“Ah, os drive-ins voltaram...”, ouço a moça falando com seus botões e suspirando. Com a máscara no queixo, ela anda na rua de cabeça baixa para conferir no celular as últimas notícias do mundo. Deu vontade de perguntar: “Voltaram de onde?”.
O certo é dizer que os drive-ins estão chegando, direto do túnel do tempo. A onda começou nos anos 20 do século passado e atingiu o ápice nos 50, decaindo com o advento da televisão. Mas isso nos Estados Unidos. Por aqui, tivemos algumas tentativas de copiar a febre, mas ela não pegou. Antes de ressurgir como efeito colateral da pandemia, havia um único em atividade no país, o Cine Drive-in, de Brasília. Uma cidade perfeita para eles.
Um shopping de São Paulo oferece sessões com só 50 carros —“uma pegada íntima e VIP”, segundo o marketing, que não explica se a intimidade está liberada entre as pessoas ou entre os carros. No Rio, ressuscitaram um espaço aberto em 1966 e fechado há 27 anos na Lagoa. Primeira experiência do formato na América Latina, atraía menos gente que um tobogã vizinho. Em matéria de diversão dentro do carro, o carioca sempre preferiu a “corrida de submarinos”, praticada por casais na orla da praia.
O melhor do drive-in está em como o cinema nostalgicamente se autoalimentou dele: cenas de iniciação sexual entre adolescentes, obrigatórias em filmes ambientados nos tempos da brilhantina como “Grease”, “Loucuras de Verão”, “Vidas sem Rumo”. Até “Lolita”, de Stanley Kubrick, tem a sua.
Em “Na Mira da Morte”, estreia de Peter Bogdanovich na direção, a tela do drive-in exibe trechos do filme B “Sombras do Terror”, de Roger Corman, estrelado por Boris Karloff. Karloff, que num jogo de espelhos também atua na obra de Bogdanovich, é quem tenta salvar as pessoas que, presas nos carros, são atacadas a tiros por um armamentista enlouquecido. Espetáculo para Bolsonaro nenhum botar defeito.
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