Como pais podem melhorar (ou piorar) o desempenho dos filhos em matemática

Especialistas recomendam tratar a matéria com leveza e de maneira divertida

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São Paulo e Ribeirão Preto

Renata Pimenta, 45, conhece a rotina de seu filho diante do dever de casa de matemática: ele enrola, conversa sobre outras coisas, tenta adiar o máximo que puder. O estresse é tão grande que Henrique, 9, tem tique nervoso nessa hora.

"Ele não tem o mesmo ânimo, como nas outras matérias", diz Renata. "É a matéria que ele demora mais para executar e à qual ele tem que se dedicar mais." E é disso mesmo que Henrique não gosta: ele acha muito difícil e demorado resolver os problemas.

A dificuldade do menino é comum e tem nome. Chama-se ansiedade matemática; ela envolve tensão ou apreensão diante de números e pode despertar reações físicas desagradáveis, como dor no estômago, suor e taquicardia, entre outras.

Melissa Poli Vilhena, 13, tem facilidade com matemática; ela seguiu o exemplo do irmão, da mãe e da avó, que também se dão bem com a disciplina - Ricardo Benichio/Folhapress

Pessoas de todas as faixas etárias estão sujeitas a isso, e pesquisadores descobriram na última década que a ansiedade matemática dos pais pode contagiar os filhos –e talvez não seja coincidência que Renata, quando criança, também sofresse nessa matéria.

Segundo Marjorie Schaeffer, professora de psicologia na Faculdade Saint Mary (EUA), os estudos mostram uma relação clara. "Sempre observamos nas pesquisas que ter pai ou mãe com ansiedade matemática diminui o desempenho das crianças em matemática no início do ensino fundamental".

A maioria dos pais não sabe o que fazer para ajudar e nem se dá conta de que o prejuízo dos filhos pode ser duradouro. Especialistas se preocupam com essas primeiras etapas da vida escolar porque, sobretudo na matemática, existe um efeito cascata.

"O desempenho das crianças em matemática no início do ensino fundamental prevê seu desempenho no ensino médio e na faculdade", afirma Schaeffer. "E o desempenho na faculdade está relacionado às opções de carreira que se tem", completa.

Além disso, forma-se um ciclo vicioso, como no caso de Henrique: a frustração com um exercício vira tensão e desânimo no seguinte, que, por sua vez, aumentam a chance de nova frustração na próxima tarefa.

Como resultado, a criança demora a aprender o conteúdo e pode carregar as sensações negativas para a vida adulta. De acordo com Schaeffer, cerca de 25% da população pode ter ansiedade severa em relação à matemática.

"Não estamos falando apenas de matemática avançada. As pessoas se sentem muito nervosas em situações simples do dia a dia, como calcular a gorjeta no restaurante", diz a pesquisadora, autora de vários estudos sobre o tema.

Isso significa que muitos dos professores do Ensino Fundamental também sofrem com ansiedade matemática e acabam transferindo essa insegurança para os alunos.

Não há muito o que os pais possam fazer em relação ao preparo dos professores, mas, felizmente, existem várias dicas para melhorar o ambiente dentro de casa e aumentar a chance de as crianças se darem bem com a disciplina.

Schaeffer diz que, para isso, a chave é tornar a matemática natural. Isso significa tirar a carga de estresse dos números e tratá-los com a mesma normalidade com que se conta uma história à beira da cama.

"Como sociedade, convencemos as famílias de que a leitura é essencial. Pelo menos nos Estados Unidos, a maioria lê um livro para os filhos antes de dormir. Mas não oferecemos o mesmo tipo de estímulo em relação à matemática", diz.

Estímulo foi o que não faltou para Melissa Poli Vilhena, 13, que acha a "matemática uma coisa muito legal". Seu irmão dois anos mais velho sempre foi muito bom nessa disciplina; o mesmo se diga de sua mãe; e, para completar, também de sua avó Nilce.

Nilce Rabelo de Carvalho, 74, foi até o terceiro ano na faculdade de matemática, mas interrompeu o curso para se casar. Seus filhos pegaram gosto e ganharam medalhas em olimpíadas da matéria –uma das medalhistas foi Adriana, 45, mãe de Melissa.

Assim como Nilce, Adriana também legou o amor pela matemática. "Nas férias, a diversão era passar tabuada para eles", diz. "A Melissa via muito o irmão fazendo contas de cabeça e eu sempre estimulando. Não foi preciso forçá-la a querer aprender. Ela se empolgou por conta própria."

Na família, o gosto pela matemática chegou como herança, por assim dizer. Quando isso não acontece, pais e mães precisam tentar passar os incentivos certos aos filhos.

Por exemplo, chamando a atenção para elementos geométricos ou algébricos do cotidiano; conduzindo brincadeiras com blocos de montar; tratando a matemática com leveza; retirando o estresse da lição de casa.

Nada disso, porém, substitui o professor, afirma Katia Smole, diretora do instituto Reúna. "Os pais podem criar um ambiente que estimule a aprendizagem, mas temos que tomar cuidado para não atribuir à família a tarefa de ensinar a matemática".

Ela diz que os pais devem dar apoio ao conversar sobre a matemática, incentivar que as crianças e adolescentes procurem os professores para falar de zonas de conforto ou dificuldades, além de criar oportunidades para jogos como dominó e banco imobiliário.

Outras opções são ler livros que abordem a disciplina de forma divertida e usar aplicativos especializados.


COMO MELHORAR A RELAÇÃO DOS FILHOS COM A MATEMÁTICA

- Tirar o estresse da lição de casa

- Fazer da matemática uma coisa divertida

- Falar da matemática ao redor: por exemplo, dá para tratar de proporções ao cozinhar, ou de adições e subtrações ao fazer compras

- Dar independência para a criança explorar a disciplina por conta própria

- Ler livros que tratem de matemática, ou aproveitar outras obras para introduzir a matéria (por exemplo, estimulando que sejam contados objetos ou identificados formatos em uma ilustração)

- Brincar com blocos de montar

- Começar cedo: assim que a criança souber falar, o assunto pode ser abordado com leveza

- Enfatizar que a aprendizagem é um processo e que não existe "pessoa da matemática" ou "pessoa que não é da matemática"

Fonte: Marjorie Schaeffer


O QUE NÃO FAZER

- Fazer a lição de casa no lugar da criança passa a mensagem de que ela é incapaz

- Aumentar a pressão com frases tipo "se você não aprender isso, não vai entrar na faculdade"; isso apenas eleva o estresse e prejudica o desempenho

- A ansiedade matemática do pai ou da mãe não pode ser transmitida aos filhos; frase como "matemática não é para a gente" só atrapalham

- O feedback na chave negativa desestimula. Em vez de falar "você errou na lição", procure uma maneira de indicar o caminho, mas sem cortar a autonomia

Fonte: Marjorie Schaeffer


LIVROS QUE AJUDAM A FALAR DE MATEMÁTICA

- "Matemática até na Sopa", de Juan Sabia (Companhia das Letrinhas)

- "O Mistério dos Números Perdidos", de Michael Thomson (Melhoramentos)

- "Bichológico", de Paula Taitelbaum (Piu)

- "91 Truques Matemáticos Legais", de Anna Claybourne (Pé da Letra)

- "A Vizinha Antipática que Sabia Matemática", de Eliana Martins (Melhoramentos)

- "Os Problemas da Família Gorgonzola", de Eva Furnari (Moderna)

- "Sorumbática", de Eva Furnari (Moderna)

Fonte: Katia Smole


APLICATIVOS DE MATEMÁTICA E OUTROS RECURSOS

- Desafios matemáticos da Folhinha em parceria com o Impa

- Rei da matemática (R$ 15,99)

- Toon math

- Tindin

Fonte: Matific e reportagem

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