Biden anuncia fechamento do espaço aéreo para voos da Rússia em discurso do Estado da União

Presidente chama Putin de ditador isolado, busca defender gestão na economia e pressiona Congresso por suas pautas

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Washington

O presidente dos EUA, Joe Biden, destacou a guerra na Ucrânia em seu primeiro discurso do Estado da União, nesta terça (1º), em Washington. Logo no começo da fala, anunciou mais uma punição à Rússia em razão do conflito: um veto a que aviões do país de Vladimir Putin sobrevoem o espaço aéreo americano.

A medida, que se soma a outras sanções já anunciadas pelo democrata desde o início da ação militar de Moscou no Leste Europeu, é similar a outras definidas por União Europeia e Canadá nos últimos dias.

O presidente Joe Biden acena a parlamentares no discurso do estado da união, à frente da vice Kamala Harris, à esq., e da presidente da Câmara, Nancy Pelosi
O presidente Joe Biden acena a parlamentares no discurso do estado da união, à frente da vice Kamala Harris, à esq., e da presidente da Câmara, Nancy Pelosi - Saul Loeb - 1º.mar.22/Pool/AFP

Biden também elogiou a resistência do povo ucraniano e do presidente do país, Volodimir Zelenski, e chamou Putin de ditador, dizendo que ele está "mais isolado do que nunca". Destacou a resposta unificada do Ocidente como um exemplo de que a aliança entre EUA e Europa segue forte e afirmou que, caso essa reação não tivesse acontecido, haveria um risco grande de as tropas de Putin atacarem outros países.

"Ao longo de nossa história, aprendemos essa lição: quando ditadores não pagam um preço por sua agressão, causam mais caos. Eles seguem avançando. E os custos e as ameaças para a América e o mundo continuam subindo. É por isso que a Otan foi criada, para assegurar paz e estabilidade na Europa depois da Segunda Guerra. Isso importa. A diplomacia americana importa", disse.

Ao anunciar que o espaço aéreo dos EUA será fechado para aviões russos, Biden fez novos ataques ao presidente russo. "A guerra de Putin foi premeditada, não provocada. Ele rejeita esforços de diplomacia. Pensou que o Ocidente e a Otan não responderiam. E pensou que poderia nos dividir aqui em casa. Putin estava errado. Estamos prontos. Putin está mais isolado no mundo do que nunca."

Ele destacou que os ucranianos, "de estudantes a aposentados", viraram soldados para defender o país. "Putin buscou balançar as bases do mundo livre pensando que poderia dobrá-las às suas ameaças. Mas calculou mal. Encontrou uma parede de resistência que nunca imaginou. O povo ucraniano e sua coragem inspiram o mundo", disse. "Mas os próximos dias, semanas e meses serão duros para eles."

Biden reafirmou que forças americanas não se envolverão diretamente nos conflitos em território ucraniano, mas irão para a Europa para defender membros da Otan caso Putin avance.

"Para esse fim, mobilizamos forças americanas em terra, esquadrões aéreos e navios para proteger países da Otan —incluindo Polônia, Romênia, Letônia, Lituânia e Estônia. Os EUA e os nossos aliados defenderão cada polegada do território dos países da Otan com força total", prometeu.

O presidente chegou ao plenário da Câmara ao lado da deputada Victoria Spartz, republicana eleita por Indiana e de origem ucraniana.​ Destacou a presença da embaixadora de Kiev em Washington, Oksana Markarova, e viu parlamentares com detalhes em azul e amarelo, cores da bandeira ucraniana —a presidente da Câmara, Nancy Pelosi, exibia broche com as bandeiras dos EUA e do país do Leste Europeu.

As medidas contra a Rússia, de modo geral, têm apoio bipartidário no Congresso dos EUA. As propostas domésticas para a economia, que formaram outra parte importante do discurso, por sua vez, geram divisões até entre democratas. Biden procurou destacar os avanços na retomada dos abalos gerados pela Covid. Ao mesmo tempo, pressionou parlamentares a aprovar pautas de sua agenda que estão travadas, como ampliação de benefícios sociais para famílias e diminuição do custo de remédios e creches.

O democrata usou tons nacionalistas em vários momentos. "Temos uma escolha. Um modo de lidar com a inflação é baixar os salários e tornar os americanos mais pobres. Tenho um plano melhor para combater a inflação. Baixar os custos, não os salários. Fazer mais carros e semicondutores na América, mais infraestrutura e inovação na América. Mercadorias se movendo mais rapidamente e de forma mais barata. Em vez de confiar em cadeias de suprimentos estrangeiras, vamos fazer isso na América", afirmou.

Ele defende que o Estado atue para reduzir o custo de vida das famílias e falou das propostas do pacote Build Back Better —que estimava gastos de US$ 1,8 trilhão e acabou travado por resistência de dois senadores democratas, que temem que o aumento de gastos públicos gere ainda mais alta nos preços.

O presidente também fez referência ao pacote de infraestrutura aprovado no ano passado, que prevê recursos para reformar estradas e melhorar o acesso à internet no país. "Estamos cheios de falar sobre 'semanas de infraestrutura'. Vamos ter uma década de infraestrutura", disse, em uma alfinetada ao ex-presidente Donald Trump.

Os EUA enfrentam a maior alta na inflação desde os anos 1980, bem como um debate sobre como lidar com o problema. Apesar desse pico, outros indicadores estão bem, como o de desemprego (na faixa de 4%) e o de crescimento do PIB (5,7% no ano passado). Mas a população americana tem sentido mais os problemas, e a popularidade de Biden continua em baixa, em torno dos 40% —o que ameaça a maioria frágil de seu partido no Congresso nas eleições legislativas de novembro.

Sobre a pandemia, Biden disse que o país está voltando à rotina normal, com o fim da obrigatoriedade do uso de máscaras e a ampliação das atividades. "É hora de voltar ao trabalho e encher nossos grandes centros de novo. Nossas crianças precisam estar na escola." Em um sinal de que a Covid tem impactado menos a rotina, o Congresso pôde contar com plateia completa, e o uso de máscaras foi opcional. Além dos congressistas, estiveram presentes secretários de Estado, juízes da Suprema Corte e militares.

O presidente também pediu ao Congresso que aprove novas leis sobre mudança climática e energia limpa e pediu mais parcerias entre os dois partidos, elencando quatro temas para isso: combater a epidemia de vício em opioides, ampliar o cuidado com saúde mental (especialmente de crianças), ajudar militares veteranos e aumentar a pesquisa contra o câncer.

Biden ainda pediu para que o Congresso aprove medidas de proteção ao voto e falou sobre políticas para conter as mortes por armas de fogo nos EUA. A estratégia promete aumentar o combate ao tráfico de armas e ampliar o policiamento comunitário, pelo qual agentes têm maior proximidade com a população. "A saída não é retirar fundos da polícia. A resposta é dar recursos para a polícia com os recursos e treinamento que precisam para proteger nossas comunidades."

Sobre imigração, disse que reforçar o controle de fronteiras e melhorar as regras para facilitar o acesso de documentos a estrangeiros não são coisas excludentes. "Revisem nossas leis para que os negócios tenham os trabalhadores que precisam e as famílias não esperem décadas para se reencontrarem".

O discurso do Estado da União é uma tradição do país. Uma vez ao ano, o presidente fala perante o Congresso sobre prioridades do mandato e o andamento do governo e do país. Este é o primeiro discurso do tipo feito por Biden. Em 2021, ele falou ao Congresso cerca de cem dias após tomar posse, mas em casos assim a fala não é chamada de discurso do Estado da União —pois em tese o novo líder ainda não teria tido tempo de se inteirar por completo sobre qual é o estado das coisas no governo.

"Nesta noite, em nosso 245º ano como uma nação, eu venho reportar o estado da União. E meu relatório é: o estado da União é forte, porque vocês, o povo americano, são fortes. Estamos mais fortes hoje do que um ano atrás. E estaremos mais fortes daqui a um ano do que hoje", disse, já na reta final do discurso, que durou mais de uma hora e foi permeado por ovações dos parlamentares, como manda a tradição.

Um dos princípios fundadores dos EUA é que a parceria entre os estados que formam o país seja aperfeiçoada continuamente. Na prática, no entanto, a polarização continua. Como um sinal disso, o Congresso recebeu proteção extra, com a instalação de uma cerca temporária ao seu redor. Havia risco de protestos nesta semana contra o governo, o que, até o começo do discurso, não tinha se concretizado.

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