O
baú de histórias da dona Neusa
A bióloga
aposentada Neusa Guerreiro de Carvalho, 72 anos, está
preparando um presente diferente para os quatro netos: um
baú de histórias, com registros e relíquias
da família.
Depois
de vários anos de pesquisa sobre sua árvore
genealógica, juntou 30 pastas de documentos, cartas,
mapas, fotos, misturadas a lembranças de viagens, vestuário
de noites nupciais e até trabalhos de tricô.
"Os idosos não têm a quem contar os casos.
Depois vão embora e perdem-se fatos maravilhosos",
diz.
Descobriu
ligações com Portugal, Líbano, Itália
e Espanha, que se encontraram em São Paulo. Tanto se
entusiasmou com as revelações que desenvolveu
um projeto, chamado Memórias e Histórias, para
ajudar as famílias a conhecer seu passado e a criar
baús a serem preservados de geração em
geração. "O problema é que quem
tem dinheiro não dá valor para essas coisas
e quem dá valor não tem dinheiro para pagar
por esse trabalho."
Interessado
nesses casos perdidos, o Departamento Municipal do Patrimônio
Histórico está lançando um programa destinado
à terceira idade, batizado de Descobrindo Outras Histórias
de São Paulo. "A cidade possui uma vida que não
é reconhecida", diz Leila Regina Diegoli, idealizadora
do projeto destinado a organizar "baús" e
a ajudar os idosos a pesquisar e a registrar sua biografia
conectada à cidade.
O problema
da falta de identidade é generalizado entre os paulistanos,
para quem a cidade se transformou num espaço desfigurado
e ameaçador. Por isso surgiu o plano de também
atrair as crianças e os jovens, integrando escolas,
professores e, em especial, alunos, num concurso sobre a memória
dos bairros. "Os estudantes serão estimulados
a resgatar documentos, biografias, reportagens e mapas para
falar sobre os bairros", diz Leila.
Constitui
tarefa difícil atrair diferentes gerações
na reconstrução da memória urbana. Os
velhos têm saudade de uma cidade que não existe
mais. E as crianças não gostam do que vêem
nas ruas, não gostam do que existe. Essa é a
ponte que dona Neusa tenta construir. Há, porém,
um problema no presente aos netos: ela não pára
de descobrir fatos novos e ainda não sabe quando poderá
entregar o baú. Preferiu, por enquanto, recorrer às
novas tecnologias: com a ajuda do Museu da Pessoa, já
garantiu sua história para sempre e para qualquer um,
fazendo uma espécie de baú virtual, colocado
na internet.
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