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Programa russo deve virar sucata
País que já liderou corrida espacial hoje não
dispõe de verbas para manter a Mir em operação
JOSÉ ARBEX
especial para a Folha
Você pagaria US$ 1 milhão pelo protótipo do foguete
que levou Yuri Gagarin ao espaço, lançado em 23 de março
de 1961? Ou US$ 15 mil pelos registros do famoso vôo de Gagarin,
assinados por ele? Ou US$ 60 mil pelo uniforme usado durante o primeiro
passeio do homem pelo espaço, fora da nave?
Parece, mas não é ficção. Esses e muitos outros
apetrechos foram leiloados pela Sothebys, em Nova York, em 16 de
março de 1996. O objetivo era angariar fundos para financiar projetos
de pesquisa ameaçados pela falta de verbas.
Nada poderia simbolizar melhor o melancólico fim de um dos mais
brilhantes capítulos da história da ciência. Provavelmente,
o ponto final desse capítulo ocorrerá no início do
ano 2000, quando a estação espacial Mir, de 130 toneladas,
será carbonizada ao reentrar na atmosfera terrestre, após
ficar 13 anos em órbita: Moscou afirma não dispor dos US$
250 milhões anuais para mantê-la.
Instituto Smith
sonian/Reprodução
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Integrantes do
projeto Vostok (Popovich, Gagarin, Valentina, Bykovsky, Nikolayev
e Titov) são apresentados ao público, em foto de 1960 |
A falência
do programa espacial russo não resulta de falta de capacidade tecnológica
(os cientistas russos estão entre os mais avançados do mundo),
da crise econômica que avassala a Rússia pós-soviética.
Uma tentativa de salvar o programa foi transformá-lo em uma agência
semelhante à Nasa. Ao mesmo tempo, o governo privatizou seu complexo
espacial em 29 de abril de 1994, com a criação da Corporação
Energia de Foguetes
Espaciais, que se tornou a principal fornecedora da nova agência
espacial russa.
Em junho de 1994, a Energia fechou contrato de US$ 2 bilhões para
construir plataformas marítimas de lançamento de foguetes,
em joint venture com os grupos Yujnoye (Ucrânia), Boeing (EUA) e
Kvaerner (Noruega). Em fevereiro de 96, montou outra joint com o grupo
russo Gasprom, para operar satélites. Em abril de 97, o grupo emprestou
US$ 100 milhões do Banco Mundial.
Mas tudo isso é muito pouco. A Rússia nem sequer está
conseguindo manter os compromissos que assumiu em 1998 para a construção
de uma Estação Espacial Internacional (ISS), com a acoplagem
dos módulos Zaria (Alvorada) e Unity (Unidade). Também participam
do projeto 11 países da Europa, o Japão, o Canadá
e, eventualmente, o Brasil. O custo da ISS é de US$ 60 bilhões.
A Rússia, que deveria ser o segundo maior investidor, destinou
a ele apenas US$ 50 milhões em 1999.
A falência do programa russo adquire proporções ainda
mais espantosas quando se recorda que ele já foi o mais desenvolvido
do planeta.
Em 4 de outubro
de 1957, quando os russos lançaram seu primeiro satélite,
o Sputnik (Satélite), eles causaram pânico nos Estados Unidos.
Nos 92 dias em que ficou em órbita, o pequeno artefato soviético
_uma esfera de alumínio de 80 cm de diâmetro_ adquiriu uma
proporção mítica. Nos 92 dias que ficou em órbita,
os bips emitidos pelo aparelho soavam como uma ameaça
fatal ao Ocidente.
Curiosamente, os dirigentes soviéticos inicialmente não
deram muita importância ao Sputnik. Nikita Khrushev conta que, ao
ser informado do êxito do lançamento, limitou-se a enviar
seus cumprimentos a Sergei Korolev, engenheiro-chefe do programa
espacial, e foi dormir. O Pravda, órgão oficial
do PC, somente dedicou alguns parágrafos ao feito na parte inferior
da primeira página. Só no dia seguinte, ao verificar o barulho
causado no Ocidente, a cúpula soviética entendeu a importância
do evento. O Pravda então estampou a manchete Nação
soviética cria o primeiro satélite artificial da Terra.
12.abr.61/Associated
Press
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Khrushev convocou Korolev ao Kremlin e ordenou que preparasse algo
ainda maior para festejar o 40º aniversário da Revolução
de 1917. Só que isso aconteceria em 7 de novembro, o que dava a
Korolev um escasso mês para realizar a proeza. O incrível
é que ele conseguiu.
3.nov.57/Associated
Press
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A cachorrinha
Laika
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Em 3 de novembro,
os soviéticos lançaram o Sputnik 2, com a cachorrinha Laika.
O novo e talvez maior susto viria em 12 abril de 1961, quando
a União Soviética lançou o Vostok (Leste), a primeira
nave pilotada por um ser humano, Yuri Gagarin, 26. Ele viajou durante
90 minutos em órbita em torno da Terra, a uma altura média
de 320 km.
O feito foi anunciado em tom triunfal. Sua famosa frase _a Terra
é azul_ soava como um grito de vitória comunista.
12.abr.61/Associated
Press
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No alto, Gagarin
antes de sua viagem ao espaço, no
Vostok 1 |
Em Moscou, a população
delirava.
Os EUA reagiram com força. Em 25 de maio de 1961, o presidente
John Kennedy prometeu que em menos de uma década um astronauta
americano pisaria no solo da Lua. Uma série de circunstâncias
contribuiu para que os Estados Unidos ganhassem a dianteira da corrida
nos anos 60. A principal delas, certamente, foi a morte de Korolev, em
1966.
Em 20 de julho de 1969, quando o astronauta Neil Armstrong, da Apollo
11, pisou na Lua, os soviéticos atribuíram pouca importância
ao evento. Alegaram que seu programa lunar estava mais avançado
que o americano, já que, em 31 de janeiro de 1966, o veículo
Luna 9 já havia pousado na Lua. Para efeito de propaganda, diziam
que, enquanto os capitalistas arriscavam vidas humanas desnecessariamente,
o seu programa lunar era feito com robôs. Mas Korolev queria enviar
missões tripuladas à Lua. Apenas não teve tempo para
isso.
Após o triunfo americano, a corrida espacial perdeu ímpeto.
Custava muito caro e produzia poucos resultados visíveis. Seu fim
definitivo aconteceu com o início da Perestroika, em
1985. O diálogo entre as superpotências abriu a estação
Mir, lançada em 1986, à cooperação internacional.
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