Meu principal objetivo hoje é deixar para minha filha uma renda de R$ 20 mil mensais no futuro. Por isso, invisto quase tudo o que sobra em títulos do Tesouro Direto. Recebi um bom valor em ações, numa herança, e quero vender essas ações para investir em renda fixa, mas sei que as taxas devem cair constantemente nos próximos meses. Por isso pergunto: qual a melhor opção? Vendo todas as ações, pago o Imposto de Renda, mas travo uma taxa maior nos títulos de renda fixa? Ou vendo R$ 20 mil todo mês para não ter que pagar imposto, mas me conformo em travar taxas menores de juros?
Para construir uma reserva financeira capaz de proporcionar a própria independência financeira e até de filhos não é necessário ter uma renda elevada. São necessários dois fatores, mas o segundo é o mais relevante: ter um bom plano e disciplina. Disciplina de cortar gastos, de poupar e de seguir o planejamento construído. No caso de Helena, falta apenas a estruturação de um plano, pois disciplina, ela e seus pais tiveram.
Quando se ouve histórias como a de Helena, percebemos que o hábito e a consciência da importância de poupar são, muitas vezes, passados por gerações.
Entretanto, quando não se tem um plano, batem sempre algumas dúvidas. Estou fazendo tudo certo? Como devo lidar com a parcela de ações?
Imagino que vão aparecer comentários de leitores dizendo: mas ela ganha muito, então é mais fácil. Eu discordo. A independência financeira está relacionada ao seu padrão de vida, não ao dos outros.
Helena tem um custo de vida de R$ 20 mil, portanto sua independência financeira é atingida com esse custo e ela tem de fazer um esforço considerando esse nível. Ela não busca uma independência com renda de R$ 50 mil. Assim como alguém cujo custo mensal é de R$ 5.000 deve ter como alvo essa renda para ter independência financeira, e seu esforço será proporcional a isso.
A prova disso são os dois últimos casos analisados nesta seção Comento seu dinheiro, o do engenheiro que quer alcançar sua independência financeira daqui a dez anos e o da professora que ganha R$ 13 mil mensais, mas se afundou nas dívidas.
Helena tem 61 anos, uma filha de 30 anos e o hábito de poupar R$ 6.000 mensais. Ela espera que esta poupança mensal deva persistir por mais nove anos, quando deve parar de trabalhar.
A construção de seu patrimônio teve alguma ajuda de herança, mas essa ajuda é a prova de uma consciência de poupança de seus pais. Consciência esta que foi herdada por ela e que ela espera que sua filha também adote.
Seu patrimônio financeiro hoje soma quase R$ 6 milhões, construído ao longo de 25 anos:
- 67% em títulos públicos federais referenciados ao IPCA (Tesouro IPCA)
- 20% em ações
- 8% em previdência privada
- 5% em fundos DI
A concentração em títulos referenciados ao IPCA é o que sempre recomendo. Ou seja, ela tem feito o certo.
A herança que mencionei está na parcela em ações, e é nessa parte que reside sua dúvida.
Percebo que muitos indivíduos que recebem ações ou imóveis como herança criam um certo apego a estes bens. De certa forma, é compreensivo dado ao amor que temos ao esforço que aquele que nos deixou de herança teve. Adicionalmente, o bem se torna quase uma extensão daquele ente querido.
Como Helena deve continuar poupando por mais nove anos e considerando uma taxa de juro real de 4,0% ao ano nesse período, seu patrimônio deve se elevar para R$ 9,3 milhões a valores de hoje logo antes de ela se aposentar.
Com esse patrimônio, bastaria um retorno real, ou seja, acima da inflação de 2,6% ao ano e já seria possível ter uma renda de R$ 20 mil que possa ser deixada para sua filha, depois de ter sido aproveitada por ela mesma.
Portanto, resta apenas solucionar uma questão para Helena que é: o que fazer com as ações?
Observa-se que Helena é conservadora. Prova disso é que toda sua poupança foi construída com títulos públicos. Diga-se de passagem, ela poderia ter muito mais se tivesse investido pelo menos em parte em CDBs referenciados ao IPCA e dentro da garantia do FGC.
Mas voltando às ações, ela tem forte concentração em duas empresas, o que é muito inadequado para qualquer portfólio de ações. Não vou citar o nome das empresas para que isso não se configure uma recomendação. Mas são duas que usualmente brasileiros compram e estão entre as cinco com maior peso no Ibovespa.
Existem duas atitudes a tomar dado seu conservadorismo:
1) vender tudo de uma única vez, pagar Imposto de Renda, mas garantir uma taxa de juros mais elevada
ou
2) ir vendendo aos poucos, ou seja, R$ 20 mil por mês, não precisar pagar IR, mas correr o risco de reinvestir em títulos de renda fixa com taxas mais baixa, pois elas devem cair nos próximos anos.
A solução é baseada em três premissas: qual título se pretende comprar, quanto podem cair as taxas de juros e quanto as ações ainda podem subir.
Assumindo que as taxas de juros reais caiam 1,5% nos próximos cinco anos, o Tesouro IPCA2045 hoje negociado a IPCA + 5,5% ao ano cairia para IPCA + 4% ao ano. Isso faria com que o título se valorizasse IPCA + 10,76% ao ano, aproximadamente, nesses cinco anos.
Assumindo uma inflação de 4% ao ano, equivaleria a 15% de valorização nominal.
Acho que vale o risco de manter a disciplina de vender R$ 20 mil das ações, pelo menos nos próximos 12 meses e evitar o IR agora. O cenário para o mercado acionário permite que se tenha uma valorização de 15% para as ações no próximo ano.
Entretanto, a mesma revisão deve ser feita periodicamente.
Adicionalmente, para essa parte da venda das ações, sugiro a Helena considerar o prêmio que CDBs referenciados ao IPCA e com garantia do FGC proporcionam.
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