Descrição de chapéu Financial Times diabetes

Dinamarca teme ficar dependente de fabricação de Ozempic

Economistas alertam para o chamado 'efeito Nokia', que afetou a vizinha Finlândia

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Richard Milne
Financial Times

O aumento nas vendas de medicamentos endossados por celebridades tem gerado temores de que a economia da Dinamarca corra o risco de enfrentar um destino semelhante ao de seu país nórdico vizinho, a Finlândia, cuja dependência excessiva da Nokia resultou em uma década perdida quando a sorte da fabricante de telefone celular mudou.

Os remédios Ozempic, tratamento para diabetes e que também vem sendo usado para emagrecimento, e Wegovy, um medicamento anti-obesidade, impulsionaram a Novo Nordisk a se tornar a empresa mais valiosa da Europa e impediram a Dinamarca de entrar em recessão.

Fábrica da Novo Nordisk com dezenas de canetas Ozempic, remédio usado para tratamento de diabetes
Fábrica da Novo Nordisk com dezenas de canetas Ozempic, remédio usado para tratamento de diabetes - Tom Little/Reuters

Com valor de mercado de US$ 410 bilhões, a companhia tem um patrimônio maior do que o PIB (Produto Interno Bruto) anual da Dinamarca, que foi de US$ 400 bilhões no ano passado, levantando preocupações entre autoridades e empresários de que a economia do país esteja muito ligada a uma única empresa.

"A maneira como vemos é que na Dinamarca temos uma economia de dois ritmos: a indústria farmacêutica - e o resto", disse Thomas Harr, economista-chefe do banco central da Dinamarca. "O risco é você pensar que a economia está se saindo melhor do que realmente está."

"A Novo Nordisk é muito bem-sucedida, e isso é ótimo para ele e seus acionistas. Mas para a Dinamarca, estou preocupado com o que acontecerá se algo der errado", avaliou um importante executivo de negócios, que não quis se identificar. "A Finlândia acabou tendo uma década perdida quando a Nokia teve seus problemas", recordou.

Após brilhar no primeiro grande ciclo de vendas de telefones celulares, a Nokia viu os lucros desabarem a partir dos anos 2000 após o lançamento do iPhone, da Apple.

Em seu auge, a empresa era responsável por um quarto das receitas fiscais de empresas da Finlândia e representava 4% do PIB. Com a queda drástica da companhia, a economia nórdica teve dificuldades para crescer durante a década de 2010.

Há mais de uma década, a Novo Nordisk tem sido uma das maiores empresas da Dinamarca, graças ao seu foco em medicamentos para diabetes. Mas nos últimos anos, sua avaliação, lucros e vendas dispararam - primeiro com o sucesso do Ozempic e depois com o do Wegovy, que tem como alvo diretamente a obesidade.

A economia da Dinamarca expandiu 1,7% no primeiro semestre deste ano em comparação com o mesmo período em 2022. Mas, excluindo o setor farmacêutico - que é dominado pela Novo Nordisk - o PIB teria caído 0,3%.

Os dados do PIB para o terceiro trimestre serão divulgados na sexta-feira (29).

O impacto no PIB é tão amplamente reconhecido que a agência de estatísticas do país produz dados com e sem o setor farmacêutico. Mas outros acreditam que a economia da Dinamarca se mostraria resiliente, mesmo se a popularidade dos medicamentos mais vendidos da Novo Nordisk diminuísse.

Uma das principais razões é que grande parte do impacto da empresa no PIB ocorre como resultado da produção dela no exterior, e não internamente.

Jonas Dan Petersen, principal assessor de contas nacionais na agência de estatísticas, disse: "As grandes receitas aparecem no PIB, mas não têm um efeito tão explosivo no emprego."

Jakob Ellemann-Jensen, vice-primeiro-ministro da Dinamarca e ministro de assuntos econômicos, também citou essas "diferenças significativas" entre a situação atual da Dinamarca e a enfrentada pela Finlândia, na época do sucesso da Nokia.

Economista-chefe do Nordea, que é o maior banco dos países nórdicos, Helge Pedersen afirmou que considera o sucesso da Novo Nordisk e de outros grupos farmacêuticos dinamarqueses como um "grande benefício" e que isso não cria uma "dependência excessiva".

Nokia apresenta celular G22 em fevereiro deste ano
Nokia apresenta celular G22 em fevereiro deste ano; empresa chegou a ter 25% do PIB da Finlândia, seu país-local - Albert Gea/Reuters

Olli Rehn, que está de licença de seu cargo como governador do banco central finlandês para concorrer à presidência, chamou isso de "pergunta pertinente", mas acrescentou que a Dinamarca tem "uma estrutura industrial mais diversificada e predominância de pequenas e médias empresas".

As raízes da Novo Nordisk na Dinamarca são fortes. Cerca de 40% de seus funcionários estão baseados no país. Ela adicionou 3.500 empregos na Dinamarca no ano passado, totalizando 21.000.

A fabricante de medicamentos também fez mais de US$ 1,4 bilhão de investimentos em produção no país no ano passado e pagou impostos de mais de US$ 2,1 bilhões, ou cerca de 1% do total arrecadado pelo país em 2020.

Pedersen avalia que o grande risco é que os responsáveis pelas políticas públicas possam negligenciar como outras empresas fora do setor farmacêutico estão se saindo.

"Há empresas que estão enfrentando dificuldades. Não se deve esquecer delas ao pensar em políticas fiscais ou de mercado de trabalho. A maioria das empresas dinamarquesas não é tão competitiva", disse ele.

Alex Stubb, ex-primeiro-ministro finlandês e outro candidato presidencial, disse que é relativo o que Copenhague pode fazer em relação aos riscos. "Tudo o que você pode fazer é se afastar. Quando os telefones portáteis da Nokia começaram a desmoronar, o governo foi informado", lembrou. "Mas não há muito que você possa realmente fazer. Você recebe bem a receita fiscal. Mas se começar a interferir no que a empresa faz, você não está fazendo seu trabalho."

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