Entenda o que muda com as restrições no Santos Dumont

Rio quer reduzir fluxo no aeroporto para estimular movimentação no Galeão

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Rio de Janeiro

O debate sobre o futuro dos aeroportos Santos Dumont e Galeão, no Rio de Janeiro, ganhou mais um capítulo nesta quarta-feira (14).

Após reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD), anunciou que o Santos Dumont terá restrições de voos.

A medida busca direcionar um fluxo maior de aeronaves e passageiros para o Galeão, que amargou processo de esvaziamento.

A seguir, entenda o que está em jogo e o que pode mudar para os passageiros caso as restrições entrem em vigor.

Passageiros circulam pelo aeroporto Santos Dumont, no centro do Rio - Eduardo Anizelli - 1º.fev.2023/Folhapress

Quais são as características de cada aeroporto?

Menos de 20 quilômetros separam o Santos Dumont do Galeão. Voltado para a aviação doméstica, o Santos Dumont fica no centro do Rio.

Está ao lado de negócios instalados na região e mais próximo de pontos turísticos da zona sul, como Pão de Açúcar e praias de Copacabana e Ipanema.

Sua infraestrutura, porém, é menor do que a do Galeão, que recebe voos nacionais e internacionais. O Galeão fica na Ilha do Governador, na zona norte da capital fluminense, e também exerce papel relevante no transporte de cargas do estado.

O Santos Dumont é administrado pela estatal Infraero. O Galeão, por sua vez, está nas mãos da concessionária RIOgaleão, que é controlada pela Changi, de Singapura.

Quais restrições podem ser adotadas no Santos Dumont?

Paes afirmou nesta quarta que Lula concordou em restringir o tráfego aéreo no Santos Dumont. Segundo o prefeito, o aeroporto central passará a ser usado somente para a ponte aérea com Congonhas, em São Paulo, e para as conexões com Brasília.

Assim, os demais voos domésticos devem ser deslocados para o Galeão. Atualmente, o Santos Dumont conecta o Rio a diferentes regiões do país.

Conforme Paes, Lula também concordou com uma medida para impedir que turistas que vão do Rio para o exterior possam já fazer check-in no Santos Dumont quando o voo para a cidade estrangeira partir de outra cidade, como São Paulo.

Atualmente, turistas realizam o check-in do voo internacional no terminal carioca, mas na sequência embarcam para outro destino no Brasil e só então viajam para outros países.

Essa mudança teria o objetivo de estimular a operação internacional do Galeão. Com a medida em vigor, se um turista que vai para o exterior quiser sair do Santos Dumont, precisará fazer uma viagem até Congonhas ou Brasília. Em seguida, terá de realizar novo check-in e despachar as bagagens.

Quando as restrições entram em vigor?

Ainda não há uma confirmação sobre prazos. Pela projeção de Paes, as restrições poderiam ser adotadas a partir de janeiro.

Por que as restrições foram anunciadas?

A redução do fluxo de passageiros no Santos Dumont é uma pauta que uniu lideranças políticas e empresariais do Rio.

A avaliação é de que há uma falta de coordenação com o Galeão. Por essa lógica, existiria uma relação predatória entre os terminais.

Após a crise gerada pela pandemia, a retomada da movimentação ocorreu de maneira mais rápida no Santos Dumont do que no Galeão.

Em 2022, o aeroporto doméstico recebeu mais de 10 milhões de passageiros, entre embarques e desembarques, segundo dados da Infraero. O contingente estava próximo de 9 milhões no pré-pandemia.

O Galeão, por sua vez, somou menos de 6 milhões de passageiros pagos em 2022, conforme a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil). Ao longo da década passada, o terminal chegou a receber mais de 16 milhões de viajantes por ano.

Diante desse contexto, as restrições no Santos Dumont seriam uma tentativa de levar mais voos para o Galeão.

Na visão de lideranças locais, com poucas conexões domésticas, o terminal da Ilha do Governador não consegue atrair voos internacionais.

Qual é a avaliação de usuários?

Parte dos usuários costuma reclamar de uma dificuldade maior de acesso ao Galeão na comparação com o Santos Dumont.

Essas queixas voltaram a aparecer nas redes sociais nesta quarta, após Paes anunciar as restrições para o aeroporto doméstico.

O acesso ao Galeão é feito por vias como a Linha Vermelha. Usuários reclamam de engarrafamentos e apontam uma sensação de insegurança devido a casos de violência urbana na região.

Para as lideranças do Rio, o esvaziamento do aeroporto internacional não teria sido puxado por esses fatores.

"A gente pode ficar muito tempo falando dos problemas da cidade do Rio de Janeiro, e eles existem, ninguém está contestando, mas não é essa a razão do que acontece com o Galeão", afirmou Paes em um evento em abril.

"O que acontece com o Galeão é desrespeito do ente nacional, do governo federal, que regula esse sistema", completou na ocasião.

O que analistas dizem sobre o assunto?

Como mostrou reportagem da Folha em fevereiro, o assunto gera opiniões diversas entre analistas.

Parte concorda com os argumentos da prefeitura e do governo estadual, mas há quem considere que o esvaziamento do Galeão esteja mais associado a problemas estruturais do Rio, como as turbulências econômicas e a violência urbana.

O economista Claudio Frischtak, da Inter.B Consultoria, diz que as restrições no Santos Dumont tendem a ampliar o número de passageiros no aeroporto internacional.

Na visão dele, a previsão de cerca de seis meses para a entrada em vigor do limite de voos parece factível tanto para as companhias aéreas quanto para a administração dos aeroportos.

A retomada do Galeão, porém, também depende de avanços na infraestrutura do entorno e do acesso ao terminal, diz Frischtak.

Nesse sentido, o economista defende melhorias na Linha Vermelha, na Linha Amarela e na avenida Brasil, além da construção de uma ligação de metrô de superfície que conecte o aeroporto a estações de metrô da cidade, por exemplo.

"É preciso pensar em medidas de natureza estrutural. Uma delas é o acesso. É preciso melhorar a qualidade do acesso e o tempo que se gasta para chegar ao Galeão", avalia Frischtak. "O Galeão é um aeroporto de classe mundial, mas você precisa de conexão."

Outros esforços, segundo dele, devem ficar concentrados em atrair mais cargas para o terminal. "Nenhum aeroporto sobrevive só com passageiros", diz.

O que falta ser resolvido no Galeão?

O futuro do terminal internacional ainda depende de novas definições. Em fevereiro de 2022, a RIOgaleão anunciou um pedido de devolução da concessão do aeroporto. A empresa associou a medida a dificuldades econômicas agravadas pela pandemia.

Com isso, o governo Jair Bolsonaro (PL) passou a projetar um leilão em conjunto do Galeão e do Santos Dumont. Por essa lógica, um mesmo grupo investidor poderia ficar com a administração dos dois terminais.

Em novembro do ano passado, a RIOgaleão assinou com ressalvas um termo aditivo para dar andamento à devolução. À época, a Anac indicou que, ao assinar o documento, a concessionária declararia "adesão irrevogável e irretratável à relicitação".

Com a troca de governo, o debate ganhou novos contornos. Segundo o ministro Márcio França (Portos e Aeroportos), a companhia sinalizou interesse em costurar um acordo para a permanência no aeroporto.

A viabilidade jurídica do acerto, contudo, é incerta. O governo federal resolveu consultar o TCU (Tribunal de Contas da União) sobre o assunto. É esperada uma posição do órgão para que a discussão avance.

Quem vai administrar o Santos Dumont?

O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), afirmou na segunda (12) que estuda junto ao governo federal a criação de uma gestão compartilhada para o Santos Dumont.

A ideia é que a capital fluminense também participe dessa gestão. A afirmação de Castro foi dada após reunião com Lula.

Segundo o governador, a gestão compartilhada seria formalizada por meio de uma SPE (Sociedade de Propósito Específico), que poderia também contratar a Changi, empresa que administra o Galeão, para ter o controle do fluxo nos dois aeroportos.

Paes, por sua vez, afirmou na quarta que não abordou com Lula a questão da concessão do terminal internacional.

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