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Folha indica os 20 melhores livros de 2023 de acordo com críticos convidados; veja lista

Seleção inclui romance senegalês, horror argentino e poesia americana, passando pelos destaques da literatura brasileira

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montagem com quatro escritores em preto e branco

A argentina Mariana Enríquez, a americana Anne Sexton, o senegalês Mohamed Mbougar Sarr e a brasileira Luciany Aparecida, que emplacaram livros entre os melhores do ano Sebastián Freire, Arthur Furst e Ana Reis/Divulgação

São Paulo

A Folha convidou quatro profissionais envolvidos com a cobertura literária do jornal para indicar, cada um, cinco dos melhores lançamentos que leram este ano.

A única exigência pedida aos convidados é que selecionassem livros publicados pela primeira vez no Brasil em 2023 —de resto, não havia qualquer restrição na escolha, que poderia abranger ficção e não ficção.

O resultado é uma lista diversa de 20 livros que reúnem poesia, romance, conto, ensaios confessionais e sociológicos, refletindo o trabalho de 14 selos editoriais e o talento de autores e autoras das mais diversas origens, vindos de países como Argentina, França, Senegal, Cuba e, principalmente, Brasil.

A lista completa segue abaixo, em ordem alfabética.

Alex Castro
Escritor, é autor de 'Atenção.' e 'Mentiras Reunidas'

O Contrato Racial
Charles W. Mills, ed.: Zahar, trad.: Téofilo Reis e Breno Santos, R$ 74,90 (R$ 232 págs.); R$ 39,90 (ebook)

Estudo raça e escravidão há mais de 20 anos, e esse livro, publicado originalmente em 1997, é o melhor que já li sobre o tema, uma análise brilhante do nosso racismo estrutural. Tomando como mote o "contrato social" de Rousseau, o filósofo demonstra que nossa sociedade é na verdade regida por um "contrato racial", onde pessoas brancas e negras "pactuam" quem estará por cima ou por baixo.

O Deserto e Sua Semente
Jorge Baron Biza, ed.: Companhia das Letras, trad.: Sergio Molina, R$ 74,90 (232 págs.); R$ 39,90 (ebook)

O pai do autor argentino Jorge Baron Biza desfigurou o rosto da mãe com ácido e, na sequência, se matou. A mãe, depois de anos de tratamento, também se matou. O filho conseguiu costurar essas tragédias em uma das obras de ficção mais poderosas de todos os tempos e, enfim, também se matou. Poucos livros têm a coragem de encarar tão de frente a dor, a morte, o desespero. Fortíssimo.

Latim em Pó
Caetano W. Galindo, ed.: Companhia das Letras, R$ 59,90; (232 págs), R$ 29,90 (ebook)

É um daqueles livros que você sabe que vai virar um clássico nas próximas décadas. Pequeno, curto, despretensioso, maneja uma quantidade gigantesca dos mais recentes estudos sobre a história da língua portuguesa e consegue comunicar os resultados de maneira tanto rigorosa quanto fluida, para qualquer pessoa interessada em nossa língua. Um prazer de leitura.

Orlando Furioso, Volume II
Ludovico Ariosto, ed.: Ateliê Editorial/Editora da Unicamp, trad. Pedro Garcez Ghirardi, R$ 260 (720 págs.)

Na opinião de Erich Auerbach, que não era dado a elogios efusivos, "todo o espírito da sociedade renascentista está contido nesse livro, cuja leitura é um dos prazeres mais perfeitos que a literatura europeia nos oferece". Essa aventura deliciosa é um dos maiores best-sellers da literatura ocidental, imbatível em sua capacidade de seduzir desde o século 16. Agora, pela primeira vez no Brasil, temos a obra completa em edição caprichada, anotada e ilustrada.

Os Perigos de Fumar na Cama
Mariana Enríquez, ed.: Intrínseca, trad.: Elisa Menezes, R$ 49,90 (144 págs.); R$ 34,90 (ebook)

Dentre muitos nomes que têm flertado com o fantástico e com a crítica social na América Latina, a melhor, mais poderosa, mais impactante é a argentina Mariana Enríquez. Depois de publicar seus sucessos mais recentes, a Intrínseca lançou sua primeira coletânea de contos, de 2009, onde ela já se mostra uma autora formada. É tão imperdível quanto o resto de sua obra.

Lígia Gonçalves Diniz
PROFESSORA DE TEORIA DA LITERATURA NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

Compaixão
Anne Sexton, ed.: Relicário, trad.: Bruna Beber, R$ 89,90 (376 págs.)

Nos anos 1960, a americana Anne Sexton já escrevia uma poesia tão bem-humorada quanto perturbadora acerca de temas que ainda tocamos com pudor: sexo, distúrbios psiquiátricos, os paradoxos e violências da maternidade. Esperamos décadas, mas afinal essa maravilha chegou ao Brasil, com tradução radiante de Bruna Beber.

Me Chama de Cassandra
Marcial Gala, ed.: Biblioteca Azul, trad.: Pacelli Dias Alves de Sousa, R$ 49,90 (248 págs.); R$ 34,90 (ebook)

Em uma prosa absolutamente adorável, o autor entretece a brutalidade da vida de uma menina trans na Cuba dos anos 1960 e 1970 com a não menos violenta experiência dos jovens soldados cubanos na guerra de libertação da Angola. No romance, passado, presente e futuro se confundem na delicadeza da narradora fadada à morte.

Pretovírgula
Lucas Litrento, ed.: Círculo de Poemas, R$ 54,90 (80 págs.), R$ 34,90 (ebook)

O jovem alagoano se move do registro mais lírico ao oralizado e cinematográfico com uma agilidade que tira o fôlego de quem lê. É sempre um respiro encontrar uma poesia que não se esquiva da violência que nos cerca sem descambar para a pura desesperança, mantendo-se viva no movimento.

A Segunda Morte
Roberto Taddei, ed.: Companhia das Letras, R$ 64,90 (136 págs.), R$ 14,90 (ebook)

A aposta na imaginação do leitor e a investigação da decadência dos modelos convencionais de masculinidade são os trunfos do breve romance de Roberto Taddei. O autor narra, com elegância, aqueles que parecem os últimos dias de um homem idoso com um passado violento, mas uma capacidade insuspeita para o amor e a bondade.

Vale o que Tá Escrito
Dan, ed.: DBA, R$ 59,90 (224 págs.)

É raro achar um autor que saiba tratar com carinho seus personagens canalhas, mas fechamos o romance de estreia de Dan com vontade de tomar umas cervejas até com policiais corruptos. Nesse faroeste miliciano brasiliense, lemos, além da narrativa cativante, uma discussão necessária sobre o compromisso —ou não— da ficção com o real.

STEPHANIE BORGES
POETA, JORNALISTA E TRADUTORA

Conversas do Arquipélago
Édouard Glissant e Hans Ulrich Obrist, ed.: Cobogó, trad.: Feiga Fiszon, R$ 64 (160 págs.)

A entrevista entre o curador suíço e o poeta martinicano são uma celebração da amizade e uma saborosa apresentação ao pensamento de Édouard Glissant. Os diálogos tratam de utopias, convivência e o papel da arte de desenvolver uma sensibilidade fora da lógica da colonialidade.

Louças de Família
Eliane Marques, ed.: Autêntica Contemporânea, R$ 64,90 (280 págs.), R$ 45,90 (ebook)

Ao organizar os pertences de uma tia morta, a narradora repassa a história de sua família. Entre memórias e narrativas míticas se revela uma saga de mulheres negras que sustentaram gerações com o trabalho doméstico. Um percurso custoso, cheio de amor e de segredos.

Mata Doce
Luciany Aparecida, ed.: Alfaguara, R$ 69,90 (304 págs.), R$ 34,90 (ebook)

A partir da história de Mariinha, Tuninha e Maria Tereza, o romance apresenta o vilarejo de Mata Doce e as relações da comunidade com a terra e o tempo. Quando Maria Tereza se torna matadora de bois, a justiça e a vingança ganham novos significados para todos no vilarejo.

Ninguém Quis Ver
Bruna Mitrano, ed.: Companhia das Letras, R$ 59,90 (96 págs.); R$ 34,90 (ebook)

Com uma outra perspectiva do Rio de Janeiro, a poeta articula questões de classe e gênero com uma linguagem elaborada e capaz de abarcar e vulnerabilidade da vida de uma menina até a angústia de uma adulta que não tem como deixar de ver e ser afetada pela violência em seu entorno.

Voladoras
Mónica Ojeda, ed.: Autêntica Contemporânea, trad.: Silvia Massimini Felix, R$ 54,90 (136 págs.); R$ 38,90 (ebook)

A misoginia pode tornar a vida das mulheres aterrorizante. No entanto, os contos de Mónica Ojeda observam como mães, mulheres e meninas podem ser assustadoras e perigosas. As narrativas releem notícias e mitos andinos revelando como o horror emerge do banal numa sociedade violenta.

Walter Porto
Editor de Livros na Folha e colunista do Painel das Letras

O Céu para os Bastardos
Lilia Guerra. Ed.: Todavia. R$ 54,90 (176 págs.); R$ 36,90 (ebook)

O romance sobre as andanças da trabalhadora doméstica Maria Expedicionária pelo bairro de Fim-do-Mundo pulsa de vitalidade com cada personagem e mergulha em sentimento cada sentença —Lilia Guerra escreve cada parágrafo como se fosse o mais importante de sua vida.

Ioga
Emmanuel Carrère. Ed.: Alfaguara. Trad.: Mariana Delfini. R$ 79,90 (272 págs.), R$ 39,90 (ebook)

Poucos livros conseguem provocar risada ao evocar a descida rumo à tragédia, e aqui temos um mestre nesse equilíbrio. Esta é uma autoficção que dá certo porque deu escandalosamente errado: um exercício de autoconhecimento vertiginoso que se desdobra num banquete da mais brutal sinceridade.

A Mais Recôndita Memória dos Homens
Mohamed Mbougar Sarr. Ed.: Fósforo. Trad.: Diogo Cardoso. R$ 104,90 (400 págs.), R$ 64,90 (ebook)

A quantidade de conquistas do senegalês nesse romance —o deslumbre pelo encanto da literatura, a revolta pelo apagamento da negritude, o tesão por personagens enfeitiçantes, o terror pela enormidade do que sempre será desconhecido— fazem seu prêmio Goncourt soar como brinde de festa infantil.

A Tradição
Jericho Brown. Ed.: Círculo de Poemas. Trad.: Stephanie Borges. R$ 54,90 (88 págs.), R$ 34,90 (ebook)

Grandes poetas conseguem tocar seu público materializando emoções que não se sabem possíveis de maneiras que ninguém nunca ouviu. Ao falar sobre a experiência de ser negro nos Estados Unidos, o vencedor do Pulitzer intercala as dores aterradoras do excepcional com a doçura sublime do cotidiano.

O Perigo de Estar Lúcida
Rosa Montero. Ed.: Todavia. Trad.: Mariana Sanchez. R$ 74,90 (272 págs.), R$ 49,90 (ebook)

Nenhum artista bate muito bem da cabeça, argumenta a espanhola, se incluindo gloriosamente entre eles. E que bom.

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