Descrição de chapéu Facebook Meta

Há 20 anos nascia o Orkut, com comunidades de nomes bizarros que antecipavam a cultura do meme

Páginas como 'Eu tenho medo do Plantão da Globo' e 'Queria sorvete, mas era feijão' divertiam 30 milhões de usuários

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São Paulo

Há exatos 20 anos, o Orkut andava para que as redes sociais de hoje pudessem correr. Nas páginas azuis que deixam muito adulto com a voz embargada, dava para deixar depoimentos quilométricos e sobre os amigos (tipo o que profissionais fazem hoje no LinkedIn), tinha sempre um perfil fake com nome esquisito solicitando amizade (tipo o que rola no Instagram), e, claro, havia as comunidades, antecipando a cultura dos memes e da zoeira eterna.

Print de tela do computador mostra a página de login da antiga rede social Orkut. A interface é azul clara, com "orkut" escrito em roxo no centro, e os campos de usuário e senha na parte direita
Página de login do Orkut, criado há 20 anos - Orkut/Divulgação

Tudo começou quando o engenheiro de software turco Orkut Büyükkökten —sim, Orkut é um nome próprio— criou a rede social como um projeto durante seus estudos na Universidade de Stanford, nos Estados Unidos.

Em 24 de janeiro de 2004, à beira de completar 29 anos, Orkut, o homem, lançou o site para o mundo. No ano seguinte, o Orkut, a rede, ganhou sua versão em português, em 2008 ele foi comprado pelo Google, e todo o resto é história.

"A gente tinha uma espécie de 'blogosfera' e alguém comentou sobre o Orkut. Fui ver do que se tratava e não me pareceu legal. De repente, estava todo mundo falando e eu entrei", conta Randall Neto, consultor jurídico e redator, hoje com 50 anos.

Randall regula de idade com o criador do Orkut, e viu na rede uma chance de reencontrar pessoas da escola e da faculdade –é importante lembrar que naquele momento da humanidade nem o Facebook existia, e achar amigos perdidos no mundo era tarefa complexa.

"Ao longo do tempo, fui descobrindo coisas de que mais gostava. Veio o lance dos depoimentos, e eu gostava de fazer depoimentos personalizados. E, claro, vieram as comunidades!", lembra Randall.

As comunidades eram páginas para reunir pessoas com interesses comuns. Tipo quem curtia mangá, cinema, golden retrievers, macarrão à bolonhesa… Porém, na prática, elas viraram o lugar perfeito para os usuários colocarem em prática a criatividade, e ver quem era o mais fanfarrão do planeta.

"Eu tenho medo do Plantão da Globo", "Tô com fome e já escovei os dentes" e "Anão vestido de palhaço mata 8" eram algumas das comunidades mais populares entre os brasileiros, que somavam 30 milhões de usuários dentro do Orkut. A rede, aliás, foi a maior do mundo até 2011, quando o Facebook assumiu a liderança.

"Além das comunidades clássicas, tipo 'Tinha medo da Gina do Palito' e 'Queria sorvete, mas era feijão', tinha algumas esclarecedoras como 'Bom dia não é eu te amo', e uma que me representava demais, a 'Abro a geladeira para pensar'. Mas, de todas, a minha favorita era 'Jogar WAR é bom, mas dá merda'", diz Randall.

Ele também foi criador de algumas comunidades, especialmente com os colegas da empresa em que trabalhava. "Eram umas meio 'do mal'", brinca. Randall diz que costumava se juntar às comunidades cujos títulos lhe chamavam a atenção, ou o próprio tema, ou as pessoas que já faziam parte dela.

Fazer parte, neste caso, não exigia nada além de apertar o botão e estar ali, entre os membros, sem fazer nada e apenas existindo. Nenhuma interação era necessária, ninguém precisava postar nada.

Em algumas comunidades, os painéis de discussão até tinham algum movimento, mas no geral elas eram mais como um álbum de figurinhas que demonstrava aos outros o senso de humor daquele usuário.

"Acho que a gente achava engraçado porque elas davam algum tipo de solenidade a uma ideia tosca e engraçada, que, por alguma razão, encontrava conexão com outras pessoas", especula Randall.

"O maior exemplo pra mim foi quando morreu um imortal da ABL e um amigo foi lá e criou uma comunidade 'Randall Neto na ABL'. Meus amigos todos entraram, mas de repente gente que estudou comigo começou a me dar os parabéns e do nada vieram uns haters, dizendo que era um absurdo", brinca.

O Orkut foi desativado em 30 de setembro de 2014. Antes disso, a rede já tinha sido alvo de polêmicas, quando por exemplo o Ministério Público Federal de São Paulo intimou os diretores do Google no Brasil a explicar crimes ocorridos dentro do Orkut.

Segundo denúncia apresentada pela ONG Safernet, o site teria distribuído pornografia infantil, cometido crimes contra os direitos humanos e facilitado o tráfico de drogas.

As coisas foram descendo ladeira abaixo e o Google nunca mais conseguiu se firmar no mercado das redes sociais, hoje dominado pela dona do Facebook, Meta, cujos principais concorrentes são X (ex-Twitter) e TikTok.

Quando avisou que o Orkut estava à beira da morte, o Google afirmou que manteria as comunidades no ar, mas sem a possibilidade de criação de novo conteúdo, como uma espécie de acervo. A felicidade dos fãs durou pouco, e elas foram excluídas totalmente três anos depois.

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