Torres diz à CPI que minuta golpista é fantasiosa e defende seu plano de ação para 8/1

De tornozeleira eletrônica, ex-ministro depõe por 8 horas e tenta rebater versão de delegado da PF sobre operação no 2º turno

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Brasília

O ex-ministro Anderson Torres afirmou à CPI do 8 de janeiro nesta terça-feira (8) que a minuta golpista encontrada em sua casa é "fantasiosa" e que não sabe quem redigiu o texto porque recebia documentos de "diversas fontes".

Torres foi um dos principais apoiadores das investidas antidemocráticas de Jair Bolsonaro (PL) quando era ministro da Justiça e, durante cerca de oito horas, deu sua versão sobre o dia 8 de janeiro, o ataque às urnas eletrônicas e a atuação da Polícia Rodoviária Federal.

O ex-ministro compareceu à CPI de tornozeleira eletrônica, uma das condições impostas pelo ministro Alexandre de Moraes em maio passado para que ele deixasse o Batalhão da Polícia Militar e fosse para a prisão domiciliar.

O documento golpista, revelado pela Folha, foi encontrado no armário da casa dele durante busca e apreensão feita pela Polícia Federal em janeiro. A proposta de decreto dava a Bolsonaro o poder de instaurar estado de defesa na sede do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Anderson Torres na CPI do 8 de janeiro
Anderson Torres na CPI do 8 de janeiro - Gabriela Biló/Folhapress

"É fantasioso isso aí. Jamais saiu da minha casa, não conversei sobre isso com ninguém, e é um documento que estava pronto para ir ao lixo para descarte", afirmou o ex-ministro da Justiça sobre a minuta, repetindo a versão dada à PF em depoimento.

Torres afirmou à CPI ainda que houve "falha grave" na execução do protocolo de ações definido pela Secretaria da Segurança Pública dois dias antes dos ataques, em 6 janeiro, e que só viajou para os Estados Unidos depois de enviar o plano a todos os envolvidos.

A Secretaria de Segurança do Distrito Federal, porém, deixou de fora da reunião o GSI (Gabinete de Segurança Institucional) e o CMP (Comando Militar do Planalto) —responsáveis pela segurança do Palácio do Planalto. Torres era o então secretário da Segurança do DF.

"Se o protocolo fosse seguido à risca, seríamos poupados dos lamentáveis atos do dia 8 de janeiro", disse à CPI, destacando que o protocolo previa, por exemplo, que os golpistas não chegassem até a Praça dos Três Poderes.

"Quando eu viajei, não havia informação de inteligência", afirmou Torres, ignorando que o próprio plano de ações foi elaborado depois que a secretaria detectou a ameaça de invasão de "órgãos públicos que representam os três Poderes", como mostrou a Folha.

Torres é um dos investigados no inquérito aberto no STF (Supremo Tribunal Federal) para apurar possíveis autoridades omissas nos ataques em Brasília. Como estava no exterior no dia dos ataques, ele foi exonerado pelo governador Ibaneis Rocha (MDB) em 8 de janeiro e preso dias depois quando retornou ao Brasil.

Tornozeleira eletrônica usada por Anderson Torres, durante depoimento na CPI do 8/1 - Pedro Ladeira/Folhapress

Sobre a live de 2021 em que Bolsonaro atacou as urnas eletrônicas, o delegado disse que foi "convocado" pelo ex-presidente, e que sua "participação se deu nos minutos finais", lendo um documento da PF.

Torres também tentou se defender sobre a suspeita de que, sob seu comando, a PRF tentou atrapalhar a chegada de eleitores de Lula às urnas durante o segundo turno das eleições.

Ele disse que a planilha sobre os municípios em que Lula e Bolsonaro tinham sido mais bem votados foi elaborada pelo Ministério da Justiça para tentar coibir crimes eleitorais.

O levantamento foi feito pela ex-diretora de inteligência do Ministério da Justiça Marília Alencar, que acompanhou Torres de volta à Secretaria de Segurança do DF após a derrota de Bolsonaro. Ela era responsável pela inteligência da secretaria em 8 de janeiro.

A relatora da CPI, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), protocolou um pedido de acareação entre Torres e o ex-superintendente da PF na Bahia, Leandro Almada. Os dois se encontraram cinco dias antes do segundo turno e, segundo Almada, trataram do apoio da Polícia Federal às blitze da PRF.

À CPI o ex-ministro e ex-secretário também disse que "nunca houve omissão" em relação ao acampamento montado em frente ao quartel-general do Exército.

Como revelou a Folha, no entanto, relatório elaborado pela Abin (Agência Brasileira de Inteligência) alertou sobre a presença de um grupo extremista de militares da reserva. As informações foram entregues ao Ministério da Justiça em 27 de dezembro de 2022 —chefiado por Torres na data.

Moraes decidiu que o ex-ministro deveria comparecer à CPI na condição de testemunha, mas poderia ficar em silêncio para não produzir provas contra si. Mesmo assim, ele respondeu às perguntas —antes, falou por conta própria durante os primeiros 15 minutos.

Moraes também proibiu Torres de ter qualquer contato pessoal com os senadores Marcos do Val (Podemos-ES) e Flávio Bolsonaro (PL-RJ) "considerando a evidente conexão dos fatos em apuração e as investigações das quais ambos fazem parte".

Durante o depoimento, os ex-ministros de Bolsonaro Rogério Marinho (PL-RN), Marcos Pontes (PL-SP) e Sergio Moro (União Brasil-PR), que antecedeu Torres no Ministério da Justiça, foram cumprimentá-lo. A ex-ministra Damares Alves (Republicanos-DF) pediu desculpas por não tê-lo visitado na prisão.

Já o deputado bolsonarista Filipe Barros (PL-PR) levou à sessão pedras de topázio azul, citrino e prasiolita —as mesmas que um apoiador do ex-presidente diz ter comprado para presenteá-lo em Teófilo Otoni (MG) durante a campanha do ano passado.

O advogado Josino Correia Junior disse à Folha que gastou R$ 400 com as 12 pedras do presente (quatro de topázio, quatro de citrino e quatro de prasiolita). Apesar disso, Barros afirmou ter pago R$ 690 por apenas três.

A existência das pedras preciosas veio a público a partir de emails trocados entre ajudantes de ordens de Bolsonaro. A CPI investiga a origem e o paradeiro do presente, já que não consta nenhum objeto parecido na relação oficial de presentes recebidos pelo ex-presidente.

A sessão também foi marcada por um desentendimento depois que a senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) reagiu a uma fala do deputado federal Marco Feliciano (PL-SP) contra a esquerda. Feliciano bateu na mesa enquanto a colega o criticava, o que gerou reação de outros parlamentares.

Pouco depois do impasse, Feliciano acusou o senador Rogério Carvalho (PT-SE), que estava na cadeira ao lado, de ter cuspido nele. "Eu tenho certeza absoluta de que o senador não fez nada de propósito, não cuspiu", disse o presidente do grupo, Arthur Maia (União Brasil-BA), tentando apaziguar a situação.

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