Senado aprova projeto de lei do Desenrola com limite para rotativo

Texto foi aprovado às pressas para não paralisar programa; próxima fase deve beneficiar 32 milhões de pessoas

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Brasília

O Senado aprovou nesta segunda-feira (2) o projeto de lei com as regras do Desenrola Brasil, programa de renegociação de dívidas do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O texto, que também prevê um limite para a cobrança de juros no cartão de crédito, segue agora para sanção presidencial.

Diante dos alertas da equipe econômica de que o Desenrola poderia ser paralisado caso o texto não fosse votado até esta terça-feira (3), o Senado convocou uma sessão semipresencial às pressas e manteve a proposta aprovada pela Câmara dos Deputados.

Plenário do Senado Federal durante sessão deliberativa, em agosto - Roque de Sá-30.ago.2023/Agência Senado

O texto foi aprovado de forma simbólica (sem a contagem de votos) e com amplo apoio, inclusive da oposição. Os líderes do PL, Carlos Portinho (RJ), e do Progressistas, Tereza Cristina (MS), se declararam a favor do texto.

O projeto de lei dá 90 dias para as instituições do sistema financeiro definirem um teto de juros para dívidas no cartão de crédito. Se não houver aval do CMN (Conselho Monetário Nacional) à proposta dos bancos nesse período, a dívida será limitada ao dobro do montante original.

A proposta usa o mesmo parâmetro do modelo inglês, no qual a cobrança de juros não pode exceder o equivalente a 100% do montante original da dívida do cliente. Na prática, o valor a ser quitado pode ser no máximo duplicado.

A iniciativa do Congresso busca dar uma resposta à escalada da taxa de juros cobrada pelos bancos no rotativo do cartão de crédito, acionado automaticamente quando o cliente deixa de pagar a fatura integral. Essa modalidade de crédito é a mais cara do mercado tem uma cobrança média de 445,7% ao ano, de acordo com dados divulgados pelo Banco Central na semana passada.

A discussão sobre como lidar com o tema gerou uma briga entre bancos e empresas de maquininhas de pagamento.

Isso porque, em meio ao debate sobre o rotativo do cartão, os bancos pressionam por uma modificação nas regras das compras parceladas sem juros —modalidade usada pelas empresas de maquininhas e que, afirmam eles, contribui para os altos juros cobrados no rotativo devido ao grau de inadimplência.

No parcelado sem juros, o consumidor faz a compra e as maquininhas costumam antecipar os valores ao lojista com um desconto sobre o total a receber por eles.

O texto acabou sendo aprovado com as mudanças que preveem o limite de juros para o rotativo e o parcelamento da fatura do cartão, mas sem mudanças nas compras sem juros feitas em parcelas pelo consumidor.

Em posicionamento, a Associação Brasileira de Internet (Abranet) —que representa parte das empresas de maquininhas— considerou a aprovação positiva e disse esperar que o projeto seja sancionado, sem vetos, pela Presidência da República.

"O projeto aprovado hoje prevê medidas para melhora das taxas do rotativo do cartão de crédito, sem que haja qualquer mudança no direito do consumidor e do lojista de comprar e vender parcelado sem juros no cartão, mecanismo tão importante para o poder de compra e de venda dos brasileiros e lojistas, notadamente os de menor porte", afirma a entidade.

Já a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) afirmou que continuará envolvida nos debates com o governo e o Congresso sobre medidas ligadas ao alto custo do crédito no país.

"No prazo de 90 dias, a Febraban participará de discussões técnicas, em postura colaborativa com a indústria de cartões, o Ministério da Fazenda, o Conselho Monetário Nacional e o Banco Central. Apesar de o tema ser muito complexo, estamos confiantes de que a indústria de cartões, juntamente com o regulador e o governo, terá sucesso em promover evoluções materiais na dinâmica do cartão de crédito", disse a entidade.

Com a aprovação do projeto, a previsão do governo é que, a partir do dia 9, pessoas que ganham até dois salários mínimos ou estão inscritas no CadÚnico (Cadastro Único) para programas sociais do governo federal poderão negociar dívidas de até R$ 20 mil em valores atualizados no Desenrola.

Quem aceitar renegociar a dívida pelo programa terá o nome limpo automaticamente dentro de cinco dias úteis, tempo para a instituição bancária informar que o débito foi negociado.

Na sexta (29), o ministro Fernando Haddad (Fazenda) afirmou que a última etapa do programa deve contemplar 32 milhões de pessoas endividadas. O desconto médio oferecido pelos credores, segundo o ministro, é de 83%.


Empresas dos setores de educação, eletricidade e saneamento chegam a oferecer descontos acima de 90%.

Para renegociar os débitos do Desenrola Brasil, é necessário se cadastrar antes no gov.br. Haddad recomendou que os interessados já façam o cadastro para poderem acessar o site desenrola.com.br a partir do primeiro dia da nova etapa do programa.

Inicialmente, o relator do projeto de lei no Senado, Rodrigo Cunha (Podemos-AL), pretendia fazer uma série de mudanças no texto. Antes do recuo, o senador chegou a dizer que não via prejuízos em atrasar o calendário do programa por 10 ou 15 dias.

Para contornar o mal-estar, o governo prometeu apoiar as sugestões do relator em um novo projeto de lei. Entre outros pontos, Cunha propunha campanhas educativas na TV com recursos do fundo garantidor ou mesmo no programa de rádio Voz do Brasil.


"Vamos tratar esse assunto não mais como individual, porque não pode ser tratado assim. Já estamos falando, individualmente, de 70 milhões de pessoas [endividadas]. Mas sim de um problema social, coletivo, que afeta a economia brasileira", afirmou Cunha durante a sessão.

A falta de prazo para discussão do projeto de lei reacendeu a disputa entre Câmara e Senado, além do debate sobre a instalação das comissões mistas para medidas provisórias —que não ocorreu neste caso, apesar de a criação do programa ter sido feita via MP.

"Nós como Senado somos obrigados a votar sem aprofundamento, sem as mudanças que gostaríamos, por causa dessa lógica —me perdoe, irracional— que se estabeleceu nesta Casa com relação às Medidas Provisórias", disse o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA).

A reclamação foi reforçada por outros senadores, como Rogério Carvalho (PT-SE). O petista disse que o Senado aprovou com "humildade" o projeto de lei nos termos definidos pela Câmara dos Deputados pensando no sucesso do programa de renegociação de dívidas.

"Vai chegar um momento em que nós vamos ter interrupção do processo legislativo no Brasil porque não é possível conviver com a intransigência de uma Casa com a outra Casa, da Câmara com o Senado. Nós não podemos conviver com isso. Nós somos civilizados, temos como referência o interesse público."

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