Saiba o que liga Bolsonaro a Roberto Jefferson e ao ataque a policiais federais

Presidente é um entusiasta do armamento da população e já sugeriu que não cumpriria decisões judiciais

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São Paulo

O presidente Jair Bolsonaro (PL) tenta se descolar da imagem de seu aliado Roberto Jefferson desde a tarde do último domingo (23), quando o ex-presidente do PTB atirou contra policiais federais que cumpriam uma ordem de prisão em sua casa.

Jefferson estava em prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica e foi preso por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal). A justificativa é que o político descumpria medidas impostas pela Justiça.

ambos estão de terno e dão a mão, enquanto olham para a camaera
Roberto Jefferson e Bolsonaro em imagem divulgada em setembro de 2021 pelo PTB - Reprodução

A aproximação entre os dois políticos ficou mais evidente no início de 2020, quando Jefferson se radicalizou e passou a posar com armas e a defender a demissão de todos os ministros do STF.

Relembre alguns pontos que ligam o último episódio do ex-deputado a Bolsonaro.

Críticas à prisão

Em agosto de 2021, Bolsonaro afirmou que não se podia aceitar passivamente prisões como a de Jefferson. No vídeo, o presidente menciona também os casos do ex-deputado federal Daniel Silveira, correligionário de Jefferson, e do blogueiro bolsonarista Oswaldo Eustáquio.

"Um ministro do Supremo Tribunal Federal mandar prender, isso não é justo. (...) Você não pode prender um deputado federal. E foi preso há pouco tempo um deputado federal [Silveira] e continua preso até hoje em prisão domiciliar. A mesma coisa um jornalista, blogueiro [Eustáquio]. Ele continua em prisão domiciliar até hoje. Temos agora um presidente de partido [Jefferson]. A gente não pode aceitar passivamente isso dizendo: 'Ah, não é comigo'. Vai bater na tua porta", afirmou.

Filho de Bolsonaro, Carlos também qualificou a prisão de "injusta", em uma publicação pelo Twitter na mesma época. "Qualquer inocente sabe que sua prisão é preocupante não somente a um, mas a todos os brasileiros", escreveu.

Em abril de 2020, Bolsonaro compartilhou uma live, posteriormente retirada do ar por uma decisão da Justiça, em que Jefferson menciona um suposto golpe para aprovar o impeachment de Bolsonaro, arquitetado com governadores e líderes como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

Bolsonaro acompanha live em que Jefferson divulga teorias conspiratórias - Reprodução/Foco do Brasil no Youtube

Padre Kelmon

No último domingo, quando Jefferson resistia à ordem de prisão, Padre Kelmon (PTB) foi até a residência do ex-deputado para, segundo sua assessoria, oferecer apoio espiritual. Mais tarde, o padre foi visto entregando um fuzil do político aos policiais.

Kelmon ganhou notoriedade neste ano, quando entrou na corrida pelo Palácio do Planalto após o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) negar o registro de candidatura de Jefferson —inelegível até dezembro de 2023 por condenação no escândalo do mensalão.

Uma vez no páreo, Kelmon fez dobradinha com Bolsonaro e tumultuou um debate na televisão às vésperas do primeiro turno. No segundo turno, declarou apoio ao presidente.

Em vídeo deste ano com uma dirigente do PTB, Bolsonaro mandou um abraço a Jefferson.

Xingamento a ministros do STF

Dois dias antes da ordem de prisão, na sexta-feira (22), Jefferson atacou a ministra Cármen Lúcia e a comparou a "prostitutas", "arrombadas" e "vagabundas".

Segundo a coluna Mônica Bergamo, da Folha, o STF havia recebido informações de que o ex-deputado aumentaria o tom de seus ataques às instituições às vésperas do segundo tuno e mantinha um arsenal de armas em sua casa de forma irregular.

Investidas contra o Judiciário não são uma novidade na vida pública de Jefferson. Em maio de 2020, o político publicou uma foto segurando uma arma e pedindo ao presidente para tirar ministros do STF.

"Bolsonaro, para atender o povo e tomar as rédeas do governo, precisa de duas atitudes inadiáveis: demitir e substituir os 11 ministros do STF, herança maldita. Precisa cassar, agora, todas as concessões de rádio e TV das empresas concessionárias Globo. Se não fizer, cai", escreveu ele.

O presidente também acumula ataques e xingamentos a membros do Judiciário. Em agosto de 2021, diante de apoiadores em Joinville (SC), Bolsonaro chamou o ministro do STF Luís Roberto Barroso de "filho da puta". No trecho, Bolsonaro dá a entender que o ministro teria mandado gente para o local para atacá-lo.

Em setembro deste ano, o presidente se referiu ao ministro Alexandre de Moraes, do STF, como "vagabundo" durante um discurso em Novo Hamburgo (RS). Ele se referia à ação contra empresários que participavam de um grupo de WhatsApp onde se defendeu golpe de Estado.

"Eu posso pegar meia dúzia aqui, bater um papo e falar o que bem entender. Não é porque tem um vagabundo ouvindo atrás da árvore a nossa conversa que vai querer roubar nossa liberdade. Agora, mais vagabundo do que esse que está ouvindo a conversa é quem dá a canetada após ouvir o que ouviu esse vagabundo", afirmou.

Ameaças de descumprimento de ordens

Bolsonaro já deu a entender, em maio de 2020, que poderia deixar de cumprir ordens judiciais que considerasse absurdas. Um dia antes, uma operação policial ordenada pelo STF havia atingido empresários, políticos e ativistas bolsonaristas.

"Não teremos outro dia como ontem, chega", disse, na saída do Palácio da Alvorada. "Querem tirar a mídia que eu tenho a meu favor sob o argumento mentiroso de fake news."

Em outro trecho, Bolsonaro afirmou ter em mãos as "armas da democracia" e que "ordens absurdas não se cumprem".

Nas comemorações do 7 de Setembro do ano passado, o presidente repetiu a ameaça.

"Nós devemos, sim, porque eu falo em nome de vocês, determinar que todos os presos políticos sejam postos em liberdade. Dizer a vocês, que qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, esse presidente não mais cumprirá. A paciência do nosso povo já se esgotou", afirmou Bolsonaro.

"[Quero] dizer aos canalhas que eu nunca serei preso", continuou o presidente na mesma ocasião. "Ou esse ministro se enquadra ou ele pede para sair. Não se pode admitir que uma pessoa apenas, um homem apenas turve a nossa liberdade."

Povo armado

Bolsonaro é um entusiasta do armamento da população desde que chegou à Câmara dos Deputados, em 1991. Durante o mandato na Presidência, falou em diversas ocasiões que "um povo armado jamais será escravizado".

No final de setembro deste ano, durante ato de campanha em Campinas (SP), repetiu o bordão. "Se precisar lutar contra essa quadrilha, nós lutaremos", afirmou.

No final de agosto do ano passado, Bolsonaro defendeu a apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada que todos comprassem armas. "Tem que todo mundo comprar fuzil, pô", disse.

O presidente ironizou quem se opõe à medida. "Eu sei que custa caro. Daí tem um idiota que diz 'ah, tem que comprar feijão'. Cara, se não quer comprar fuzil, não enche o saco de quem quer comprar", declarou.

Jefferson começou a tornar público o seu posicionamento em uma publicação no Twitter em maio de 2020, quando, com arma em punho, pediu que Bolsonaro demitisse os 11 ministros do STF.

Anos antes, em 1988, ele chegou a ser acusado de ter ido armado a uma sessão da Constituinte com o objetivo de resolver desavenças com o então deputado Jorge Uequed (PMDB-RS). O caso está registrado no CPDOC (Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil), da Fundação Getulio Vargas.

Jefferson negou ter ido armado ao plenário, mas disse que era membro da Confederação Brasileira de Tiro ao Alvo e possuía uma coleção de armas.

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