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Jornalistas são censurados por documentário sobre 'Lava Jato da Paraíba'

Magistrado diz que filme ofende sua honra; entidades apontam perseguição judicial

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São Paulo

Os jornalistas Eduardo Reina e Camilo Toscano são alvo de processos movidos pelo desembargador Ricardo Vital de Almeida, devido ao documentário "Justiça Contaminada – O Teatro Lavajatista da Operação Calvário na Paraíba", lançado no ano passado.

Entidades representativas de jornalistas classificam o episódio como perseguição judicial contra os profissionais.

Em 2022, o juiz Adhemar de Paula Leite Ferreira Néto, da 3ª Entrância, determinou a retirada do vídeo dos canais onde foram divulgados, sob risco de multa de R$ 500 por dia até o limite de R$ 30 mil.

O documentário tem tom crítico ao que classifica como lava-jatismo durante a Operação Calvário, deflagrada em 2019, que apontou o ex-governador paraibano Ricardo Coutinho (ex-PSB, hoje no PT) como líder de organização criminosa que arrecadava propina em contratos estaduais na área da Saúde.

O ex-governador tem dito que a operação foi uma armação com perseguição política.

Martelo sendo batido por juiz em sessão judicial
Imagem do documentário "Justiça Contaminada", alvo de processo judicial - Reprodução

No documentário, cita-se que o desembargador Ricardo Vital de Almeida e o promotor Octávio Paulo Neto, do Ministério Público (MP-PB), eram chamados pela imprensa local de "Moro e Dallagnol da Paraíba", numa comparação com o ex-juiz e hoje senador Sergio Moro (União Brasil) e o ex-procurador e hoje deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos), que atuaram na Operação Lava Jato.

Na ação, o desembargador sustenta que o filme contém "diversas palavras ofensivas à sua imagem e à sua honra".

Ele pede pagamento de compensação por danos morais de 40 salários mínimos, que os jornalistas se abstenham de veicular qualquer comentário ofensivo à imagem do magistrado e que seja suspendida a veiculação do "ilícito vídeo".

O juiz Ferreira Néto rejeitou pedido para que os jornalistas se abstenham de comentários ofensivos ao magistrado, sob a justificativa de que se trataria de censura prévia. O mérito da ação principal ainda não foi julgado.

De acordo com o jornalista Eduardo Reina, há um total de três ações correndo sobre o assunto. Ele afirmou à Folha considerar que se trata de cerceamento à liberdade de expressão e de imprensa.

"Procurei o magistrado inúmeras vezes. Eu mandei, por exemplo, três emails para o endereço pessoal dele, procurei via assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça, procurei a chefia de gabinete dele, enviei uma lista com dez perguntas que ele pudesse responder se ele não quisesse dar entrevista pessoalmente", disse.

Para entidades representativas de jornalistas, a ação e a censura constituem perseguição judicial contra Reina e Toscano.

"Todo o processo movido contra Eduardo Reina e Camilo Toscano é, na verdade, mais uma absurda e inaceitável tentativa de cerceamento à atividade jornalística", diz uma nota publicada pela Rede de Proteção de Jornalistas e Comunicadores, liderada pelo Instituto Vladimir Herzog e pela Artigo 19.

A entidade repudia a censura ao documentário. "Como se não bastasse, a criminalização da injúria, calúnia e difamação oferece risco à liberdade de expressão, principalmente quando se trata de pessoas públicas, políticos e temas de interesse público", diz a nota da rede.

A reportagem procurou o desembargador Ricardo Vital desde o sábado (11) via telefone e email do gabinete, além de por meio da assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça, mas não obteve resposta.

Dividido em diversos episódios, o documentário que motivou a disputa judicial trata a Operação Calvário como um caso de lawfare, o uso do direito com objetivo de perseguir alguma pessoa ou grupos. No documentário, há relatos do uso das delações premiadas em moldes similares aos da Lava Jato.

Na ação contra os jornalistas, o magistrado afirma ser retratado como "juiz parcial, autoritário e aderente a conchavos".

Durante a operação, Coutinho e outras pessoas chegaram a ser presas na ação que apurava um suposto desvio de R$ 134,2 milhões da área de saúde estadual.

No início de 2020, ele foi denunciado na Justiça estadual. A defesa conseguiu em 2021 decisão do STF para enviar o caso à Justiça Eleitoral paraibana, sob o argumento de que os fatos envolviam caixa de campanha.

Porém a corte eleitoral decidiu devolver o processo para a Justiça comum, por entender que a denúncia não especificava irregularidades eleitorais.

Em junho passado, novamente o ministro Gilmar Mendes declarou a incompetência da Justiça comum e reafirmou a atribuição da Justiça Eleitoral.

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