O governo Lula (PT) não decretou que as escolas do Brasil deverão ter banheiros unissex. Publicações de congressistas brasileiros verificadas pelo Comprova sugerem que orientações contidas na resolução nº 2 de 2023 serão instituídas no país. Mas o documento, além de não prever a criação de banheiros unissex coletivos em estabelecimentos de ensino, não tem caráter de lei.
A resolução foi elaborada pelo CNLGBTQIA+ (Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Trans., Queers, Intersexos), ligado ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania. Como verificado pelo Comprova, o órgão tem participação de representantes da sociedade civil e sua função é debater e propor políticas públicas —mas nada obriga o governo a adotá-las.
A resolução foi publicada no Diário Oficial da União em 22 de setembro. No mesmo dia, o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) disse que o "governo Lula impõe banheiros unissex para todas as escolas públicas do país". O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) falou que "o ministro do Lula de Direitos Humanos instituiu o banheiro unissex em escolas de todo o país". Filipe Barros (PL-PR) e Carlos Jordy (PL-RJ) citaram a resolução e afirmaram o mesmo. O deputado federal André Fernandes (PL-CE) explicou que a resolução não tem caráter de lei, mas afirmou que "Lula quer que sua filhinha entre no mesmo banheiro com um marmanjo de 40 anos".
De acordo com Luís Renato Vedovato, professor de Direito Internacional e Direitos Humanos da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e da PUC-Campinas (Pontifícia Universidade Católica de Campinas), um conselho tem como função assessorar um ministério, para escutar a população representada e produzir orientações para essa pasta, que podem ou não ser aceitas como base para futuras políticas públicas. Em nota, a Secom (Secretaria de Comunicação Social) da Presidência da República reforçou que a resolução não tem caráter de lei nem de obrigatoriedade, e que não há decreto ou ordem para o cumprimento do tema.
O documento do CNLGBTQIA+ estabelece parâmetros que garantem condições de acesso e permanência de pessoas travestis, mulheres e homens transexuais, e pessoas transmasculinas e não binárias nos sistemas e instituições de ensino como um todo. De acordo com Amanda Souto, advogada e integrante do conselho, a resolução não sugere a instauração de banheiros unissex, mas sim destaca o direito da pessoa utilizar o banheiro de acordo com sua identidade de gênero. O texto propõe ainda, "sempre que possível, a instalação de banheiros de uso individual, independentemente de gênero, para além dos já existentes masculinos e femininos nos espaços públicos", para "minimizar os riscos de violências e/ou discriminações".
O que dizem os responsáveis pelas publicações
A reportagem entrou em contato com os parlamentares citados acima por terem compartilhado o conteúdo.
André Fernandes e Felipe Barros disseram que o artigo 5º, que defende o direito ao uso de banheiros de acordo com a identidade de gênero, comprovaria a determinação de banheiro unissex.
"O governo está mentindo se falar que não se trata de banheiro unissex coletivo", falou Fernandes. Já Barros lembrou que "As próprias entidades LGBT, como a Antra [Associação Nacional de Travestis e Transexuais], comemoraram a publicação da resolução por garantir o uso de banheiros de acordo com o gênero de cada estudante".
Sergio Moro defende que a resolução segue a orientação ideológica do governo e que "ao permitir o ingresso em banheiros segundo a autodeclaração de gênero pelo estudante, a resolução, sem usar o termo unissex, permite que banheiros masculinos e femininos sejam utilizados independentemente do gênero biológico".
Nikolas Ferreira e Carlos Jordy não se manifestaram até a publicação desse texto.
Por que investigamos
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