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O
presidente peruano Alberto Fujimori está fazendo seu colega
brasileiro, Fernando Henrique Cardoso, passar por um belo vexame.
Em maio, todo mundo, menos Fujimori, dizia que a eleição
presidencial do Peru não respeitava os cânones que
dizem quando um pleito pode ser considerado livre e justo.
Só FHC fechava com Fujimori e santificava o questionado processo
eleitoral peruano.
Enquanto isso, os Estados Unidos insistiam em que a Organização
dos Estados Americanos deveria punir o Peru de Fujimori exatamente
pelo desrespeito a regras básicas em processos eleitorais
legítimos. Foi a posição brasileira que impediu
que a posição de Washington vingasse.
Lembro-me de que, na época, Fernando Henrique estava em viagem
pela Alemanha. A cada entrevista que dava, alguém lhe perguntava
sobre o caso peruano. E ele sempre respondia defendendo Fujimori.
Agora, vem o próprio Fujimori e anuncia sua renúncia
e diz que não quer ser "obstáculo à democracia",
em confissão implícita de que vinha agindo como tal
até então.
Pode até ser que se trate de mera jogada, a ser desfeita
amanhã ou depois, ao sabor das circunstâncias, como
suspeita Eliane Cantanhêde, a notável jornalista da
"Folha de S.Paulo".
Não importa, para o julgamento da posição adotada
pelo governo
brasileiro.
O argumento principal utilizado para defender Fujimori e seu suspeito
processo eleitoral é o de que é sagrado o princípio
da não-intervenção em assuntos internos de
outro país.
Tem
certo peso, mas precisa ser ponderado pelos fatos.
Primeiro: o Brasil ajudou mais de uma vez a evitar um golpe de Estado
no Paraguai, interferindo, portanto, em assuntos internos. Por que
podia no Paraguai e não pode no Peru?
Segundo: quando o então presidente norte-americano Jimmy
Carter fez uma cruzada pelos direitos humanos, no final dos anos
70, conseguiu salvar algumas vidas numa América Latina coalhada
de ditaduras. Ninguém com convicções democráticas
protestou, exceto os ditadores, invocando justamente o princípio
da não-intervenção.
Terceiro: quem intervém regularmente na América Latina
são os Estados Unidos, que não precisam de licença
para tanto, tal é a sua descomunal superioridade econômica
e militar.
Foi assim que ajudaram a instalar as ditaduras que ensanguentaram
a região dos anos 60 até o início dos 80.
Se, agora, mudam de direção e passam a reforçar
a democracia, tanto melhor.
Há intervenções e intervenções.
Desconhecer as diferenças é arriscar-se ao vexame,
do que dá prova o caso Fujimori.
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