento e posicionamento.

"A democracia é a chave para construção de um Brasil melhor. Valorizo, e muito, a oportunidade de conseguir votar e escolher os representantes de nosso povo brasileiro, e todo cidadão deveria ter a consciência da importância deste momento."

"Valorizo e sempre defenderei um processo eleitoral honesto e justo", afirmou o empresário, que acrescenta muitas vezes se manifestar com reações em emojis a alguma mensagem, mas sem necessariamente estar endossando seu teor, ou ter lido todo o seu conteúdo.

"Não somos conspiradores nem a favor de nenhum golpe", disse o empresário José Koury, por meio de nota encaminhada por sua equipe de comunicação.

"As mensagens obtidas em um grupo privado de amigos do WhatsApp foram deturpadas em seu sentido e contexto." Ainda segundo ele, os empresários são contra qualquer tipo de ditadura. Ele também disse que não comentaria mais sobre o assunto.

A preocupação com investidas frequentes de grupos bolsonaristas contra a democracia levou entidades empresariais e da sociedade civil, políticos e cidadãos a endossarem cartas em defesa do Estado de Direito democrático no Brasil.

Ao Metrópoles alguns empresários também se manifestaram negando que defendem um golpe de Estado ou que apoiam atos que sejam ilegítimos, ilegais ou violentos.

Colaborou Ana Paula Branco

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