Governistas pressionam para manter conteúdo jornalístico no PL das Fake News

Parlamentares citam risco de desidratar texto que vai regular atuação das big techs no país

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Brasília

Deputados da base do governo Lula pressionam para manter o dispositivo sobre conteúdo jornalístico dentro do PL das Fake News, em vez de inserir os trechos em um projeto sobre pagamento de direitos autorais a artistas que tramita na Câmara.

O argumento desses parlamentares é que retirar do projeto os itens sobre remuneração de conteúdo jornalístico nas redes poderia desidratar o PL das Fake News.

A expectativa era que a urgência do texto de direitos autorais, da deputada Jandira Feghali (PC do B-RJ), fosse votada nesta terça-feira (9). Se aprovada, esse projeto poderia ir para votação diretamente em plenário, sem precisar passar por comissões. A relatoria ficará a cargo do líder da União Brasil na Câmara, Elmar Nascimento (BA), aliado do presidente Arthur Lira (PP-AL).

O requerimento, no entanto, foi retirado da pauta desta terça.

O acordo que estava sendo construído previa que, para facilitar a aprovação do PL das Fake News, os dispositivos que tratam tanto de direitos autorais como de conteúdo jornalístico fossem retirados do texto relatado por Orlando Silva (PC do B-SP), colega de partido de Jandira.

plenário da Câmara visto de trás
Câmara aprova urgência do PL das Fake News - Pedro Ladeira - 25.abr.2023/Folhapress

Com o mesmo objetivo de reduzir resistência no plenário, um grupo de deputados passou a defender retirar do PL das Fake News e incluir no projeto de Jandira todos os itens referentes à remuneração de conteúdo jornalístico. Parlamentares governistas, no entanto, resistem à movimentação, argumentando que isso poderia esvaziar o texto original de combate à desinformação.

Nesta terça, o líder do PT na Câmara, deputado Zeca Dirceu (PR), afirmou que a urgência do projeto de Jandira só seria votada se ele tratasse apenas da remuneração de direitos autorais para artistas.

"Queremos votar, contanto que não esteja contaminado por outras coisas, que seja só para atender os artistas. Ninguém pode começar a colocar coisa que não tem nada a ver com isso, por mais meritórias que sejam as outras coisas, como é a remuneração do conteúdo jornalístico."

Segundo o parlamentar, nenhum outro conteúdo deve ser retirado do PL das Fake News. "Se começar a tirar coisas do projeto, daqui a pouco não tem mais PL das Fake News."

Essa avaliação também é compartilhada por membros do Executivo. Segundo um aliado do presidente Lula, há o receio dentro do Planalto de que a retirada da remuneração jornalística do texto possa "descaracterizar muito" a matéria.

À Folha o relator Elmar Nascimento reiterou a necessidade de consenso entre os líderes para pautar a urgência do texto —e disse que isso poderá ocorrer nesta semana ou na próxima.

"Quero mostrar que isso não é nenhum tipo de embate entre governo e oposição, nem direita nem esquerda, interessa a todo mundo. Tem artista que apoiou Bolsonaro e tem artista que apoiou Lula", diz, cogitando votar nesta quarta-feira (10) só "se for consenso".

Ele avalia que faz mais sentido incluir remuneração jornalística no texto dos direitos autorais do que manter no PL das Fake News, mas que essa decisão caberá aos líderes. Elmar afirma que fará dois relatórios contemplando os dois cenários (um somente com direitos autorais de artistas e outro que contemple também a remuneração jornalística) e que levará para que as lideranças decidam sobre o tema.

Há dissenso entre os veículos sobre a forma de remuneração por conteúdo jornalístico prevista no PL. Entidades como Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão), Aner (Associação Nacional de Editores de Revistas) e ANJ (Associação Nacional de Jornais), que reúne os principais veículos de mídia, entre eles a Folha, defendem o projeto de lei; veículos menores temem perder financiamento por terem menor poder de barganha.

Autora do projeto de direitos autorais, Jandira Feghali avalia que a remuneração do jornalismo está completamente vinculada ao PL das Fake News. "Até esse momento nós só tratamos na construção do relatório [do projeto de sua autoria] com direito autoral."

Segundo ela, há deputados da base que avaliam ser possível incluir em seu texto os dispositivos sobre remuneração jornalística.

"Essa é uma discussão que vamos fazer. O que a gente não quer é inviabilizar o [PL] 2630 [conhecido como PL das Fake News]. O 2630 é uma prioridade, é questão da democracia brasileira. É central para nós aprovar o 2630, não podemos fragilizar. Achamos que tirar o direito autoral do 2630 não fragiliza o 2630."

"A questão jornalística nós vamos avaliar com o Orlando [Silva], ele está medindo essa temperatura. Mas se tirar o conteúdo jornalístico esvazia o [PL] 2630 e arrisca o apoio amplo, inclusive na sociedade, nós não vamos tirar não. Vamos deixar lá", seguiu a deputada.

No sábado (6), em palestra no Rio de Janeiro, Orlando Silva confirmou a articulação para a retirada desses dois pontos. Ele disse ser simpático à iniciativa, que poderia facilitar a aprovação do PL das Fake News.

"A ideia de remuneração do jornalismo (...) tem um objetivo que, a meu sentir, foi incompreendida durante uma fase que é debater. É justo ou não é justo reconhecer um direito à remuneração de conteúdo indexado? É um debate. Na minha percepção, sim, é justo, por isso ali está. A forma de fazê-lo é outro debate", disse.

Ele ponderou que isso poderia esvaziar o debate do PL das Fake News entre deputados.

Como a Folha mostrou, o objetivo desse movimento é limpar um dos focos de resistência ao projeto de lei. Na terça-feira passada (2), o parlamentar pediu que a proposta fosse retirada de pauta, em movimento que buscou impedir uma possível derrota da articulação política do governo Lula.

Segundo líderes ouvidos pela Folha, a tendência é se debruçar sobre o mérito do projeto de Jandira Feghali na próxima semana, quando Lira já terá retornado de viagem ao exterior. Há expectativa também de que o PL das Fake News volte à pauta na semana que vem, a depender dos acordos costurados pelo relator para sanar alguns focos de resistência, como os temas relacionados à agência que vai supervisionar as big techs.

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