Temporada de caça aos cogumelos comestíveis começa no RS

Clima ameno e úmido favorece crescimento de fungos nas florestas

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Cambará do Sul

Na pequena e pacata cidade de Cambará do Sul, na região dos Campos de Cima da Serra, distante a pouco mais de 230 km ao norte de Porto Alegre, o turista aficionado por aventuras gastronômicas pode caçar cogumelos comestíveis em meio à floresta de pinus, e depois saboreá-los ali mesmo, em seu habitat natural.

A atividade é desenvolvida pelo glamping Parador (a palavra vem da mistura de "camping" e "glamour"), localizado próximo aos Parques Nacionais Aparados da Serra e Serra Geral, próximo aos cânions Itaimbezinho e Fortaleza.

A caçada dura cerca de 1h30min e pode ser agendada pelos próprios hóspedes entre os meses de maio e junho, todos os dias da semana.

A busca por fungos que brotam rapidamente no solo úmido ou em troncos de árvores, após um período de chuva e sol, não deixa de ser uma autêntica aula de biologia ao ar livre, sempre monitorada com um profissional.

A bordo de um quadriciclo individual ou duplo, um guia leva os caçadores até as florestas de pinus. Durante o passeio, o turista aprende a identificar as diferentes espécies de fungos [venenosos ou comestíveis], como se desenvolvem e suas funções na natureza. A degustação dos fungos coletados é feita no local.

‘’O principal cogumelo encontrado aqui na região é o porcini. Conseguimos coletar em grande quantidade, mas é preciso um bom treinamento antes de sair caçando sozinho. O ideal é que o turista interessado faça um curso de treinamento para saber identificar bem os cogumelos e suas características’’, aconselha o chef Rodrigo Bellora, há 20 anos na gastronomia.

Cogumelo porcini colhido em caça do glamping Parador - Carlos Macedo/UOL

Além das roupas leves e um boné, também é recomendável que os aventureiros levem na mochila uma jaqueta impermeável ou uma capa de chuva, pois o clima na serra gaúcha muda rápido e pode surpreender.

Um bom par de tênis com solado antiderrapante ou bota específica para trilhas também ajudam dando estabilidade, aderência e segurança ao caminhar.

Além da caçada aos cogumelos selvagens, também é possível participar do ‘’Despertar dos Cogumelos Selvagens’’. O evento gastronômico, de caráter sazonal, ocorre de 24 a 26 de maio e de 21 a 23 de junho, e reúne chefs e biólogos especializados em um roteiro de três dias.

A ideia é apresentar mais a fundo as variedades de fungos que habitam as matas de pinus e, posteriormente, oferecer aos turistas pratos da alta gastronomia feitos com eles.

É o caso, por exemplo, do tabule de feijão, um mix de feijões gaúchos temperados, cogumelos laminados, nozes, azeite de oliva e ervas aromáticas, e do nhoque de pinhão com fungos porcini.

O biólogo Jeferson Müller Timm, 40 anos, especialista em cogumelos, afirma que há ao menos três tipos de fungos na mata exótica de pinus da região, entre eles o porcini (Boletus edulis), o Suílus spp e Lactários deliciosus.

‘’Há muitas espécies de cogumelos que são tóxicos e inclusive podem até matar, como é o caso do fungo Amanita phalloides, conhecido como ‘cicuta verde’ ou ‘anjo da morte’", alerta o especialista.

A espécie é originária da Europa, mas também pode ser encontrada nas Américas, inclusive em países como Argentina e Uruguai. Já no Rio Grande do Sul sua aparição é rara.

Sobre a coleta e manuseio dos fungos comestíveis, Jeferson recomenda que, ao realizar a atividade de caça, o turista corte com uma tesoura a base do cogumelo e retire a terra com um pincel antes de colocar no cesto.

‘’Assim não leva terra para dentro do cestinho. Não é legal lavar o cogumelo, porque ele absorve muita água e acaba perdendo textura e sabor. Ao usarmos o cesto, a gente favorece que as sementes dele se dispersem pelo caminho proporcionando o nascimento de novos cogumelos’’, explica.

Outro conselho do biólogo é que se consuma, de preferência, o fungo cozido.

Além de compor pratos saborosos, também é possível criar outros tipos de alimentos como biscoitos, sal e até azeite. Estes fungos comestíveis apresentam uma boa quantidade de proteínas, vitaminas, principalmente B2, B3 e B5 e C, antioxidantes e fibras.

Em Cambará do Sul, além dos cogumelos, outro atrativo é o pinhão —mais especificamente a tradicional paçoca de pinhão. Com milhares de hectares de mata araucária, o local torna fácil encontrar a semente espalhada pela mata, principalmente no outono, época da colheita .

‘’Muito saboreado nas festas juninas, o pinhão pode ser feito de várias maneiras, seja ele cozido, assado na brasa, ou adicionado a diversas receitas culinárias’’, comenta o chef Rodrigo Bellora.

Pinhão no festival de orgânicos Da Terra ao Prato, no Parque Villa Lobos - 01.jun.2017-Alberto Rocha/Folhapress

Outro costume da região Serrana do Rio Grande do Sul é comer a ‘’sapecada de pinhão’’, uma herança dos tropeiros —homens que conduziam a tropa, levando o gado de um lugar para o outro. Em outras palavras, é o pinhão preparado no mato, nas grimpas do pinheiro.

Homem de barba vestido com dolmã segura pote com paçoca e mostra para a câmera
Chef Rodrigo Bellora exibe a paçoca de pinhão - Marcos Moreira

‘’Basta juntar os resíduos de galhos secos da araucária, colocar os pinhões coletados na floresta e, então, acender uma fogueira. Esse hábito de comer pinhão foi herdado de algumas tribos indígenas daqui da região, como por exemplo, os caingangues, e também serve de alimento para muitos animais’’, explica Bellora.

Para que o pinhão cozinhe totalmente, deve-se acender o fogo na parte de cima dos galhos [de cima para baixo]. Depois, é só remover a casca com a ajuda de um martelo ou até mesmo com uma pedra e ter cuidado para não se queimar.

O repórter viajou a convite do restaurante Alma RS

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