NOSSOS
COLUNISTAS

Amir Labaki
André Singer
Carlos Heitor Cony
Clóvis Rossi
Eleonora de Lucena
Elvira Lobato
Gilberto Dimenstein
Gustavo Ioschpe
Helio Schwartsman
Josias de Souza
Kennedy Alencar
Lúcio Ribeiro
Luiz Caversan
Magaly Prado
Marcelo Coelho
Marcelo Leite
Marcia Fukelmann
Marcio Aith
Nelson de Sá
Vaguinaldo Marinheiro

André Singer
asinger@uol.com.br
  12 de janeiro de 2001
  Mistura Fina
   
   

O fator Itamar

Já não parece dúvida de que o debate sucessório foi deflagrado. Do lado do PSDB, Mário Covas e Luiz Carlos Bresser Pereira deram o sinal de alerta. No PFL, os movimentos de ACM a favor de Tasso Jereissati são antigos e conhecidos. Agora Jaime Lerner, o governador do Paraná, confirma que não dá para segurar a manada, ainda que para FHC seja péssimo negócio, claro. Definido o candidato, acabou o governo de Fernando Henrique. Não poderia haver cenário pior para o presidente.

Aliás, poderia. O de não fazer o sucessor, porque nesse caso, além de ter o mandato na prática abreviado, ainda estará às voltas com uma maré montante oposicionista. Por isso, Fernando Henrique fará o impossível para conciliar dois elementos. 1) Adiar ao máximo a definição do candidato governista. Para tanto, lhe convém, por exemplo, deixar aberta a porta a José Serra. O afunilamento precoce em torno de Tasso Jereissati, que já conseguiu o apoio de ACM e Covas, é ruim. 2) Manter uma aliança ampla. FHC parece convencido de que as chances de vitória residem em garantir a união entre PSDB, PFL, PMDB, PPB e PTB, sobretudo os três primeiros. Na oposição, há uma profusão de candidaturas que procuram ocupar o mesmo espaço no espectro ideológico, o da centro-esquerda. Além dos que já foram candidatos em 1998, Lula e Ciro Gomes, dois governadores, Itamar Franco e Anthony Garotinho, podem entrar na mesma raia. Ambos estão em situação semelhante, ainda que só na aparência. Dirigem importantes Estados do sudeste, Minas Gerais e Rio de Janeiro, não têm partido e alimentam o sonho da postulação presidencial.

No entanto, se olharmos os indicadores revelados pela última pesquisa DataFolha, veremos que a raiz social de um e de outro é bem diferente. O mineiro está com 11%, em terceiro lugar, na simulação mais provável, em que Lula e Ciro são candidatos. Sem Lula na parada vai para 15% e fica em segundo lugar, logo depois de Ciro.

Já Garotinho permanece em quinto lugar nas duas situações (com e sem Lula). A sua taxa de intenção de voto também não se altera: 7%. É uma diferença importante, uma vez que o ex-presidente cresce sobretudo no Nordeste e no Norte/Centro-Oeste com a eventual ausência de Lula. Isso confirma que o seu nome, até pelo fato de ter ocupado a presidência, tem uma projeção nacional que falta a Garotinho.

Outro dado que favorece Itamar é a distribuição sócio-econômica dos que declaram preferi-lo. Dos quatro candidatos que transitam pela centro-esquerda é o que está mais concentrado entre os eleitores de menor renda e escolaridade. Enquanto Lula ainda tende a ser melhor votado por quem tem mais escolaridade, embora menos renda, e Ciro apresenta um perfil mais próximo do PSDB (tende a crescer com a renda e a escolaridade), o governador de Minas cresce quanto menor a renda e a escolaridade. Garotinho, por sua vez, permanece estável nas diversas faixas de renda e vai melhor entre os que têm escolaridade média.

O perfil de Itamar e do eleitorado que o apoia são congruentes. Quando na presidência, praticou uma política de tipo popular, sempre preocupado em sinalizar que estava ao lado dos "pequenos" contra os "grandes". Nesse sentido, Itamar deve preocupar mais o PT do que Ciro. Note-se que, na simulação mais realista, entre os eleitores que atingiram apenas o 1o grau, a faixa que reúne o maior número de votos, Itamar empata com Ciro em 13%. Já entre os que chegaram à universidade, Ciro tem nada menos que 32% das preferências, ao passo que Itamar fica com apenas 5%.

Ou seja, Ciro é um fenômeno de classe média, que pode ser ameaçado por uma campanha inteligente do PSDB, enquanto Itamar trafega em uma faixa que sempre foi pouco permeável aos tucanos. O colunista Fernando Rodrigues lembra que o Partido Liberal (PL) é uma opção aberta a Itamar, que, assim como Garotinho, terá que ingressar em alguma legenda até outubro, ainda que seja para candidatar-se a um segundo mandato em Minas. Do ponto de vista ideológico, não há dúvida que o PL tem mais a ver com Itamar do que o Partido Socialista Brasileiro (PSB), do ex-governador Miguel Arraes. Do ponto de vista eleitoral, no entanto, o PSB é cerca de 50% maior do que o PL e tem uma inserção importante no nordeste, onde Lula é cada vez mais forte. A decisão de Itamar será um elemento importante no jogo de 2002.

Livro da semana

"Teoria geral da política, a filosofia e as lições dos clássicos" (Campus 2000, 717 páginas) de Norberto Bobbio, com organização de Michelangelo Bovero, é uma obra de referência. Resultado de um projeto longamente acalentado, chega por fim à conclusão. Quando esteve no Brasil, no começo dos anos 90, Bovero, o herdeiro intelectual de Bobbio, contou que esperava poder reunir os trabalhos produzidos pelo jurista, filósofo e cientista político em um arcabouço que permitisse vislumbrar uma teoria geral da política. Aí está.

Trecho

"Um dos maiores teóricos da democracia, Hans Kelsen, considera elemento essencial da democracia real (não da democracia ideal, que não existem em lugar algum) o método da seleção dos líderes, ou seja, a eleição. Exemplar, a esse respeito, tão exemplar a ponto de parecer inventada, é a afirmação de um juiz da Corte Suprema dos Estados Unidos por ocasião de uma eleição de 1902: 'A cabine eleitoral é o templo das instituições americanas, onde cada um de nós é um sacerdote, ao qual é confiada a guarda da arca da aliança e cada um oficia do seu próprio altar'. Se depois aqueles que nelas entram nem sempre são a maioria, é coisa que acontece em todas as igrejas".

Verso pop da semana

"We always came back to the song
we were singing
at any particular time"
Paul McCartney, em "The song we were singing", no CD "Flaming Pie".

Verso pop para o fim-de-semana

"Você pode estar tristíssimo no seu quarto
Que eu sempre terei meu jeito de consolar
É só ter alma de ouvir
E coração de escutar"
Caetano Veloso, em Sou seu Sabiá, no CD "Noites do Norte"


Leia colunas anteriores
10/01/2001 - Caetano Veloso, outra vez
05/01/2001 - Os juros do Fed, a sorte de FHC e o terceiro tempo
03/01/2001 - A hora do discurso e o momento da ação
29/12/2000 - Acelera,FHC
27/12/2000 - Eleitores de baixa renda decidirão entre Lula e Suplicy

 


| Subir |

Biografia
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A - Todos os direitos reservados.