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É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

Reações a discurso de Biden lembram que não se enfrenta fascismo com neutralidade

Esperar maturidade da elite política ou da mídia política nos Estados Unidos é cortejar desilusão

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Pela primeira vez, mais de dois terços dos americanos acreditam que sua democracia está à beira do colapso. A pesquisa da Universidade Quinnipiac, feita no final de agosto, registrou que o medo do fim da democracia constitucional mais antiga do mundo é hoje apontado por 69% da população.

Desta vez, o temor da autocracia foi distribuído entre a população geral e em todas as faixas de idade, não ficou só entre democratas e independentes.

A rede NBC, no mesmo período, divulgou um levantamento revelando que, mesmo depois de a inflação bater a maior alta em 40 anos, o custo de vida ficou em segundo lugar (16%) como a maior preocupação dos americanos. "Ameaças à democracia" lideraram, com 21%.

O ex-presidente Donald Trump chega a comício de republicanos na Pensilvânia - Spencer Platt - 3.set.22/Getty Images/AFP

Até críticos do exercício de poder americano, que temem as consequências globais se o país eleger um novo Trump ou o original, olhariam para o democrata na Casa Branca em busca de liderança nessa crise da república, a mais grave desde o final na Guerra Civil, no século 19.

Mas esperar maturidade da elite política ou da mídia que cobre política aqui é cortejar desilusão. No último dia 1º Joe Biden fez o discurso mais contundente de seus 18 meses de mandato, num diagnóstico da ameaça autoritária reconhecida pelos 69% dos americanos.

Depois de se conter por longos meses, preocupado em passar vários amplos pacotes de legislação, Biden apontou o óbvio. Disse que parte do eleitorado de Trump é semifascista; que eles só aceitam dois resultados numa eleição —vencemos ou fomos roubados—; e que há um movimento liderado por republicanos, nos estados, para subverter as eleições de meio de mandato, em novembro.

Biden, que há cinco décadas negocia com a oposição, no Senado ou na Casa Branca, teve que entrar na briga que devia ter sido travada no Congresso há anos. Lembrou os eleitores que Trump e seu culto intimidam o Partido Republicano com um projeto claro de pôr um ponto final à experiência democrática.

Nada disso é contestado pela maioria dos americanos, incluindo conservadores horrorizados com a invasão do Capitólio e exaustos da mentira de que Biden não venceu em 2020.

Uma intenção secundária do presidente pode ter sido jogar a isca para o patológico narcisista alaranjado. E ele, claro, a mordeu no sábado num comício em que usou todos os clichês apocalípticos habituais, voltando o foco da próxima eleição para ele, longe da mensagem econômica e social. Trump xingou Biden de inimigo do Estado —leia-se, inimigo da impunidade e da conta bancária do republicano.

Mas sinto informar que outro segmento do establishment atropelou o ex-presidente e chegou primeiro ao ridículo. Nos dias seguintes, acovardados repórteres da falsa equivalência continuaram a estenografar trumpistas, questionando a legitimidade da defesa que Biden fez da democracia. O tal sistema do qual dependem para exercer livremente a profissão.

Um respeitado repórter político da CNN foi demitido da empresa abruptamente horas depois do discurso de Biden. O comedido John Harwood, 65, disse no ar, após o discurso: "É difícil para nós, treinados para não defender lados entre dois partidos com diferenças honestas de opinião, admitir que não se trata de um debate honesto. Há um demagogo desonesto controlando o Partido Republicano".

Foi fulminado pelo expurgo já em curso exigido pelos novos proprietários da CNN, defensores da tese de que se cobre fascismo com neutralidade.

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