Juca Kfouri

Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP.

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Juca Kfouri

A jogatina é sempre ímã da bandidagem

Inevitável que onde haja aposta esportiva ocorra tentativa de alterar resultado

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​A história é tão velha como o futebol, para ficar apenas em um esporte.

Cartolas das antigas adoravam contar como compraram o goleiro do adversário ou o juiz para ganhar jogos. Ou como nem precisaram gastar um tostão, apenas ameaçar.

Os tempos evoluíram, e a simples necessidade de vencer para ficar bem no campeonato se transformou em oportunidade de enriquecer.

No Brasil, em março de 1970, em plena ditadura, surgiu a loteria esportiva, bancada pela Caixa Econômica Federal.

Durante 12 anos fez milionários entre seus ganhadores e fez a alegria de veículos com generosas verbas publicitárias.

A zebrinha do Fantástico virou simpática personagem dos domingos brasileiros até que, em outubro de 1982, demolidora reportagem da revista Placar denunciou, em 13 páginas, um gigantesco esquema de manipulação de resultados dos jogos escolhidos para as apostas. A bichinha virou porta-voz da Máfia da Loteria.

Zebrinha do Fantástico
A zebrinha do Fantástico virou porta-voz da Máfia da Loteria - Reprodução

A credibilidade da chamada loteca foi posta a escanteio e nunca mais recuperada por mais que, imediatamente após a denúncia, com 125 jogadores, cartolas, empresários e árbitros envolvidos, tenha sido defendida por quem teve seus ganhos prejudicados.

Curiosamente, o fio da meada das quadrilhas espalhadas pelo país, em Curitiba, Salvador, São Paulo, Fortaleza e Rio, surgiu em Santos, puxado pelo saudoso repórter Sérgio Martins.

De lá para cá, novos escândalos se sucederam, como o caso do ex-árbitro Edilson Pereira de Carvalho, revelado por André Rizek, na Veja, em 2005, a dita Máfia do Apito, aí envolvendo jogatina clandestina, como o Totonero italiano, que, em 1980, jogou na lama o nome de Paolo Rossi, algoz da seleção brasileira na Copa do Mundo da Espanha.

A internet ampliou de maneira exponencial a possibilidade de globalizar as apostas, não apenas no resultado de jogos como no número de escanteios de uma partida, de faltas, ou de quantas vezes o goleiro do Corruptópolis FC cuspirá no gramado ou nas luvas.

São dezenas de livros já publicados pelo mundo afora com a comprovação de que grupos asiáticos, africanos, europeus e americanos manipulam do tênis ao vôlei —parece que o xadrez ainda não, talvez por lembrar o sol nascendo quadrado.

No Brasil chega a ser escandaloso o número de bancas de apostas esportivas, patrocinadoras de 11 em cada dez programas esportivos, camisas de clubes, com ex-atletas e comunicadores no papel de garotos-propaganda, todas elas com sedes fora do país, sem controle nenhum, da Receita Federal, de quem quer que seja, para não falar dos conflitos de interesses que produzem e da óbvia lavagem de dinheiro.

Lembremos que a regulamentação é insuficiente, basta recordar de quando os bingos foram brevemente legalizados no Brasil, para desgraça dos ex-ministros Rafael Greca, do Esporte e Turismo, e José Dirceu, da Casa Civil. Porque, sem moralismo, a jogatina é sempre ímã da bandidagem.

Paolo Rossi teve seu nome jogado na lama no Totonero - Omega Sabattini - 8.jul.82/AFP

Eis que, novamente em Santos, surge a corajosa denúncia por parte de Andres Rueda, o presidente santista, de que um agora ex-funcionário do clube quis comprar facilidade da goleira do Bragantino, o que a jogadora confirma.

Como aconteceu 40 anos atrás, não duvidem a rara leitora e o raro leitor: é apenas a ponta do iceberg.

Já que no Patropi até o passado é incerto, dá saudade dos cartolas que corrompiam adversários por amor.

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