Setor de tecnologia quer teto para aumento de impostos na Reforma Tributária

Associação do setor elogia PEC, mas teme aumento de carga para a categoria de serviços; streaming quer ter os mesmos benefícios de livros

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São Paulo

As maiores empresas de tecnologia e varejo digital em operação no Brasil, representadas pela camara-e.net (Câmara Brasileira de Economia Digital), veem com bons olhos a Reforma Tributária. Querem, no entanto, a definição de um teto para o aumento de impostos sobre o setor de serviços no texto da Reforma Tributária, em tramitação no Congresso.

A entidade diz em nota que o limite de aumento de tributação sobre os serviços não deve criar complexidades sobre a estrutura do novo imposto a ser criado pela Reforma, chamado IVA.

"A substituição dos tributos sobre o consumo pelo IVA, único ou dual, que alcance ao mesmo tempo bens e serviços, físicos e digitais, é um passo de primeira importância para modernizar o sistema tributário brasileiro e aproximá-lo das melhores práticas internacionais", defende a entidade em nota publicada em seu site.

Facebook, Amazon, Apple, Netflix e Google são grandes empresas de tecnologia reconhecida pelo domínio em suas respectivas áreas de atuação. Smartphone mostra ícones de aplicativos de Apple, Google, Facebook, Netflix e Amazon na tela.
Facebook, Amazon, Apple, Netflix e Google são grandes empresas de tecnologia reconhecida pelo domínio em suas respectivas áreas de atuação. Grupo é chamado de Faang - Regis Duvignau/Reuters

Mercado Livre, Quinto Andar, C6 Bank afirmam que a simplificação no sistema tributário é positiva para o país. Além da camara-e.net, a Zetta, associação sem fins lucrativos fundada por Nubank e Mercado Pago que reúne 29 empresas de serviços financeiros, também se colocou a favor de alterações no sistema tributário.

O Mercado Livre diz que é contrário a criação de uma responsabilidade solidária na cadeia produtiva, quando a dívida de um fornecedor com o Estado é cobrada de um revendedor, e vice-versa. "No setor de comércio eletrônico, em que as plataformas já compartilham informações e cooperam com a fiscalização, entendemos que o modelo atual deve ser mantido."

Magalu e Americanas disseram que se posicionariam por meio do IDV. O Instituto para o Desenvolvimento para o Varejo (IDV), que inclui varejistas que atuam em marketplaces, não quis comentar o assunto.

Já a Abott's (associação que reúne empresas e profissionais de serviços de streaming de vídeo), a tributação para transmissão de conteúdo online via aplicativo deveria ter as mesmas regras de tributação do que livros, por considerar que esse serviço fornece educação, entretenimento e cultura.

"Acreditamos que o governo e o Congresso têm interesse em garantir a universalização do acesso à informação a partir de alíquotas condizentes com a realidade brasileira", diz a entidade em nota.

As plataformas, no geral, se enquadram na categoria de serviços, não vendem bens de consumo. De maneira simplificada, o Facebook cobra para distribuir anúncios, a Amazon, na função de marketplace, recebe do vendedor que quer anunciar no site da gigante do varejo, e o Uber fica com uma fatia do valor pago ao motorista para colocá-lo em contato com o cliente.

Por isso, essas empresas são taxadas via ISS (Imposto sobre Serviços, de escopo municipal). Conforme lei federal, a alíquota desse imposto pode variar de 2% a 5% (os municípios definem quanto cobrar, dentro dessa faixa). Pagam também PIS e Cofins, cujo cálculo é feito diretamente sobre a receita, embora sejam isentas de ICMS (imposto estadual sobre bens), de acordo com a Lei Kandir.

O texto aprovado na última quinta (6) pela Câmara dos Deputados prevê a fusão de PIS, Cofins e IPI (tributos federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal) em um IVA (Imposto sobre Valor Agregado). O IVA será dual, ou seja, dividido em dois impostos, um de caráter federal e outro para estados e municípios.

O ICMS, por determinação constitucional, tem alíquota mínima de 4%, mas a cobrança pode chegar a 18%. Na disputa para atrair empresas para seu território, governadores concedem benefícios que podem zerar a coleta do tributo —é a chamada guerra fiscal.

Como a Reforma visa unificar a coleta gerada pelos cinco impostos mencionados em um IVA dual (CBS cobrado pelo governo federal e IBS, pelas esferas estaduais e municipais), a porcentagem cobrada sobre serviços e produtos que gozavam de isenção tende a subir, avaliam as empresas.

O Ministério da Fazenda projeta que o setor de serviços, no geral, pagará mais impostos de forma direta. Esse valor seria repassado para o consumidor de forma direta apenas no caso de prestações entre empresa e cliente, como streaming e marketplaces.

No caso dos marketplaces, a cobrança de ICMS, imposto de importação e outros tributos ainda é sobretaxada pelo ISS —chamado por especialistas de imposto cumulativo.

O titular de Direito Tributário da Faculdade de Direito da USP, Luís Eduardo Schoueri, afirma que a Reforma Tributária tem o mérito de evitar a cobrança de imposto sobre imposto, a partir da concessão de créditos tributários. "Isso vale para toda a cadeia, inclusive quando o Facebook compra um computador."

O Ministério da Fazenda também argumenta que o setor de infraestrutura deve ser menos taxado, o que deve diminuir gastos com energia elétrica.

Schoueri, contudo, afirma que é impossível saber se haverá mais ou menos tributação no total com a aprovação da Reforma. Isso será definido na lei complementar necessária para regulamentar o novo sistema tributário, caso a PEC 45/2019 seja aprovada no Senado.

Será preciso olhar além da alíquota, diz o sócio da área tributária do Pinheiro Neto advogados, Luiz Roberto Peroba. Mesmo que o percentual do imposto aumente, o sistema de crédito proposto com o novo IVA reduzirá a base de pagamento, o que terá efeito no valor final pago ao Estado.

A PEC aprovada pela Câmara dos Deputados também cria isenções para educação, saúde, agronegócio e outros setores. "Quanto mais exceções, mais alto sairá o IVA para as outras áreas", diz Schoueri.

Alguns serviços, como hotelaria, parques de diversão e restaurantes, também terão alíquotas diferenciadas, mas as plataformas digitais não estão inclusas.

Dentro do setor da tecnologia, a tributação também incide de formas diferentes sobre diferentes serviços como publicidade digital em redes sociais, intermediação de vendas em marketplaces e bancos digitais.

Em casos específicos, redes sociais não pagam imposto em transações que envolvem o usuário brasileiro. "Caso a fabricante de pneus Pirelli, da Itália, compre anúncios do Facebook nos EUA para divulgá-los no Brasil, o governo não coleta imposto. Essa é uma discussão global."

Google, Facebook e TikTok, todos associados à camera-e.net, foram procurados pela Folha e preferiram não comentar. O Twitter também foi questionado via email, mas respondeu com mensagem automática que continua um emoji de fezes —a rede social não tem representação de imprensa no Brasil desde que Musk comprou a plataforma.

O banco digital C6 se diz representado pela nota da Febraban, que elogiou a aprovação da Reforma Tributária. "O pior cenário seria ficarmos presos na falta de consenso na busca de uma reforma ideal."

"O sistema atual é um entrave para o crescimento: reduz a produtividade das empresas, impede a alocação eficiente de recursos e gera um nível de litigiosidade na sociedade sem paralelo nos demais países, tanto nos desenvolvidos como nos emergentes comparáveis ao Brasil", afirma a entidade em nota.

Procurado, o Nubank preferiu não se pronunciar sobre a Reforma Tributária. A Folha procurou a Zetta, associação sem fins lucrativos fundada pelo banco digital e pelo Mercado Pago. A entidade está alinhada com a Febraban na defesa da aprovação da reforma.

A Zetta afirma que pontos a respeito de serviços financeiros precisam ser detalhados em regulamentação específica —a lei complementar. "A Zetta segue acompanhando o assunto, contribuindo de forma técnica com as discussões e defendendo a perspectiva de seus associados no que considera benéfico para os consumidores."

A Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia), que representa aplicativos de transporte e logística, preferiu não se pronunciar sobre a Reforma Tributária. Tampouco o fizeram suas associadas Uber, 99 e iFood.

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