São Paulo, Sexta-feira, 16 de Julho de 1999




Vale a pena voltar?


Há exatos 30 anos, a Apollo 11 partia com astronautas rumo à Lua. Agora, sem a Guerra Fria, o homem procura motivação para decolar outra vez

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
da Sucursal de Brasília

Trinta anos atrás, às 10h32 (horário de Brasília), quando o foguete Saturn 5, com a nave Apollo 11 no topo de seus 87 metros, deixou a base de Cabo Canaveral, a maior batalha de propaganda da Guerra Fria estava quase ganha pelos EUA, a não ser que uma improvável tragédia acontecesse.
Se o lançamento tivesse sido adiado, a União Soviética ainda poderia ter esperanças de clamar vitória. Três dias antes, sua Lunik 15 partira, com a missão de trazer amostras lunares de volta à Terra.
Mais alguns dias, no entanto, e todas as dúvidas sobre quem vencera a corrida espacial estariam dissipadas de maneira emblemática. Em 21 de julho, enquanto Neil Armstrong e Edwin Aldrin descansavam a bordo do módulo lunar, estacionado no mare Tranquillitatis (mar da Tranquilidade), o Lunik 9 se espatifava no meio do mare Crisium (Mar das Crises).
Os prognósticos sobre o resultado da corrida haviam sido sempre favoráveis aos soviéticos desde que, em 4 de outubro de 1957, seu Sputnik 1 se tornara o primeiro satélite artificial da Terra.
A engenhoca era coisa pequena: uma esfera metálica de 5,2 kg com um transmissor de rádio e um termômetro alimentados por pilhas químicas. Mas o seu “bip, bip, bip” do espaço incomodou os norte-americanos quase tanto quanto um ataque militar.
O senso de humilhação nacional seria reforçado com diversos outros golpes: Lunik 1, primeira espaçonave a passar perto da Lua; Yuri Gagarin, o primeiro ser humano em órbita terrestre; Valentina Chereshkova, a primeira mulher; Vostoks 3 e 4, o primeiro vôo espacial em conjunto; Antonin Leonov, o primeiro passeio de cosmonauta fora da cápsula.
Enquanto isso, os norte-americanos testemunhavam sucessivos fiascos de foguetes que não decolavam ou explodiam no ar, ou comemoravam os feitos de seus heróis apesar do amargor do atraso.
Sabe-se, agora, que o currículo dos soviéticos não era tão perfeito quanto parecia. Seus fracassos eram escondidos e os êxitos muito turbinados pela propaganda.
Desde o início, a capacidade industrial, financeira e tecnológica dos EUA era superior.
Faltava vontade política. John Kennedy a forneceu. “Nós escolhemos ir à Lua nesta década... não por ser fácil, mas porque é difícil”, repetia ele em discursos.
Foi a determinação de Kennedy e seu sucessor, Lyndon Johnson, que assegurou para o programa espacial 5% do Orçamento do governo federal na década de 60 e viabilizou o resultado favorável.
Cada minuto que Armstrong e Aldrin caminharam na Lua custou US$ 853 milhões. O programa Apollo gastou US$ 128 bilhões no total, equivalentes a 18,6% do PIB brasileiro deste ano, 25% mais que o Orçamento federal do Brasil para 1999.
Os norte-americanos parecem ter achado que valeu a pena. Embora o entusiasmo tenha passado, pesquisa de opinião pública realizada há dois meses mostra que ainda existe sólido suporte de dois terços dos eleitores a investimentos na exploração espacial.
Mas com destino a onde? Marte tem excitado a imaginação coletiva do país desde que o Pathfinder mandou suas imagens daquele planeta em 4 de julho de 1997.
No entanto, o custo de um programa Apollo para Marte é calculado em até três vezes mais do que o da Lua há 30 anos. Isso, apesar dos enormes avanços tecnológicos destas décadas.
Por exemplo, o computador de bordo da Apollo 11 tinha uma memória ROM equivalente à um vigésimo de um disquete atual. E a memória RAM de um computador pessoal médio de hoje é 8.000 maior do que a do equipamento da Apollo.
Os norte-americanos não têm mais líderes que os conclamem a fazer o que é difícil. Por isso, talvez optem, desta vez também no espaço, pelo que é mais fácil.
O mais fácil é a Lua. Ainda mais se, no próximo dia 31, quando se chocar intencionalmente contra uma cratera do satélite, a nave Lunar Explorer obtiver a prova definitiva de que existe água na Lua.
Se houver, então também há hidrogênio e, portanto, combustível para foguetes. A Lua poderá se tornar uma estação espacial com recursos próprios para o homem se lançar ao infinito. Há muitos planos nesse sentido e até investidores privados interessados neles.
Se estiverem certos, a Lua poderá voltar a ser notícia em breve.

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