Descrição de chapéu Caixin Coronavírus China

Idosos com Covid em Xangai enfrentam dificuldade para lidar com quarentena centralizada

Familiares relatam instruções confusas por parte do poder público e pouca infraestrutura nos centros de tratamento

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Xu Wen Celine Yang
Caixin

Nas primeiras horas de terça (19), a avó de Zhiye, de 94 anos, foi levada de casa. "Eles arrombaram nossa porta", disse ela. Seu tio lhe telefonou às 2h47 daquele dia, mas sua voz foi abafada pelo caos ao redor. Ele, aos 74 anos, estava trancado em casa com a mãe desde o fim de março, devido a casos de Covid-19 registrados em seu condomínio, o Yichuan Sicun, no bairro de Putuo, em Xangai.

Em 13 de abril, os dois fizeram testes de antígeno e tiveram resultados positivos. No dia seguinte, o comitê do bairro veio aplicar testes RT-PCR, mas não foram relatados resultados desde então.

Agente comunitária de saúde realiza teste para detecção de Covid em idoso no distrito de Jinshan, em Xangai - Zhuang Yi - 29.mar.22/Xinhua

Parentes enviaram a eles xarope para tosse e remédios contra febre. Felizmente, os dois só tinham tosse moderada, sem febre, e, como mostraram vários testes de antígeno, estavam a caminho da recuperação.

Em 15 de abril, o tio de Zhiye lhe mandou uma mensagem dizendo que seu exame dera negativo. No dia seguinte, o da avó deu resultado positivo fraco e, depois, negativo nos dois dias seguintes. Mas em 18 de abril o tio de Zhiye disse ter recebido um telefonema do comitê do bairro pedindo que se preparassem para partir imediatamente ao centro de tratamento temporário de Putuo.

Sua avó tem pressão alta e doença cardíaca crônica e seu tio passou por uma cirurgia contra um câncer de próstata no início do ano e toma medicação diariamente. Diante das idades e das condições de saúde deles, Zhiye pensou que não deveriam ser levados para um hospital improvisado.

Como os últimos testes de antígeno haviam dado negativo, ela esperava que tivessem autorização para continuar em casa. Então escreveu numa conta oficial do aplicativo WeChat um post extenso sobre o que a avó passou, pedindo que leitores repostassem suas histórias. Ela rapidamente viralizou em várias plataformas. Mas a avó foi levada de qualquer modo.

Em meio ao pior surto de Covid já ocorrido em Xangai, a maior cidade da China, idosos —especialmente os que têm comorbidades— vêm lutando contra a realidade de que precisam ser transferidos para centros de isolamento depois de infectados, em vez de fazer quarentena em casa.

Mais tarde, Zhiye soube por seu tio que às 2h de terça pessoas bateram em sua porta. Os dois estavam dormindo e não atenderam. "Depois de bater por algum tempo, eles entraram à força", lembrou o tio. Os visitantes disseram que levariam sua avó para o hospital, e ela se recusou. Então eles a enrolaram num cobertor e se prepararam para carregá-la. No meio da discussão, a idosa foi derrubada e caiu no chão.

Temendo pela saúde dela, o tio de Zhiye concordou em sair. Ele ajudou a mãe a se vestir e eles partiram por volta das 3h30 para a instalação de isolamento no Centro de Saúde Comunitário de Taopuzhen, em Putuo. O local já estava sem leitos, e os dois passaram o resto da noite sentados no corredor.

Na mesma noite, Zhao Qi, morador da área residencial de Changfeng Xincun, em Putuo, também foi enviado para o centro de isolamento com a mãe dele, que tem 80 anos. Em 8 de abril o teste de antígeno dos dois deu positivo, e quatro dias depois os de PCR também.

Nos dias seguintes, juntaram seus pertences e esperaram que as autoridades os levassem para o centro de tratamento temporário, mas o lugar se recusou a recebê-los. Em 16 de abril, Zhao recebeu uma ligação do comitê do bairro. "Disseram que éramos velhos demais e que a instalação não nos receberia, por isso devíamos nos isolar em casa." Nos dias seguintes, de casa, eles fizeram testes com resultados negativos. Zhao tirou fotos dos exames e os enviou ao comitê.

Mas em 18 de abril vieram novas instruções. "Naquela tarde, o comitê do bairro ligou de novo e nos disse que devíamos ir para uma instalação de tratamento temporário. Eu pensei que essas instalações seriam como as que víamos na televisão, que eram bastante aceitáveis, mas não esperava acabar aqui."

Zhao disse à agência Caixin que ele e sua mãe embarcaram em um ônibus às 16h e foram deixados no centro de isolamento da Universidade Normal da China Oriental nº 4 após sete horas de viagem.

Já era tarde da noite quando eles chegaram. Lin, que estava na mesma instalação, lembrou que por volta das 23h30 um ônibus deixou mais de 30 idosos de Putuo, incluindo Zhan e sua mãe. Lin descobriu que a maioria deles tinha comorbidades e ao menos seis tinham mais de 80 anos.

Ele disse que o centro foi montado na cantina da escola. Tinha cerca de 160 leitos, e mais da metade dos internos era idosa. O primeiro grupo estava lá havia uma semana, e alguns enfrentavam falta de remédios para pressão alta, diabetes e doenças cardiovasculares que tomavam com regularidade.

As condições de vida no centro eram básicas. Em vídeos que Lin fez na instalação, idosos estão sentados ou deitados em leitos simples. Diante dessas condições, Zhao ficou preocupado com sua mãe. "É preciso descansar muito depois de pegar Covid. Além disso, faz 11 dias que ela foi infectada, e ela se sente bem. Talvez já tenha se recuperado. Tenho muito medo que seja reinfectada aqui."

Lin ficou surpreso ao ver que o local não tinha equipamento médico e só dois profissionais em serviço. "A instalação de isolamento é suficiente para jovens em termos de condições de vida, mas é muito inconveniente para os idosos, porque não há qualquer capacidade para atendimento de emergência aqui."

Ele esperava que os idosos e seus parentes pudessem ser transferidos para um hospital com melhor atendimento de emergência ou outro centro de isolamento com melhores condições.

Na área residencial da rua Jiangpu, no bairro de Yangpu, o destino da avó de Han Lu, de 96 anos, ainda não foi decidido. Ela está presa à cama há anos e não pode cuidar de si mesma. É atendida por duas cuidadoras e depende delas para se alimentar; cada refeição leva uma hora para terminar.

A avó de Han pegou o vírus de sua cuidadora. Em 15 de abril, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças ligou para a família e a informou sobre a infecção. Depois de saber de seu estado, a equipe lhes disse que ela poderia ficar em casa para se recuperar. Mas em 17 de abril o comitê do bairro disse que a avó de Han precisava ir para uma instalação comunitária para se recuperar.

Desde 18 de abril Han procurou o comitê diversas vezes, relatando a condição de sua avó e esperando que lhe dessem ajuda financeira para que ela fique em casa, mas o órgão nunca deu uma resposta clara. Após ler a história de Zhiye, Han ficou ainda mais ansiosa. "Espero que as autoridades saibam da verdadeira condição de minha avó e sejam mais humanas, permitindo que ela fique em casa."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.