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Caso
se confirmem as pesquisas eleitorais, teremos nessa semana a vitória
de W. Bush à presidência americana. Nunca, que eu saiba
ou me recorde, terá havido vencedor mais cavalarmente despreparado,
ignorante e aloof do que seu oponente. Al Gore, apesar
de toda sua dureza e falta de carisma, é um político
experiente, preparado, com os pés no chão e uma história
de sucessos que o fazem o melhor vice-presidente da história
americana. Terá perdido para alguém que diz grecianos
ao invés de gregos, que não sabe nem o
nome de importantes líderes internacionais, que só
costuma ler livros sobre beisebol, que faliu quase tudo que tocou
e que, ao ser confrontado com uma avalanche de números e
estatísticas em um debate, só conseguiu responder
que o seu adversário estaria usando uma matemática
obscura (fuzzy math).
O etsablishment liberal americano está indo à loucura.
Os jornais importantes do país - NY Times e Washington Post
- já vieram a público declarar apoio a Gore; em todas
as revistas intelectualizadas faz-se um malabarismo para entender
como é que Gore, com todo o sucesso de uma gestão
que presidiu o maior crescimento econômico da história
americana, consegue estar perdendo pra esse caipira. Joe Klein,
na última New Yorker, diz que Gore apequenou-se ao entrar
dentro do esquema de focus groups e pesquisas de opinião,
e assim perdeu sua estatura superior. Hendrik Hertzberg, na mesma
revista, defende que o problema estaria com os eleitores, votando
de acordo com a personalidade dos candidatos, como se fosse eleição
para grêmio estudantil e não presidência da República.
Os grupos mais conservadores defendem que a culpa é da devassidão
da gestão Clinton. E os fanáticos certamente dirão
que a culpa é do candidato a vice, Lieberman, judeu.
Frente a essa desconexão entre a intelectualidade e o populacho,
é interessante entender o que está se passando. E
eu defenderia, como já o fizeram outros, que o público
americano, ao contrário de burro ou ingênuo, está
sim optando conscientemente pelo mais inepto. Há um consenso
nos EUA de que o boom econômico não tem muito a ver
com Clinton, mas sim com uma economia que já se clona e cresce
por seus próprios méritos. De mãos, os americanos
só acreditam na invisível do mercado, e já
se cansaram da boba onipresente de Clinton. Querem, assim, um presidente
que não bagunce o coreto. Que não venha com nenhum
grande plano de assistência social ou que mexa com o superávit
do orçamento. E que também não incomode com
escândalos pessoais ou grandes iniciativas internacionais.
Suspensos pelas ondas de um mercado acionário transbordante,
os americanos já abandonaram o estágio onde há
um sentimento de coletividade, de res publica. Quem tinha que se
dar bem teve todas as oportunidades pra tanto, e quem está
na pior é por culpa sua e dane-se - essa parece ser a cosmovisão
reinante na terra do tio Sam. Como em uma tragédia, os sucessos
da dupla Clinton-Gore terão causado seu ocaso, e Brutus reinará
pelos próximos anos. A não ser que estejamos errados
eu e as pesquisas, e que vença alguém com alguns neurônios
de sobra.
* * *
Uma
eventual derrota de Gore terá mais um toque de tragédia
grega. É inegável que Gore perderá por seus
próprios méritos e deméritos, muito mais do
que Bush terá ganho pelos seus. Mas, se olharmos para os
números, veremos, provavelmente, que Gore terá perdido
por causa dos 4% ou 5% que devem ir para Ralph Nader, um independente
com grande tradição nos movimentos ecológicos
e de direitos civis. Repetir-se-á, com sinal trocado, o resultado
das eleições de 1992, quando um caipira de Arkansas
venceu um presidente da República que acabava de vencer uma
guerra triunfalmente, porque os votos deste foram repartidos com
outro caipira, maluco, chamado Ross Perot. O presidente em questão,
como todos sabem, era George Bush, pére.
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