André Liohn

Fotojornalista especializado na cobertura de guerras, vencedor da medalha Robert Capa

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André Liohn
Descrição de chapéu Guerra da Ucrânia Rússia

Como a letra 'Z' se tornou a imagem que define a invasão russa da Ucrânia?

Para o Kremlin, o que importa é que, ao usar o símbolo, os russos sintam que estão fazendo algo 'para' ou 'pelo' país

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Esta coluna de André Liohn, publicada originalmente às 7h desta terça (26), reproduz conteúdo do site americano Vox sem citar a referência original. O texto apresenta a mesma argumentação, encadeia frases de forma idêntica e usa traduções literais da reportagem americana. Não há nenhuma informação substancial na coluna que não esteja no roteiro —uma comparação indica que, do original em inglês, cerca de 65% do conteúdo foi traduzido e transcrito por Liohn. A semelhança foi apontada à Folha por um leitor, que escreveu ao ombudsman.

Em 5 de março, o ginasta russo Ivan Kuliak ganhou a medalha de bronze nas barras paralelas no Mundial de Ginástica promovido em Doha, no Qatar. Ao seu lado estava o vencedor, o ucraniano Illia Kovtun.

O Exército russo havia invadido a Ucrânia nove dias antes, e o clima de disputa entre os dois atletas superou a competição esportiva quando Kuliak decidiu demonstrar apoio à guerra improvisando um símbolo em seu uniforme. Com três pedaços de fita adesiva, o atleta fez a letra "Z" em seu peito.

Militares de tropas pró-Rússia circulam em tanque próximo a Mariupol
Militares de tropas pró-Rússia circulam em tanque próximo a Mariupol - Alexander Ermochenko - 17.abr.22/Reuters

Já naqueles primeiros dias de guerra, o "Z" se tornava uma obsessão russa e um símbolo cada vez mais controverso em todo o mundo. Para Kuliak e muitos apoiadores de Vladimir Putin, o uso da letra era a maneira de demonstrar apoio à guerra e sua lealdade ao regime do presidente russo.

O símbolo logo apareceu em outdoors em Moscou, São Petersburgo e outras cidades do país. Surgiu estampado em camisetas, panfletos, memes e flashmobs, com pessoas formando a letra, como fizeram crianças com câncer terminal na cidade de Kazan, fotografadas por um drone do lado de fora do hospital.

A letra "Z", também usada para vandalizar casas de pessoas contrárias à invasão, foi, por outro lado, oficialmente proibida em países como Alemanha e Lituânia como forma de apoio à guerra. A pergunta que resta: como este símbolo se tornou a imagem que define a invasão russa da Ucrânia?

O "Z" foi visto pela primeira vez no final de fevereiro em vários equipamentos militares na fronteira da Ucrânia, como tanques, caminhões e veículos leves, mas não era o único símbolo usado pelos russos. Em outras regiões, os mesmos equipamentos foram identificados por Moscou com as letras "V" e "O".

No início da guerra, não estava claro o que elas significavam, principalmente porque o "Z" não é usado no alfabeto cirílico, no qual o som da letra é representado pelo símbolo que em português se parece com o número 3, enquanto a letra "V" do alfabeto latino aparece no cirílico com o símbolo "B".

Mesmo que o Exército russo tenha dado diferentes versões para o significado das marcas, analistas afirmam que os sinais foram adotados para fins táticos. Cogitou-se que as letras serviriam para que os russos se diferenciassem dos ucranianos, já que ambos os exércitos usam muitos equipamentos iguais.

Para além do uso prático nas linhas de frente, na Rússia o símbolo ganhou novos significados no dia a dia dos cidadãos e, o governo entendeu que poderia usá-lo como uma ferramenta de propaganda.

Uma das maneiras mais comuns de dar significado à letra "Z" em russo é latinizando-a na palavra russa "Za", que significa "para". Assim, o som foi incorporado em slogans como "para a vitória", "para o presidente", "para as crianças", "para o bem", entre outros.

Para a russa Aglaia Snetkov, professora de política externa e segurança nacional na University College, de Londres, a falta de naturalidade nas fotos compartilhadas na internet, como no registro de crianças que ainda não sabem nem ler desenhando o "Z", serve para atingir o emocional da população russa, que interpretará a mensagem de que essa guerra está sendo combatida "para as novas gerações".

O que importa para o Kremlin é que, ao clicar em hashtags com imagens promovendo os slogans, os russos sintam que estão fazendo algo "para" ou "pela" Rússia. Não à toa, muitas das milhares de imagens atualmente compartilhadas em mídias sociais são oriundas do próprio Ministério da Defesa da Rússia.

O professor Kiril Avramov, especialista em propaganda russa e soviética na Universidade do Texas, em Austin, diz que objetivo do governo é popularizar o símbolo, principalmente entre os jovens, transformando seu uso numa espécie de gíria que também possa ser utilizada em outros contextos.

Para fazer da letra "Z" um ícone patriótico, o Kremlin também se esforça para conectá-lo aos momentos de glórias militares da Rússia, em particular a vitória soviética contra a Alemanha nazista na Segunda Guerra.

Apesar da vitória que estabeleceu a União Soviética como uma superpotência, o trauma causado pelas perdas durante a invasão nazista foi devastador, e, por isso, a "Grande Guerra Patriótica", celebrada sempre no dia 9 de maio, é ainda hoje um poderoso símbolo de heroísmo e glória na Rússia.

O meme postado no Instagram do Ministério da Defesa russo em 4 de março, que até esta segunda (25) tinha mais de 21 mil curtidas, mostra um "Z" sobreposto a uma foto em preto e branco de soldados soviéticos de um lado e uma imagem de militares russos modernos olhando para trás do outro lado.

A hashtag "героиz", intencionalmente escrita de forma errada, com "Z" no final —o correto seria "героиз"—, significa "heroísmo". A foto à esquerda é uma imagem famosa da Parada da Vitória de Moscou, de 1945, celebrando a rendição da Alemanha, ainda hoje o maior desfile já realizado na Praça Vermelha.

A imagem, que mostra soldados soviéticos carregando bandeiras e estandartes nazistas capturados, liga-se diretamente à afirmação de Putin de que a Rússia está, mais uma vez, combatendo o nazismo, desta vez, na Ucrânia. A mensagem é facilmente reconhecível para aqueles que viveram o período soviético.

No mesmo meme, o "Z" está antes do slogan "za pobedu" ou "para a vitória", e o símbolo, estilizado com três listras pretas e duas laranjas. Este padrão de cores representa o esquema de cores da Fita de São Jorge, um dos símbolos de propaganda favoritos do presidente russo.

Suas origens remontam a centenas de anos da história russa como símbolo de glória militar. No final da Segunda Guerra, Stálin usou a fita em uma medalha concedida a todos os soviéticos que serviram na guerra —incluindo civis. Hoje, a entrega anual da fita de São Jorge antes do Dia da Vitória se tornou um emblema central das comemorações do triunfo soviético sobre os nazistas.

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