Aumento de incursões de Israel na Cisjordânia gera críticas dos EUA e eleva tensão

País diz combater terrorismo em resposta a ataques; palestinos registram dezenas de mortes

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Washington

O reforço no número de incursões militares de Israel na Cisjordânia, em ações classificadas pelas forças do país como de combate ao terrorismo, tem elevado a pressão de observadores internacionais sobre o governo israelense. Mesmo os tradicionais aliados Estados Unidos subiram o tom nesta semana.

Os palestinos afirmam que vivem hoje um dos períodos mais violentos dos últimos anos, com óbitos contados às dezenas. Segundo Israel, o incremento se deu em resposta a uma onda de ataques contra cidadãos do país que deixou ao menos 18 mortos.

Em um raro gesto diplomático, um porta-voz do Departamento de Estado americano afirmou na terça-feira (6) que Washington vai continuar a pressionar Israel para que o país reveja suas regras de combate na Cisjordânia e reduza o risco à vida de civis palestinos e de jornalistas. A pressão vai ser exercida, segundo afirmou Vedant Patel durante encontro com a imprensa, nos mais altos escalões do governo.

Palestinos carregam o corpo de Mohammad Sabaaneh durante funeral em Jenin - Abbas Momani - 6.set.22/AFP

Antony Blinken, secretário de Estado americano, já vinha fazendo esse pedido em conversas com as autoridades israelenses, mas a fala do porta-voz trouxe a discussão ao debate público —o que gerou fortes reações de Israel. "Ninguém vai ditar as nossas regras de combate, quando somos nós que estamos lutando para defender nossas vidas", afirmou o primeiro-ministro Yair Lapid ao responder às falas vindas de Washington.

Eytan Gilboa, professor de relações internacionais na Universidade Bar-Ilan, em Israel, disse à Folha que os comentários americanos foram "ridículos" e "ultrajantes". "Criou-se uma crise. Os EUA estão agora tentando voltar atrás. Mas é uma crise, e espero que ela se resolva logo."

O porta-voz da diplomacia de Washington citou as regras de combate ao comentar a morte da jornalista palestino-americana Shireen Abu Akleh, da rede de TV Al Jazeera, em maio. O caso se tornou um dos maiores desafios recentes do governo israelense em termos de sua imagem pública. Nome quase mítico entre os árabes por suas coberturas e figura frequente nas telas da emissora qatari, a repórter foi morta na cidade de Jenin, na Cisjordânia, enquanto acompanhava uma ação militar israelense.

Investigações de jornais de prestígio, de organizações internacionais de defesa dos direitos humanos e mesmo dos EUA e da ONU culparam Israel pelo disparo que matou Abu Akleh. Durante meses, o país negou ter responsabilidade e sugeriu que o tiro era na verdade obra dos palestinos. Nesta semana, o governo admitiu que provavelmente um de seus soldados foi responsável pela morte da repórter, ainda que de modo acidental.

O Ministério Público Militar, por sua vez, anunciou que não viu suspeitas de um ato criminoso "que justificasse uma investigação penal".

A morte de Abu Akleh, porém, não deve sair do radar dos ativistas pró-Palestina, que consideram que o caso engrossa uma lista de fatores que endureceram a visão sobre Israel nos últimos anos. As críticas focam ataques aéreos na Faixa de Gaza, o impacto de ações militares de contraterrorismo em civis e o fato de as forças israelenses terem agredido, com golpes de cassetete e bombas de efeito moral, homens que carregavam o caixão da jornalista em seu funeral, em maio passado.

Israel afirma que suas incursões na Cisjordânia, território que ocupa desde 1967, foram intensificadas como reação a uma recente onda de ataques contra israelenses que deixou 18 mortos. Muitas das operações ocorrem justamente na cidade de Jenin, tida como um bastião militante —e onde Abu Akleh foi morta.

O Ministério da Saúde palestino afirma que cerca de cem palestinos já morreram na mais recente campanha israelense, entre eles militantes e civis. Apesar da pressão internacional, não há sinais de que a tensão na região vá diminuir. O Exército israelense informou, em nota recente, que pode inclusive aumentar seu escopo.

Ecoando a narrativa oficial, Gilboa diz que o país tem sido forçado a agir porque as autoridades palestinas têm sido incapazes de controlar a população. O fato de Israel se preparar para ir às urnas em novembro —o quinto pleito em três anos— também tem seu peso. "A oposição acusa o governo de não fazer o bastante para prevenir o terrorismo."

Na terça, uma incursão deixou ao menos um palestino morto e feriu 16 em Jenin. O homem foi identificado como Mohammad Sabaaneh, 29. Segundo testemunhas, ele estava filmando as ações israelenses com seu celular quando foi atingido. Israel diz que vai investigar o episódio. Na quarta, palestinos acusaram Israel de matar Younis Tayeh, 21, em uma incursão no vilarejo de Tubas. Segundo a família, ele foi alvejado sem motivo; os israelenses dizem que houve troca de tiros.

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