Não é incomum que, depois de ver uma fake news ser desmentida, o que permaneça reverberando seja a própria informação falsa.
Para Paolo Demuru, convidado deste episódio, esse efeito é esperado e mostra que tentar enfrentar a desinformação e narrativas conspiratórias usando só dados objetivos e argumentos racionais não é suficiente.
Estratégias como a checagem de fatos são importantes, ele diz, mas podem dar ainda mais visibilidade às informações falsas ou deixar transparecer uma atitude arrogante de quem as desmente.
Doutor em semiótica pela Universidade de Bolonha, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie e pesquisador na PUC-SP, Demuru discute no recém-lançado "Políticas do Encanto: Extrema Direita e Fantasias de Conspiração" (Elefante) os mecanismos do conspiracionismo e como as forças progressistas podem lidar com esse fenômeno.
O autor aponta que narrativas conspiratórias, além de oferecer explicações simples para problemas cada vez mais assustadores, como a catástrofe climática, permitem que as pessoas encontrem um propósito e se sintam parte de uma comunidade. Em outras palavras, proporcionam maravilhamento em um mundo competitivo e individualista.
Teorias da conspiração oferecem respostas relativamente simples a questões muito complexas, mas também uma boa dose de maravilha contra o tédio e os desencantos do cotidiano e contra a crueza do mundo em que vivemos, que produz desigualdade, ansiedade, depressão, tédio e nos confina muitas vezes em vidas isoladas
Na entrevista, Demuru debate a atitude preponderante em boa parte da esquerda hoje —que, por não se desvencilhar do que ele chama de supremacismo da razão, acaba se comportando como uma estraga festa.
Para o pesquisador, afirmar "é falso que" ou "ele não" e recorrer à indignação só funciona até certo ponto: se quiser construir maiorias, a esquerda precisa apostar na esperança, disputar o encanto e usar o entusiasmo para engajar as pessoas.
A indignação é talvez a paixão mais praticada pelos movimentos progressistas, mas é algo que nos paralisa, porque a gente se indigna diante de uma realidade, mas faz pouca coisa. A indignação não é uma paixão do fazer, é uma paixão mais relativa a um estado de alma. Uma paixão política que deveria ser mais elaborada por um discurso progressista é o entusiasmo, que te leva a fazer algo, a se entregar de corpo e alma em algum projeto, não apenas a se indignar parado com o celular na mão diante de uma notícia falsa e dizer: 'Que absurdo, como alguém pode acreditar nisso?'
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O podcast entrevista, a cada duas semanas, autores de livros de não ficção e intelectuais para discutir suas obras e seus temas de pesquisa.
Já participaram do Ilustríssima Conversa Camilo Rocha, autor de livro que registra a história da música eletrônica de São Paulo, Natalia Viana, que relembrou sua participação no WikiLeaks, Raquel Barreto, pesquisadora do pensamento de Lélia Gonzalez, Carlos Poggio, professor de relações internacionais que analisa como o Brasil moldou a influência dos EUA na América do Sul, Luís Fernando Tófoli, psiquiatra engajado em pesquisas sobre os efeitos da ayahuasca, Pedro Arantes, que defende que a esquerda se levante do conformismo, Monica Benicio, viúva de Marielle Franco, Carlos Fico, historiador que pesquisa a ditadura e a intervenção de militares na política brasileira, Fernando Pinheiro, sociólogo que discutiu como imagens de escritores se mesclam em seus livros, Guilherme Varella, para quem o Carnaval de rua é um direito, Christian Dunker, que se contrapõe à conceituação da psicanálise como pseudociência, entre outros convidados.
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