Descrição de chapéu Folha Mulher Mátria Brasil

Segunda imperatriz do Brasil, Amélia Augusta foi esquecida após morte de dom Pedro 1º

Viúva do monarca com apenas 22 anos, ela acumulou perdas ao longo da vida

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Mary del Priore

Sócia honorária do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) e integrante da Academia Paulista de Letras

Teresópolis

Linda, jovem e rosada, ela foi comparada a uma pintura de Corregio. Tinha 17 anos. Apaixonado, o marido, dom Pedro 1º, encomendou uma condecoração em sua homenagem, a Ordem da Rosa.

Os poucos anos passados no Brasil foram agitados, e o casal partiu antes de perder o trono. Ele foi para a guerra, deixando-a com a filha recém-nascida. Quando voltou, tuberculoso, foi para morrer. Amélia Augusta Eugenia Napoleona, nossa segunda imperatriz, ficou viúva, aos 22 anos.

Sobre um fundo branco, ilustração de Veridiana Scarpelli mostra mulher branca. Ela aparece, da cintura para cima, sentada em uma poltrona de madeira, com encosto de tecido azul. Está de costas para o lado esquerdo da cena, olhando fixamente em direção ao leitor. Usa uma roupa preta, com mangas longas. A mão esquerda está apoiada na coxa esquerda. A direita está levemente levantada, segurando uma rosa. Do lado direito da cadeira tem uma mesinha redonda, com os pés torneados. Em cima dela, um vaso azul ovalado traz um lindo buquê de rosas vermelhas, com folhas verdes. Apoiado no decote, que vai de ombro a ombro, ela tem um broche prateado. Os cabelos são curtos, até o pescoço, estão muito bem arrumados e são amparados por uma faixa branca, que passa atrás das orelhas. Usa brincos de pérolas penduradas, com tamanhos diversos. A expressão do rosto é calma, com os lábios serrados.
Amélia Augusta Eugenia Napoleona, segunda imperatriz do Brasil, ficou viúva aos 22 anos e caiu no esquecimento - Veridiana Scarpelli/Folhapress

Com a filha, Maria Amélia, ela se instalou no Palácio das Janelas Verdes, em Lisboa. Foi quando os espinhos entraram na vida da rosa. A mulher só é um ângulo morto da história. Resíduo silencioso, é como se não existisse. Por isso, sabemos tão pouco sobre ela.

Logo após o enterro de dom Pedro 1º, Amélia se tornou um personagem coadjuvante. Testamenteira do marido, respeitou a tradição da "terça" deixado aos filhos bastardos, incluindo a de Maria Isabel, filha da Marquesa de Santos. Como tutora dos príncipes que tinham ficado no Brasil, correspondia-se com eles de forma amorosa e era chamada de "mamãe" por dom Pedro 2º, seu "filho querido".

Apesar da ligação afetuosa que tiveram no Brasil, rompeu com a enteada e futura rainha de Portugal, dona Maria da Glória. De temperamento forte, a jovem tinha, segundo biógrafos, ciúmes e ressentimentos.

A morte precoce do marido de Maria da Glória, Augusto, irmão de Amélia, afastou ainda mais a madrasta da enteada. Sem o irmão ao lado da rainha, o prestígio da viúva de dom Pedro 1º virou pó.

Ela e a filha se refugiavam em Caxias, pequena cidade balneária em Portugal. Fugiu também da cerimônia de casamento de Maria da Glória com Fernando de Saxe e Coburgo, "o formoso".

foto de amélia, sentada ao lado de um retrato, por sua vez sobre a mesa
Amélia Augusta, viúva de dom Pedro 1º, em fotografia de cerca de 1860 (autor desconhecido) - Reprodução

Cada vez mais afastada da Corte, sua preocupação era ser reconhecida como ex-imperatriz, viúva de dom Pedro 1º e "membro da família imperial brasileira". Sua pensão por viuvez significava a persistência do laço conjugal, a imagem permanente do marido, sua posição, seu nome e sua fortuna além da morte. Era também um freio para que a viúva não adquirisse independência.

Aos olhos dos brasileiros que adoravam a imperatriz Leopoldina, Amélia foi apenas uma substituta. E pior. Com dom Pedro 2º menor de idade, temia-se sua possível influência nos negócios de Estado, e mãe e filha foram proibidas de colocar os pés no Brasil. A viuvez exigia silêncio e aceitação.

Amélia se voltou para a Baviera, onde tinha apoio de familiares e amigos. Voltou-se também para a educação da filha que, apesar da saúde frágil, crescia com a beleza da mãe. Passavam férias em Munique.

Enquanto isso, no Rio de Janeiro, o procurador Samuel Phillips & Cia tratava de sua dotação. Conforme resolução da Assembleia Legislativa, foi confirmada a pensão de 50$000 (50 mil réis) anuais para a "ex-imperatriz viúva do Brasil". E a maioridade de Pedro 2º, que sempre manteve boas relações com ela, permitiu que mãe e filha fossem reconhecidas como membros da família imperial brasileira em 5 de julho de 1841.

Enquanto os enteados se casavam, Amélia resolveu cuidar do futuro da filha. Os pretendentes se apresentavam: príncipe de Wilhelmine Montléart, Adalberto de Saxe-Hildburghause ou Alberto da Saxônia.

Ao final do verão de 1850, Amélia e a filha regressaram a Lisboa. Ela pretendia conviver de forma harmoniosa com a enteada. As diversas gestações e o apetite transformaram Maria da Glória numa obesa que dividia o tempo entre a política e os filhos. A longa separação, porém, não ajudou a apagar desavenças do passado.

Aos 19 anos, Maria Amélia dependia da Câmara dos Deputados e do meio-irmão dom Pedro 2º para a liberação de seu dote. Amélia não se conformava que a filha não tivesse o mesmo das tias Januária e Francisca e ainda cobrava 100 contos adicionais para um enxoval. Foi uma luta.

No início de 1852, logo após um noivado com o arquiduque Maximiliano da Áustria, Maria Amélia apresentou os primeiros sintomas de tuberculose e, no ano seguinte, fechou os olhos. Tinha 22 anos, a mesma idade em que Amélia ficou viúva.

Sem marido, sem mãe –que havia falecido um pouco antes– e sem filha, Amélia contava as tragédias. Guardou vestidos e bonecas de Maria Amélia até o fim da vida e financiou um hospital em Funchal com o nome dela.

Instalada em Lisboa, a rosa feneceu. Enclausurada no segundo andar do palácio, Amélia não deixou que esquecessem a imagem do marido exigindo luto na cidade, salvas de canhão e toques fúnebres de sinos quando do seu aniversário de morte.

Ela nunca quis a nacionalidade brasileira ou adaptou-se a Portugal. Estrangeira em terras estranhas, teve uma vida trágica, marcada por perdas. Legou a maior parte da sua fortuna à irmã, rainha da Suécia, e aos seus sobrinhos, filhos do duque Maximiliano.

Morreu aos 60 anos, esquecida de todos, em 26 de janeiro de 1873. Seus restos mortais foram trasladados para o Brasil em 1982 e jazem na Cripta Imperial do Monumento da Independência do Brasil, em São Paulo.

Projeto retrata mulheres ao longo da história do Brasil

O projeto Mátria Brasil apresenta mulheres relevantes e, em geral, pouco conhecidas ao longo da história do país, desde a invasão portuguesa até os dias de hoje. Os textos são assinados por historiadoras e historiadores de diversas regiões brasileiras, e têm publicação semanal ao longo de seis meses.

A série foi idealizada pela professora do departamento de história da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Patrícia Valim, que também é uma das coordenadoras do projeto.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.